*Artigo por Mário Sant’Ana

O País não queria necessariamente se separar de Portugal. Todavia, não aceitava perder as importantes vantagens que conquistara nos 14 anos que sucederam a transferência da corte portuguesa para o Rio de Janeiro, tais como a capacidade de participar diretamente do comércio internacional, o status de reino e a autonomia para a administração própria.

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Os vitoriosos da Revolução Liberal do Porto (1820), que exigiram a volta de D. João VI à Europa, prometeram ao “Brasil Irmão” tratamento igualitário no novo regime. Traíram suas promessas. Sedentos por restaurar o monopólio do poder e os benefícios econômicos perdidos com a vinda da família real para o Brasil, adotaram medidas políticas, financeiras e militares para recolocar o País na condição de colônia. Esticaram a corda e tornaram a independência do Brasil uma questão de quando e por quem.

Nada bobo, D. Pedro se apressou a anunciar em 1º de agosto de 1822 a instalação no Brasil de sua primeira Assembleia Geral Constituinte “afim de cimentar a Independência Política deste Reino, sem romper contudo os vínculos da Fraternidade Portuguesa”.

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Em 2 de setembro, enquanto Pedro buscava em São Paulo apoio político para essa mudança, sua esposa, a austríaca Leopoldina, regente em exercício, convocou uma sessão extraordinária do Conselho de Estado e, juntamente com os ministros, decidiu pela separação definitiva entre Brasil e Portugal. A própria Leopoldina assinou a Declaração de Independência e, por carta, comunicou o ocorrido ao marido.

Ao receber a notícia, o Príncipe D. Pedro fez soar o famoso brado retumbante. “Independência ou Morte” foi a senha para que governos estrangeiros e investidores entendessem que estava afastado o risco de serem desfeitos por Lisboa os acordos firmados com o Rio de Janeiro.

O respeito, a política e a determinação conquistaram ao Brasil seus objetivos. A arrogância, a impolítica e a ganância impuseram a Portugal perdas de dimensões continentais.

A primeira lição que esse importante capítulo da história luso-brasileira ensina é moral. “Como sucede aos imprudentes nos momentos de felicidade, esqueceram-se das calamidades passadas, encheram-se de orgulho e julgaram que até os elementos lhes deviam obedecer” —escreveu, em outubro de 1822, o jornalista Hipólito da Costa, caracterizando o comportamento dos líderes portugueses em relação ao Brasil.

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Nas últimas décadas, o País tem gozado da felicidade de contar com instituições respeitadas. Para não minar esse sentimento cívico, é importante que as autoridades não julguem que são o Estado nem fração dele, como alguns parecem pensar pelo que manifestam em vergonhosos quando não criminosos êxtases autoritários, frutos do mesmo tipo de orgulho ao qual se referiu Hipólito da Costa.

É importante ressaltar que o respeito às instituições não pode ser condicionado ao caráter de quem as ocupa. Devemos seguir o exemplo do Brasil de outrora, que tratou com respeito as desrespeitosas Cortes Gerais da Nação Portuguesa. A Civilização assim exige.

Todavia, como fez o Brasil do século 19, não devemos nos curvar, no século 21, ao poder ficcional dos tiranetes de plantão. Em vez disso, sigamos o exemplo de nossos antepassados para avançarmos com um projeto próprio de nação. A Democracia assim exige.

A segunda lição ensinada pelo processo de independência do Brasil foi política. Ao desobedecer as determinações de Portugal e permanecer no País, D. Pedro entendeu que “esse passo deveria ser para as Cortes de Lisboa o termômetro das disposições do Brasil”, para que voltassem “ao trilho da justiça, de que se tinham desviado”. Não foi o que aconteceu.

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Desde junho de 2013, “o termômetro das disposições do Brasil” tem alcançado marcas elevadas, para que Brasília volte “ao trilho da justiça”. Não é o que tem acontecido.

Agora, com a piora do quadro, a sociedade doente começa a ter convulsões, com movimentos desordenados e alterações cada vez mais preocupantes.

Na quarta estrofe do Hino da Independência, lemos: “Ressoavam sombras tristes da cruel guerra civil, mas fugiram apressadas vendo o anjo do Brasil.” Que assim seja, outra vez, pois os brasileiros de hoje tampouco querem os traumas de uma ruptura institucional.

Mário Sant'Ana escreve no AN às terças
Mário Sant’Ana escreve no AN às terças (Foto: Arquivo pessoal)

*Mário Sant’Ana é tradudor e intérprete, cofundador do Projeto Resgate, organização com ações para reduzir contrastes sociais, e co-idealizador do programa Think Tanks Projeto Resgate, para o desenvolvimento de habilidades de inovação intersetorial, soft skills e liderança não hierárquica. Escreve artigos para o A Notícia às terças-feiras. Contato: mario@projetoresgate.org.br

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