*Artigo por Mário Sant’Ana
Marta segurava uma maçã pelo talo; Pedro, a outra. Quando os dedos dele se separaram, o fruto caiu. Por que a maçã caiu?
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Quando propus a questão a um casal, ele atribuiu a queda à gravidade; ela, à atitude do rapaz.
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Atitude!?!? Não esperava por essa! Sentindo que havia mexido em um vespeiro, tentei pacificar as vespas.
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“Não se sabe se Pedro teve a intenção de deixar o fruto cair, onde caiu e as consequência da queda. Se a maçã foi parar em um tacho para fazer doce de maçã, Pedro não errou.”
Ele pareceu aliviado. Ela não se mostrou muito impressionada com as minhas elocubrações. Pedro havia sido processado, julgado, condenado e deveria exercer o direito de permanecer em silêncio.
Eu não pretendia evocar sentimentos mais intensos, apenas chamar a atenção dos jovens para a importância de não atribuírem os eventos da vida exclusivamente a fatores que não controlam.
As análises superficiais costumam levar a conclusões insatisfatórias. Dizer que o fruto caiu por causa da força gravitacional não é errado, mas não melhora nossa condição de decidir o que fazer para evitar ou provocar a queda de maçãs.
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Por outro lado, as investigações excessivamente profundas podem envolver grandezas com as quais não sabemos lidar, o que diminui nossa capacidade de fazer boas escolhas conscientes. Enquanto tentamos decifrar os muitos e complexos fatores teóricos relacionados à atitude que levou o homem, naquele momento, a permitir que aquela maçã se lhe escapasse dos dedos, muitos talos terão apodrecido e muitos frutos caído. E a culpa, pelo menos na avaliação da moça, continuará sendo do Pedro.
Quando lidamos com questões da sociedade, as diferentes escalas podem ter efeitos similares. Muitas vezes, as ações em um escopo muito reduzido não conseguem provocar os efeitos sistêmicos necessários e sentimos que estamos enxugando gelo. Se pensarmos em uma escala muito grande, desanimamos diante das dimensões e dinâmicas das problemáticas.
A ideia de pensar global e agir local pode se aplicar também aos desafios sociais. Vejamos alguns exemplos:
•A Base Nacional Comum Curricular precisa ser aperfeiçoada. Nós, aqui, precisamos desenvolver em nossos filhos (as crianças de uma turma, de uma escola ou de uma comunidade) o gosto por aprender bem.
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•As mudanças macroeconômicas são importantíssimas para a população ter melhor qualidade de vida. Devemos melhorar as condições de trabalho e renda dos adultos de nossa empresa ou de um setor em nossa cidade.
•O Brasil precisa investir em ciência e tecnologia. É prioritário que as empresas e universidades instaladas nesta cidade ou região estreitem seus laços.
•Indiscutivelmente, o País carece de um projeto de nação. Vamos definir para nossa cidade objetivos socioeconômicos para os próximos dois anos e como chegaremos lá.
Para delimitarem a profundidade das análises, o que será feito e a extensão da intervenção, os envolvidos devem construir uma visão compartilhada do presente e outra, do futuro. Onde estamos? Para onde queremos ir?
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Nesse processo, é essencial reconhecer e compensar nossos pontos-cegos, as inevitáveis áreas não percebidas no nosso campo de visão, pois ninguém vê tudo todo o tempo. Devemos combinar nossas percepções com as de pessoas cujos ângulos de observação são diferentes dos nossos, inclusive os divergentes e até os inusitados (como o da jovem da história acima).
Nesse processo, cada envolvido precisa perguntar aos demais: “O que não estou vendo?” É crucial, portanto, que aperfeiçoemos a arte ouvir de forma que os outros falem e falar de um jeito que os outros ouçam.
Dessa forma, vamos entender melhor o ecossistema em que vivemos, criar e estreitar laços de confiança, cultivar o respeito mútuo e melhorar as relações. Isso é bom para comunidades, para organizações, para casais e boas metas para o novo ano.
Feliz 2022!

*Mário Sant’Ana é tradudor e intérprete, cofundador do Projeto Resgate, organização com ações para reduzir contrastes sociais, e co-idealizador do programa Think Tank Projeto Resgate, para o desenvolvimento de habilidades de inovação intersetorial, soft skills e liderança não hierárquica. Escreve artigos para o A Notícia às terças-feiras. Contato: mario@projetoresgate.org.br
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