*Artigo por Mário Sant’Ana
“Se quisermos que tudo permaneça como está, tudo tem de mudar.”
A citação é do romance político histórico “Il Gattopardo”, de Giuseppe Tomasi e merece um pouco de contexto, pois tem mais a ver com o Brasil de ontem e de hoje do que muitos percebem.
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Na cena, o Príncipe de Salina, província da Sicília, repreende seu sobrinho por se juntar aos revolucionários que queriam unir a Itália e transformá-la em uma república. O jovem então explica sua verdadeira motivação: “Se não agirmos agora, eles vão nos impor o regime republicano. Se quisermos que tudo permaneça como está, tudo tem de mudar.”
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Deu certo. A Itália foi unida, mas não como república. Em março de 1861, foi fundado o Reino de Itália. O jovem nobre siciliano se tornou senador do novo reino, que durou até 1946.
Tudo mudou e quem tinha poder continuou com poder.
Foi o mesmo raciocínio de D. João VI, quando, em 1821, diante da inevitabilidade de o Brasil se tornar independente, sugeriu ao filho tomar a iniciativa e manter as coisas em família: “Pedro, se o Brasil se separar, antes seja para ti, que hás de me respeitar, do que para algum aventureiro.”
Deu certo. O herdeiro do trono português proclamou a independência do Brasil. Para acomodar o óbvio conflito de interesses, D. Pedro renunciou a coroa portuguesa em favor de sua filha, que se tornou Dona Maria II, uma brasileira rainha de Portugal.
Tudo mudou e quem tinha poder continuou com poder.
O pseudorrevolucionário da Sicília se chamava Tancredi. Coincidentemente, no Brasil, Tancredo Neves (100 anos depois do ocorrido na Itália), propôs que o Brasil se tornasse parlamentarista para impedir que uma junta militar assumisse o governo, após a renúncia de Jânio Quadros.
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Deu certo. O então Vice-presidente João Goulart assumiu a presidência e Tancredo se tornou primeiro-ministro.
Tudo mudou e quem tinha poder continuou com poder.
No Brasil de hoje, acordos políticos (alguns para lá de inusitados) criam no ano eleitoral o cenário perfeito para que quem tem poder continue com poder, mesmo que haja uma mudança na forma, como nos casos citados acima.
Tudo indica que, independentemente de quem vença as eleições, os núcleos de poder político e econômico sofrerão pouca ou nenhuma mudança.
Mesmo que tudo mude, é muito provável que quem tem o poder continue com poder.
Essa estrutura limita o desenvolvimento do Brasil e dificulta muito as mudanças sociais que tantos precisam. No topo, há centralização; na base, atomização; no meio, passividade na prática.
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Em Santa Catarina, o associativismo desponta como um fenômeno ao qual se deve a prosperidade de muitos dos seus municípios e a qualidade da vida social dos catarinenses. O modelo é menos centralizador, mas é importante que as instituições se mantenham oxigenadas em suas ideias, atuais em suas práticas e leais aos princípios que visam promover o desenvolvimento da sociedade e não apenas preservar o poder.

*Mário Sant’Ana é tradudor e intérprete, cofundador do Projeto Resgate, organização com ações para reduzir contrastes sociais, e co-idealizador do programa Think Tank Projeto Resgate, para o desenvolvimento de habilidades de inovação intersetorial, soft skills e liderança não hierárquica. Escreve artigos para o A Notícia às terças-feiras. Contato: mario@projetoresgate.org.br
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