Como diretor de Política Econômica do Banco Central em 2008, Mário Mesquita fazia parte da equipe que tinha a difícil missão de defender a economia brasileira da maior crise financeira em 70 anos. Cinco anos depois, o economista, sócio do banco de investimento Brasil Plural, avalia o que o BC poderia ter feito diferente na época e afirma que os fatores domésticos são os principais responsáveis pelo baixo crescimento do país hoje.
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Zero Hora – Cinco anos depois da quebra do Lehman Brothers os Estados Unidos já dá sinais claros de recuperação e a Europa ensaia sair da recessão. Podemos dizer que a crise acabou?
Mário Mesquita – Sim, parece que a crise foi superada, embora persistam preocupações em relação ao sistema bancário e as economias europeias, e embora o crescimento nos Estados Unidos siga inferior ao observado até 2008.
ZH – Quais foram as principais marcas que a crise deixou no mundo? O que o Brasil aprendeu com ela?
Mesquita – A crise levou a uma reavaliação do papel dos mercados e da autorregulação do sistema financeiro. Os mecanismos de remuneração dentro de grandes bancos internacionais, que incentivavam a tomada excessiva de risco, também foram reavaliados. Nas economias maduras, a crise levou também ao maior envolvimento dos bancos centrais com as atividades de regulação e supervisão financeira – isto não foi novidade para o nosso BC, que sempre teve responsabilidades prudenciais.
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ZH – Em que momento foi possível perceber com clareza a gravidade da situação? Qual o momento mais difícil?
Mesquita – Os Estados Unidos vinham em desaceleração e recessão desde meados de 2007. O episódio da Bear Sterns, em março de 2008, foi um alerta de problemas financeiros mais severos, mas o grande choque foi a quebra da Lehman. Até então as economias emergentes, incluindo o Brasil, vinham em crescimento muito forte.
ZH – Olhando para trás, o BC poderia ter feito algo diferente?
Mesquita – O Banco Central garantiu que a meta para a inflação fosse atingida em 2009, cumprindo seu objetivo e mandato legal. Ao mesmo tempo, o BC contribuiu para uma recuperação rápida da economia brasileira, que voltou a crescer forte a partir de meados do ano. Contudo, creio que o Brasil perdeu uma chance de reduzir a meta para a inflação, e com isso a inflação efetivamente observada, em 2009.
ZH – O Brasil saiu rapidamente da crise e cresceu 7,5% em 2010. Mas nos dois anos seguintes, avançou a uma média de 1,8% ao ano e, em 2013, pode crescer perto de 2%. O que aconteceu? São reflexo de um contexto internacional ainda não totalmente recuperado como afirma o Ministro da Fazenda ou há também fatores domésticos?
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Mesquita – O crescimento observado em 2010 foi bem acima do nosso potencial, que deve ser cerca de 3%, logo alguma desaceleração era necessária. Mas o aumento da incerteza macroeconômica também contribuiu para o crescimento econômico sofrível dos últimos anos. Há, além disso, perda de dinamismo de fatores de oferta, como o crescimento mais lento da força de trabalho, e de demanda, como o crédito. Mas o fato é que o Brasil cresceu em média 1,8% em 2011-2012, e deve seguir crescendo pouco em 2013, ante 5,4% na média no México, Colômbia, Peru e Chile, países da região que têm economias mais abertas do que a brasileira, que também contam com forte presença de multinacionais, e que são, a princípio mais expostas à economia mundial – logo há evidências que fatores domésticos são os maiores responsáveis pela performance pior do Brasil.