Uma cena presenciada por Marina Silva (PSB) há 30 anos ajuda a entender o estilo de trabalho da ex-seringueira que sonha ser presidente da República. A história tem como protagonista o ativista ambiental Chico Mendes, morto em 1988.

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– Lembro como se fosse hoje. A Marina sempre dizia que, na hora de tomar decisões, se espelhava no método dele. Chamava de método do “hum-hum” – relata um amigo de longa data, que prefere não se identificar por ser filiado ao PT.

Funcionava assim: em momentos de crise, Chico reunia gente de sua confiança e pedia opiniões. Ouvia calado. Vez ou outra, acenava com um grunhido: “Hum-hum…”. No final do encontro, fazia uma síntese. Selecionava o melhor de cada fala e chegava a uma conclusão, construída coletivamente. Com isso, o seringueiro e sindicalista conseguia reunir em torno de si desde trotskistas e ultrarradicais até religiosos ligados à Igreja Católica. Marina nunca esqueceu a lição.

– Ela não tem perfil de gestora gerentona, que sai atropelando todo mundo e tomando decisões sozinha – diz o amigo petista.

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Talvez por isso tenha fracassado na tentativa de registrar a sua Rede Sustentabilidade em 2013. Dentro do grupo, as deliberações obedecem à mesma lógica, com a diferença de que a sistemática é chamada de “consenso progressivo”. Os debates podem levar horas. Só terminam quando se chega a um acordo. Para apoiadores, o recurso traduz a “nova política” que Marina tanto profetiza.

Para críticos, soa como um artifício pouco prático e inviável na administração pública. Até defensores da ambientalista, como o deputado federal Alfredo Sirkis (PSB-RJ), têm suas reservas. No ano passado, irritado com as falhas no processo de criação da Rede, Sirkis fez um desabafo em seu blog. Definiu Marina como uma “extraordinária líder popular”, mas admitiu que ela cultiva “um processo decisório caótico” e que “reage mal a críticas e a opiniões fortes discordantes”.

A personalidade difícil não passou despercebida ao ex-ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues. Em 2003, ele e a então ministra do Meio Ambiente travaram embates históricos por conta do avanço da soja transgênica no Brasil.

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– Marina tinha uma postura radical e irredutível, muitas vezes fundamentalista. E eu não podia admitir que a questão fosse colocada para baixo do tapete, como ela queria. Foi uma luta duríssima – recorda Rodrigues, hoje coordenador do Centro de Agronegócio da Fundação Getulio Vargas (FGV).

A percepção de que Marina flerta com a intransigência não é unânime. Presidente licenciado da Associação dos Homossexuais do Acre, Germano Marino diz que tudo não passa de mal-entendido. Petista e ex-assessor da conterrânea, ele assumiu a orientação sexual aos 14 anos e nunca escondeu isso da antiga chefe. Também não omitiu sua religião – é babalorixá (pai de santo) de candomblé.

– Essas questões nunca interferiram. Ela já era evangélica e sempre me respeitou. Sabe valorizar quem se esforça – diz Marino.

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O teólogo Leonardo Boff, que conhece a candidata desde os tempos em que ela militava no PT, tem opinião diferente. No início do mês, publicou um texto com críticas duríssimas à ambientalista, lamentando o fato de Marina ter “mudado de lado” e adotado uma visão radical da religião que, segundo ele, “substitui a inteligência humana”.

Companheiro de chapa da ex-senadora desde o final de agosto, Beto Albuquerque (PSB) rechaça a avaliação. Define Marina como “uma mulher inteligentíssima” e “preparada”. Diz que ela “não é candidata a gerente, mas a liderar um processo político” e que saberá dialogar e se cercar de “bons gerentes” para administrar o país – entre eles, o economista Eduardo Giannetti e a educadora Neca Setúbal, herdeira do Itaú.

– Ela tem noção do que é governar. É uma mulher de opiniões fortes, sim, mas sabe ouvir, e isso é muito importante – diz Beto.

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COMO ELA É

Exemplo de vida

A história pessoal de superação e a aptidão para a liderança são seus pontos fortes.

Convicção ética

Não admite a hipótese de corromper princípios a qualquer custo e promete uma gestão presidencial sem condescendências às “raposas” da “velha política”.

Engajamento

Tem capacidade agregadora e consegue formar equipes comprometidas com seus ideais.

Pouca experiência

Não é uma “gerente” e não tem grande experiência em administração pública. A maior parte de sua carreira foi no Poder Legislativo.

Baixa transigência

É definida frequentemente como intransigente ao defender suas ideias, um comportamento que poderia dificultar a eventual gestão como presidente.

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Autocrítica restrita

Reage mal a críticas e a opiniões fortes discordantes.