O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) retoma nesta quarta-feira (20), a análise da tese do marco temporal para demarcação de terras indígenas. O placar que aprecia o recurso sobre a reintegração de posse pelo Instituto do Meio a Ambiente de Santa Catarina (IMA) contra a Fundação Nacional do Índio (Funai) e indígenas do povo Xokleng, que vivem no Vale do Itajaí, está quatro a dois contra a tese que pretende definir o 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal, como marco para homologação de área dos povos originários.

Continua depois da publicidade

Receba notícias de Santa Catarina pelo Whatsapp

Na sessão desta quarta-feira (20), estão previstos para votar os ministros Luiz Fux, Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e Rosa Weber. A expectativa é positiva entre o movimento indígena. A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) manifesta confiança a partir de dois votos que considera contrários ao marco temporal, das ministras Cármen Lúcia e Rosa Weber, os quais formariam maioria, com seis dos 11 votos.

Além do relator Edson Fachin, deram voto contrário os ministros Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin e Luiz Roberto Barroso. A favor do marco, votaram os ministros Nunes Marques e André Mendonça, ambos indicados pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que em quatro anos de governo não homologou um centímetro de terras indígenas.

O tema é considerado pelos povos indígenas como o “julgamento do século”, pois o entendimento do STF terá que ser seguido por todos os tribunais de todas as instâncias do país. A decisão deve impactar 270 terras indígenas e atingir 200 mil pessoas em todo o Brasil.

Continua depois da publicidade

O que é o marco temporal indígena

Os últimos dias foram de mobilização na Terra Indígena Laklãnõ, entre José Boiteux e Ibirama, de onde partiram ônibus e carros particulares. Os Xokleng querem acompanhar de perto o voto de cada ministro. Alguns estarão no plenário, como os principais líderes, enquanto outros assistem por telões montados em acampamentos.

– As mobilizações são muito importantes, pois só chegamos até aqui por causa desse movimento que vem de anos atrás. Mesmo que o marco não passe, precisamos continuar unidos para não ocorrer retrocesso no legislativo e no judiciário – alertou o advogado Rafael Modesto, assessor jurídico dos Xokleng.

terra-indigena-ibirama-marco-temporal
Terra indígena Ibirama-Laklaño, em SC, está no centro de discussão (Foto: Tiago Ghizoni, Arquivo DC)

A Apib se manifestou publicamente acerca do voto de Alexandre de Moraes, o qual propôs que agricultores que se considerem proprietários legítimos de terras indígenas sejam indenizados integralmente pela desapropriação, o que poderia travar as demarcações por mais tempo. Apesar da maioria, os Xokleng querem mais votos para reverter o voto de Moraes acerca da indenização.

Julgamento no STF põe quatro cidades de SC no centro de uma polêmica nacional

Atualmente, quando isso ocorre, o valor pago é equivalente às melhorias erguidas no território, como casas, galpões, estufas e galinheiros. No voto, o ministro Moraes sugeriu que os ocupantes não indígenas “de boa fé” que foram enganados ao comprar de empresas e mesmo do Estado terras que tinham dono (originários) poderiam ser indenizados pelo valor da terra. Zanin seguiu o voto parcialmente, enquanto Barroso o rejeitou, defendendo que a modalidade de indenizações não é o objeto da ação em análise no Supremo.

Continua depois da publicidade

Comissão do Senado pauta projeto de lei no mesmo dia do STF

Enquanto isso, a pressão é grande no Congresso. A Apib emitiu um alerta sobre mais um possível atropelo contra os direitos dos povos indígenas. A queda de braço da bancada ruralista com o STF ganhou novo capítulo quando a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado coloca a votação o PL 2903 (antigo PL 490), que pretende transformar o Marco Temporal em lei, na mesma data que o STF retoma o julgamento sobre o tema.

Aprovada na Câmara dos Deputados, a proposta recebeu parecer favorável do relator, senador Marcos Rogérios (PL-RO). Os deputados aprovaram o texto (com o número PL 490/2007, na Câmara) no final de maio, após 15 anos de tramitação.

O que acontece após a aprovação do marco temporal indígena pela Câmara

O projeto de lei autoriza qualquer pessoa a questionar o processo demarcatório, inclusive de terras indígenas já demarcadas e pode favorecer a grilagem de terras, pois reconhece títulos de terras que estão sob áreas de ocupação tradicional. A proposta também ressuscita o regime do tutelar e assimilacionismo, padrões superados pela Constituição de 1988, que negam a identidade dos indígenas e flexibiliza a política indigenista de não contato com povos em isolamento voluntário, além de reformular conceitos constitucionais como a tradicionalidade da ocupação, direito originário e usufruto exclusivo.

– O projeto está sendo analisado de forma atropelada. Os direitos dos povos indígenas estão sendo violados e não estamos sendo escutados – alertou Dinamam Tuxá, coordenador executivo da Apib.

Continua depois da publicidade

Conheça as etnias indígenas que vivem em SC

Leia também:

OriginárioSC: conheça a história dos povos indígenas de Santa Catarina

Entenda o caso de Santa Catarina que mobilizou discussão sobre o marco temporal

A tensão dos Xokleng e as versões que antecedem votação no STF