Robin Williams era o tipo de ator que parecia ter de pedir permissão ao público para ficar triste e amargar as dores e as aflições existenciais nossas do dia a dia que nem sempre estão visíveis aos menos íntimos. É a sina dos palhaços trágicos: sofrer em dobro para não decepcionar seus fãs. Diante de tipos como ele, espera-se sempre a piada na ponta da língua, a imitação perfeita (ele era craque nisso), o deboche arrasador, a careta que faz sorrir até os mais sisudos.

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Williams era da turma de humoristas que tinham no riso alheio uma espécie de purgação de seus demônios interiores. Conforme o nível de cocaína e álcool em seu tanque, podia encarnar o chapa ideal para se ter ao lado na mesa do bar ou o ogro a ser mantido acorrentado. Seu grande amigo John Belushi, astro da era de ouro do programa Saturday Night Live, era assim e capotou numa overdose, em 1982.

Tem quem vá especular agora uma relação de causa e efeito entre as notícias de Williams às voltas com novos rounds da sua antiga luta contra a depressão e o alcoolismo e o momento de baixa na carreira. Nenhuma resposta, em casos complexos e trágicos como esse, será conclusiva.

Seus trabalhos mais recentes no cinema foram comédias opacas, figuração em filmes como o drama O Mordomo da Casa Branca e as duas aventuras Uma Noite no Museu (filmou uma terceira, ainda inédita). Trabalhos em que se notava o empenho dele em mostrar o bom ator que era quando não interpretava a si mesmo, como O Som do Coração (2007), passaram batidos.

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Williams conquistou fãs no cinema por trabalhos marcantes como o radialista histriônico de Bom Dia, Vietnã (1987), o professor humanista de Sociedade dos Poetas Mortos (1989), o pai obstinado de Uma Babá Quase Perfeita (1993), o psicólogo dedicado de Gênio Indomável (1997), papel que lhe valeu o Oscar de coadjuvante, ou os médicos transgressores de Tempo de Despertar (1990) e Patch Adams (1998).

Vez que outra saiu-se razoavelmente bem em papeis dramáticos, como o do psicopata que atormenta uma família em Retratos de uma Obsessão (2002).

Mas eu sempre preferi dele um grande filme do início de sua popularidade no cinema: O Mundo Segundo Garp (1982), no qual vive um aspirante a escritor oprimido pela mãe. Nesse rico personagem, Williams combina graça, ternura e melancolia, características que talvez melhor espelhem sua persona na intimidade.

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Em uma entrevista de 2010 ao jornal britânico The Guardian, fazendo referência à retomada do vício ao álcool que o acompanhava desde 2003, depois de 20 anos sem beber, Williams disse: “Fiz coisas repugnantes. Agora é difícil recuperar o que perdi e voltar atrás.” Pode ter lhe faltado a força ou a vontade para continuar tentando.