Adiantando-se à possibilidade de que medidas anunciadas pelos Estados Unidos para reaquecer sua economia tenham reflexo no câmbio, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, garantiu que lutará para o real não voltar a se valorizar diante o dólar. A manifestação nesta quinta-feira foi um contra-ataque a críticas americanas por iniciativas brasileiras que a Casa Branca considera protecionistas.
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Orepresentante de Comércio dos EUA, Ron Kirk, enviou esta ssemana carta ao Ministério das Relações Exteriores, reclamando do aumento das tarifas de importação de cem produtos, e o governo brasileiro considerou a crítica “inaceitável”.
Nesta quinta-feira, Mantega classificou a compra mensal de US$ 40 bilhões em títulos pelos EUA como estímulo à guerra cambial. A injeção de dinheiro no mercado para reanimar a economia também seria uma medida protecionista por ajudar a desvalorizar o dólar e, assim, tornar os produtos americanos mais competitivos. E a medida poderia afetar a estabilidade do câmbio no Brasil, situado em cerca de R$ 2 há quatro meses.
Em Londres, Mantega disse que o Brasil pode comprar mais dólares e voltar a usar o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) para conter o ingresso da moeda americana. Para Fabio Silveira, economista-chefe da RC Consultores, o governo tem vasto arsenal para evitar a apreciação do real, mas deve ser adotado de forma que não cause turbulência no mercado.
– O governo pode elevar tributação sobre transações financeiras, alíquotas de importação e até determinar hibernação por algum período para o dinheiro estrangeiro que entrar no mercado brasileiro. O Banco Central vai ter muito trabalho daqui para frente – prevê Silveira.
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Com outra visão, o especialista em câmbio Nathan Blanche, da Tendências Consultoria, não crê que a injeção de liquidez nos EUA faça o dólar cair no Brasil. Para Blanche, a manifestação de Mantega é mais um revide às críticas americanas do que preocupação. Citando relatório do Banco Central de quarta-feira, o especialista observa que o saldo do fluxo de dólares entre janeiro e setembro está positivo em US$ 23,4 bilhões, enquanto nos primeiros quatro meses do ano o valor foi de R$ 25,3 bilhões:
– Ou seja, de maio até agora estamos com cerca de US$ 2 bilhões negativos. E nos últimos 12 meses o real foi a moeda que mais se desvalorizou.
Apesar da intenção do governo de sustentar o câmbio em torno de R$ 2, a valorização do dólar desde o início do ano não impulsionou as exportações, sustenta José Augusto de Castro, presidente em exercício da Associação de Comércio Exterior do Brasil. O baixo crescimento global anulou os possíveis benefícios cambiais, diz Castro.
– A desaceleração levou os exportadores a diminuir os preços.
A grande oscilação do dólar neste ano (a moeda subiu 22% entre fevereiro e maio) teve impacto na inflação, mas inferior ao esperado, afirma o coordenador de análises econômicas da Fundação Getulio Vargas, Salomão Quadros. A alta da moeda americana coincidiu com a trajetória declinante dos índices devido à queda de preços de insumos industriais importantes, como minério de ferro, derivados de petróleo e produtos siderúrgicos.
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A NOVA ONDA
O que preocupa o ministro da Fazenda, Guido Mantega:
O movimento que fez Mantega mencionar medidas para não permitir maior valorização do real é uma iniciativa do Federal Reserve, o banco central dos EUA, presidido por Ben Bernanke.
Desde março de 2009, o Federal Reserve adotou uma estratégia conhecida como quantitative easing, ou simplesmente QE. Em português, é chamado de afrouxamento monetário. Na prática, é uma forma de injeção de dólares.
A meta é oferecer mais recursos para as empresas investirem, estimulando a economia. Com mais dólares no mercado, cai a cotação da moeda em relação a todas as demais, o que torna os produtos americanos mais baratos.
Na semana passada, foi lançada a terceira rodada dessa estratégia. Por isso, é chamada de QE3.
Dessa vez, não há quantia e prazo definidos. Só terminará quando houver queda significativa no desemprego – hoje, está em 8,1%. Especialistas estimam que o valor final possa chegar a US$ 1,4 trilhão.
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A presidente Dilma Rousseff chamou essa política de tsunami monetário.