A possibilidade de punição para mensagens de teor golpista e anticonstitucional que apareçam nos atos bolsonaristas de 7 de Setembro representa um desafio para autoridades, que precisam se equilibrar entre os princípios de liberdade de expressão e de estabilidade democrática previstos na Constituição. O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) ameaça uma ruptura enquanto inflama seguidores a irem às ruas manifestarem apoio a ele e a pautas, como as que atacam o Supremo Tribunal Federal (STF). O desafio das autoridades é encontrar o equilíbrio entre os princípios de liberdade de expressão e de estabilidade democrática previstos na Constituição.

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Em São Paulo, onde apoiadores querem fazer da avenida Paulista o principal palco da mobilização, com a presença prevista de Bolsonaro, o Ministério Público Estadual diz que protestos de teor antidemocrático devem ser punidos, algo de que especialistas em liberdade de expressão discordam.

Por outro lado, a Polícia Militar (PM), que acompanha atos de rua e é responsável por identificar abusos e eventualmente intervir, está sob forte tensão. Como é esperada a participação de membros das forças de segurança (aposentados e da ativa) e o bolsonarismo goza da simpatia de uma parcela dos agentes, há dúvidas sobre uma atuação enfática se for necessária medida de orientação ou repressão.

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Tensão na presença de policiais

Além das já habituais falas de caráter autoritário nos atos bolsonaristas, outro desafio para as autoridades em relação ao 7 de setembro é a anunciada presença de policiais. A manifestação política de militares da ativa é passível de punição.

Não está claro como a PM agirá nesse caso. Há entre políticos bolsonaristas de origem militar ouvidos pela Folha de S. Paulo desde a aposta de que o governo tentará identificar militares manifestantes via policiais infiltrados ou por câmeras até a expectativa de que não seja aplicada punição, visto que esses políticos defendem não haver irregularidade.

Policiais consultados pela reportagem minimizaram a chance de confusão e afirmaram que a presença de militares no protesto traz mais ordem e segurança – apesar de admitirem que alguns desses servidores possam estar armados na multidão.

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Defesa de golpe militar contraria princípios da Constituição

À Folha, o procurador-geral de Justiça, Mário Luiz Sarrubbo, que chefia o Ministério Público de São Paulo, diz que “a simples manifestação pedindo golpe já é um movimento que contraria princípios da Constituição e do Estado democrático de Direito”. 

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Segundo ele, o Ministério Público age para garantir o direito à manifestação e para que “as pessoas possam se expressar sem que sejam vítimas de violência”. Sarrubbo defendeu “investigar eventuais organizações” que estejam promovendo atos antidemocráticos, na mesma linha da atuação do STF.

Na avaliação de Sarrubbo, só é possível constatar o teor antidemocrático quando o protesto está em curso, e não de antemão. Pedidos explícitos de golpe militar e defesa de atos de violência contra opositores da esquerda não são novidade nos protestos de apoio a Bolsonaro.

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Questionado sobre a falta de atuação do Ministério Público em relação a atos passados, Sarrubbo afirmou que não abriu inquéritos porque o STF se encarregou do tema.

— Não houve necessidade de providência prática porque houve providências no âmbito federal. Mas, em havendo desta feita, nós tomaremos. Estamos atentos a todos os movimentos que antecedem as manifestações — diz Sarrubbo.

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Juristas não recomendam proibição do ato

Especialistas da área do direito veem necessidade de separar um conteúdo antidemocrático levado ao ato e uma ameaça real, ou seja, intenção ou planejamento para execução. 

Para haver investigação e punição, dizem, é preciso haver crime – algo que não enxergam em faixas pró-golpe militar, por exemplo. Sob essa ótica, concordam que policiais não devem removê-las.

— O Estado deve evitar a supressão dos direitos fundamentais à crítica e à mobilização cívica com base em generalizações, conveniências ou mesmo especulações a respeito dos riscos envolvidos — diz Victor Leahy, advogado e pesquisador do Grupo de Pesquisa sobre Liberdade de Expressão no Brasil da PUC-Rio. 

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A observação de Leahy se soma ao alerta do professor de direito Leonardo Rosa, da UFLA (Universidade Federal de Lavras), de que um precedente na investigação de atos antidemocráticos possa ser usado de forma perigosa no futuro. 

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— Há um grupo de financiamento de oposição às instituições democráticas a ser esclarecido. Mas algumas coisas que esses grupos fazem são lícitas. Não há contradição em ter uma opinião antidemocrática e ser lícito apresentá-la numa democracia. O limite [para a ação da polícia] fica por conta de atos de violência na rua — diz Rosa.

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Atos contra Bolsonaro são vetados no dia 7

Em outra face da discussão, o direito constitucional de manifestação tem sido lembrado depois que a gestão João Doria (PSDB) proibiu qualquer ato antagônico ao do bolsonarismo no dia 7 no estado de São Paulo. A medida afeta a oposição à esquerda, que tem protesto marcado para a data.

A SSP justificou a decisão de vetar atos críticos a Bolsonaro em todo o estado no dia 7 com a avaliação de que há “elevado potencial de conflitos entre grupos antagônicos” e “risco à integridade física de manifestantes e populares”. Doria endossou a medida, que tem sido confrontada.

Movimentos e partidos de esquerda agrupados na Campanha Fora Bolsonaro foram à Justiça na sexta (27) apontar inconstitucionalidade e reivindicar o direito de fazerem a manifestação no vale do Anhangabaú.

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— A MP de preferência trabalha com a ideia de que as manifestações ocorram em dias diferentes” por segurança e sugere tentar convencer a oposição — diz Sarrubbo.

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