Sofia Maurer tem quatro anos e está em uma fase na qual vestidos são as únicas roupas que existem. Ama a cor rosa e não aceita nada que tenha azul pelo meio, argumentando que é “coisa de menino”. Adora brincar ao ar livre, usando estampas florais.

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A garota é mais comportada que um menino de sua idade, e seu comportamento vai além dos traços genéticos compartilhados pelos diferentes gêneros. A educação dispensada a cada um dos sexos ainda é visivelmente distinta e, como as mães sentem-se mais responsáveis pelo crescimento dos pequenos, são elas que acabam reforçando certos estereótipos da criação de meninos e meninas.

Uma pesquisa realiza pelo site NetMums.com, um dos maiores portais ingleses de orientação familiar, constatou, por meio de respostas das próprias internautas, que as mães são mais críticas com o comportamento das filhas do que com o dos filhos. De acordo com as respostas, 21% das mães admitiram que são mais duras com as meninas, contra apenas 11,5% das que disseram o mesmo em relação aos garotos. Além disso, 22% delas afirmaram fazer vista grossa a certos atos dos filhos.

– As mães são mais críticas com as garotas. Tudo porque queremos que as filhas tenham os gostos parecidos com os nossos – garante Kalina Mauer, mãe de Sofia, Luana e Beatriz.

De acordo com a psicóloga Iolete Ribeiro, doutora em Psicologia e Comportamento Humano pela Universidade de Brasília (UnB), a reprodução dos conceitos machistas ocorre sem a percepção das mães, que veem na proteção maior às meninas uma forma de preservá-las.

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– Porém, as meninas estão se tornando mais questionadoras, com uma percepção mais aguçada dessas diferenças. Por isso, muitas delas, com sete ou oito anos, já exigem uma autonomia que vá além do gênero – frisa.

Esse poder questionador ajuda a quebrar barreiras, mas ainda não limita o fato de que os rapazes são criados de forma mais livre. Pais costumam estimular ousadia em meninos e acentuar proteção a meninas, provavelmente para protegê-las desses mesmos meninos que criaram ousados e viris, analisa a psicanalista Cíntia Xavier de Albuquerque, membro da Associação Internacional de Psicanálise.

A especialista diz que não se pode deixar apenas a cargo da mãe a responsabilidade pelo maior senso crítico em relação às garotas. A complexidade das relações entre pais e filhos exige que seja incluída na educação a história da formação do núcleo familiar.

– Há uma mistura de fatores culturais e emocionais inegáveis nessas relações. Os meninos são muito estimulados a se arriscarem – diz Cíntia.

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Amor de filho

A psicanalista Cíntia Xavier de Albuquerque explica que o primeiro amor de um bebê sempre é a mãe. No caso dos meninos, esse amor perdura durante a infância, fazendo com que se espelhe no pai como modelo para obter a exclusividade do amor da mãe. Para Cíntia, a dificuldade que muitos pais têm, hoje, de dizer não aos filhos se reflete no comportamento deles. Em razão do apego dos meninos às mães, pode ser mais difícil para elas impor autoridade e negar as vontades deles.

– Olha o quanto é complexo: esse amor do filho pela mãe a abastece. Pode ficar difícil uma mãe dizer não para um menino porque ela também sente – mesmo que não tenha consciência disso – que está sob ameaça de perder aquele amor imenso.