Uma mulher de 27 anos procurou o Ministério Público após o filho de cinco anos, que é autista, chegar da escola com um crachá com as frases “não pode bater” e “não pode empurrar” pendurado no pescoço. Na plaquinha, além das palavras constrangedoras, há a figura de duas crianças que retrata uma briga em que um dos lados bate e, o outro, apanha. Na que representa o agressor, está colada a foto do rosto do menino, com um X vermelho em cima. 

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O MP confirmou que a denúncia chegou à promotoria na quinta-feira (25) e informou que os devidos encaminhamentos para notificar a unidade de educação já estão em trâmite. ​

O caso aconteceu na segunda-feira, 15 de agosto, na Escola Municipal de Educação Básica Alberto Bauer, em Jaraguá do Sul, em SC. A mãe, que preferiu não se identificar, conta que o menino chegou em casa com o item e que sua primeira reação ao vê-lo foi questionar se apenas ele havia ganhado o crachá. Com a confirmação do garoto, ligou para a instituição de ensino para entender a situação. 

— Eles confirmaram que só ele tinha recebido [o crachá]. À tarde, fui na escola e tive uma reunião com a diretora e o orientador. Eles explicaram que aquele era o “crachá do menino bonito”. Então, quando ele fazia alguma coisa tiravam o crachá, quando não fazia, colocavam. Não entendi muito bem — relata a mulher. 

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Segundo ela, o filho já usou o crachá em outras oportunidades e, durante a conversa, citaram que não era para ele ter saído de lá com a plaquinha.

— Soube [do caso] por um descuido deles — completa.  

A mãe diz que a criança foi diagnosticada com autismo nível 2 neste ano, mas que já era acompanhada por transtorno do déficit de atenção com hiperatividade (TDAH) e atraso global do desenvolvimento, que pode comprometer, entre outras coisas, habilidades como cognição, linguagem, competências pessoais e sociais. 

Ela ainda conta que o filho estuda no local desde o ano passado e que já havia recebido reclamações da escola sobre o comportamento do filho, mas que nunca tinha acontecido uma situação tão constrangedora como a que relata. 

A criança, segundo ela, não entendeu o que se passava, mas para ela, o choque foi imediato. 

— Ele é inocente, mas eu olhei aquilo e não sabia o que fazer. Pra gente que é mãe, dói, porque entendemos o significado. Eu já pensei que outras crianças iriam ver aquilo e se afastar dele. E a gente quer que ele se enturme, que aconteça a inclusão. Confesso que já pensei mais de uma vez de mudar ele de escola — lamenta. 

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Criança usa cordão “full time

Por nota, assinada pela diretora Célia Reichert Engelmann, a escola Escola Municipal Alberto Bauer informou que o objetivo da atividade “cordão do menino bonito” é utilizada na interação entre alunos e “suporte nos momentos em que entra em crise”. 

O texto, que identifica o menino autista como “aluno B”, ainda cita que o garoto utiliza a pista visual full time (o tempo todo) durante o período escolar e quando sua ação vai contra ao que é combinado, o item é retirado “e então o aluno percebe o ato e rapidamente volta a regular-se para receber o cordão”.

A escola ainda cita que tanto a diretora quanto a professora responsável pela criação do crachá conversaram com a mãe e o padrasto do menino no dia 19 de agosto, quatro dias após o ocorrido. A reunião serviu para explicar o objetivo da metodologia e os “combinados com a turma e o aluno B”, além de reforçar que as pistas visuais contribuem no “estímulo às habilidades da vida diária”. 

“Porém, até mesmo antes da conversa ocorrida, a professora adotou outras imagens, palavras nas pistas visuais, buscando aprimorar ainda mais a cognição e a convivência social do aluno B.

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Durante a conversa, ficou expressamente clara a compreensão da família aos objetivos propostos e aos resultados das diversas práticas pedagógicas utilizadas pela escola”, termina o texto. 

Secretaria de Educação diz que atitude foi “inadmissível”

Após repercussão do caso, que ganhou notoriedade após a vereadora Nina Santin Camello (PP) levar o assunto para a tribuna da Câmara de Vereadores de Jaraguá do Sul, a reportagem do AN conversou com Ivana Atanasio Dias, secretária de Educação do município.

Ivana diz que ficou sabendo da situação na quinta-feira e tão logo tomou conhecimento, já procurou a diretora da escola e a professora responsável por idealizar o crachá. Ela reforça que o uso de imagens é altamente pedagógico, mas o formato utilizado foi “totalmente inadequado”. 

— É inadmissível o que aconteceu. Não é porque foi com uma criança autista, isso não poderia ter acontecido com nenhuma criança. Este foi um reforço negativo, porque a criança não tem maturidade para entender. Eu, pessoalmente, fiz questão de ligar e me desculpa família — admite. 

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Ivana afirma que a rede municipal de ensino tem como metodologia o uso de pistas visuais e que, principalmente para crianças autistas, o uso de imagens é importante para auxiliar na prática pedagógica. 

No entanto, o que se aconselha é que sejam feitos reforços positivos, como cartazes demonstrando onde guardar a mochila, onde pegar um livro ou pegar um brinquedo, por exemplo, que são ensinamentos de rotina e comportamento. Jamais ilustra-se atitudes negativas. 

— O crachá foi uma “invencionice” dela [professora], que achou que seria adequado. Em vez de ilustrar crianças brigando, a orientação é colocar se abraçando, demonstrando gentileza. E se estivesse na parede, não teria problema. O erro está em pessoalizar o aluno. Não se coloca as figuras no corpo da criança ou na carteira dela — explica a secretária. 

A secretária ainda diz que a professora responsável pela ação atua no município há 20 anos e é uma “profissional excelente”, mas que cometeu um erro. Ivana assegura que as unidades de ensino de Jaraguá contam com psicólogos, fonoaudiólogos e pedagogos que utilizam a metodologia e que, recentemente, passaram por treinamento. 

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Além disso, segundo Ivana, a profissional já reconheceu que errou e continuará dando aula na instituição. 

— Quero reforçar que a atitude não é uma constante na rede, foi um caso isolado. E não teve a ver com descuido, desamor ou desafeto. É um erro que pode e já foi revisto. 

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