Todos os dias, Margarida Felisberto, 61 anos, passa pelo corredor da pequena casa onde vive, no bairro Conquista, em Balneário Barra do Sul, e olha para a foto do filho Alexandre. A imagem está colada a um quadro com os dizeres do Salmo 23, perto de fotos dos outros filhos quando ainda eram crianças. Ao lado da foto de Alexandre aos seis anos de idade, há o retrato de um garoto adolescente, mas Margarida não sabe se o filho caçula realmente ficou com aquelas feições, ou se pelo menos chegou a alcançar a idade que a imagem mostra.

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Ela foi feita com uma técnica de progressão de idade pelo Instituto Geral de Perícias (IGP), que "imagina", a partir da foto antiga e das características da família, como Alexandre seria aos 16 anos. Ele estava prestes a completar sete anos quando a mãe o viu pela última vez, deixando a casinha de madeira para brincar nas ruas de um bairro que, na época, era praticamente uma zona rural da cidade litorânea.

— Esse tipo de coisa nunca aconteceu aqui, a gente não podia nem imaginar — recorda Margarida.

Alexandre é um dos únicos casos não solucionados de crianças desaparecidas na região Norte de Santa Catarina. Como ele, há apenas o caso de Emili Anacleto, que tinha um ano e 11 meses quando foi levada de casa em Jaraguá do Sul pelo pai, que foi encontrado morto em Barra Velha três dias depois, sem nenhum vestígio da menina.

Se Alexandre estiver vivo, estará com quase 22 anos. A mãe não apenas olha diariamente para sua foto e ora para que um dia volte para casa, mas está atenta a todas as pistas que possam solucionar o mistério que começou naquele dia 22 de agosto, quando o menino não voltou para casa quando a noite chegou. Quando vai à região central de Barra do Sul, ainda olha detalhadamente para cada rosto de homem jovem e moreno que passa por ela, na expectativa de encontrar, por acaso, o filho passando ao seu lado na rua.

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Mãe e padrasto mostram recortes de jornais que acompanharam o caso nos últimos 15 anos
Mãe e padrasto mostram recortes de jornais que acompanharam o caso nos últimos 15 anos (Foto: Salmo Duarte)

O padrasto, Wilson de Almeida, que criou o menino desde que era bebê, compartilha da dor e da esperança de ter uma resposta para o desaparecimento de Alexandre. Ele conta ter recebido inúmeras pistas falsas sobre o possível paradeiro da criança, principalmente nos primeiros anos. Chegou a ir, com moto e combustível emprestados, até Luiz Alves, cidade a 60 quilômetros de Barra do Sul, onde disseram ter visto um menino chamado Alexandre que parecia com o filho deles em uma escola. Atualmente, as dicas que chegam são menos animadoras.

— Estão abrindo um loteamento aqui perto e disseram que tem um poço lá, e acham que tem ossos no fundo dele. Mas ainda não tive coragem de ir até lá para olhar — conta Wilson.

Para a mãe, por mais que doa, receber a notícia de que ele realmente está morto seria melhor do que continuar em uma espera interminável. Evangélica, ela gostaria de pelo menos ter um lugar onde poderia levar flores e fazer orações pelo filho perdido na infância.

— Se morreu, me tragam os ossos para que a gente possa fazer um enterro para ele. Queria pelo menos ter uma certeza do que aconteceu. Eu ainda sonho com ele, que está falando comigo, mas quando acordo, não tenho ele aqui — lamenta a mãe.

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Investigação foi reaberta em 2013

Alexandre desapareceu em um domingo chuvoso. Estava brincando perto de casa com outro menino, que tinha nove anos na época. O garoto contou à família e, mais tarde, à polícia, que um homem de cabelos longos e compridos havia se aproximado dos dois e se oferecido para levá-los para comprar balas. A Polícia Militar e os Bombeiros foram acionados e foram feitas buscas por toda a região, inclusive com uso do helicóptero da PM.

A Polícia Civil seguiu diferentes linhas de investigação, e um homem foi apresentado como suspeito pelo inquérito mas, por falta de provas, o Ministério Público não atendeu ao pedido de prisão preventiva. A mãe, o padrasto e o pai biológico chegaram a ser a considerados como possíveis autores do desaparecimento e um agente da Polícia Civil foi a São Paulo para averiguar se o menino não estava com parentes do pai biológico, mas nenhuma destas teorias chegou a uma resposta efetiva.

O caso ficou parado por anos até a criação da Delegacia de Polícia de Pessoas Desaparecidas de Santa Catarina, em 2013. Foi nessa época que o IGP produziu a imagem de como Alexandre seria aos 16 anos. Margarida foi visitada de novo por policiais, que colheram uma amostra de sangue para ter seu DNA no banco de dados nacional e refizeram as perguntas que a polícia havia feito quase uma década antes.

As pessoas da pequena comunidade também prestaram depoimento novamente. Há dois anos, uma única diligência foi feita, com um novo pedido de depoimento do menino, agora um adulto, que estava com Alexandre na tarde em que ele desapareceu, mas nada disso ajudou a avançar a investigação.

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— Este foi um dos primeiros casos que reabrimos quando a delegacia foi criada. Mas, dez anos depois, as pessoas já não lembram muito bem dos detalhes e tudo fica mais difícil — afirma o delegado Wanderley Redondo.

Menor, está a foto de Alexandre usada para divulgar seu desaparecimento e, ao lado, maior, como ele estaria aos 16 anos
Menor, está a foto de Alexandre usada para divulgar seu desaparecimento e, ao lado, maior, como ele estaria aos 16 anos (Foto: Salmo Duarte)

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