A aparência é de mero encontro formal marcado para as 15h30min na agenda de segunda-feira do governador Tarso Genro. Mas vai bem além de um evento prosaico.
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Rosângela Maciel, mãe da ativista do Greenpeace Ana Paula Maciel, será recebida por Tarso e vê nisso um momento-chave para resolver o drama de sua filha, presa na Rússia com 29 colegas ambientalistas que participavam de protesto contra a exploração petrolífera no Ártico.
Rosângela considera significativo o fato de o governador ter passado o sábado com a presidente Dilma Rousseff. Acha que Tarso, aliado de Dilma, traçará a partir de hoje uma estratégia para pressionar os russos. E, assumidamente angustiada, faz conjecturas, todas elas otimistas:
– Os russos têm muito a perder ao desafiar os 18 países de origem das pessoas presas e terão de provar o que dizem. Vão querer se isolar? Já me disseram, por exemplo, que são machistas, acham que mulher na cadeia só atrapalha. Creio que vão soltar a Ana.
A mãe de Ana Paula irá ao encontro com Tarso acompanhada de um emissário do Greenpeace que chega a Porto Alegre nesta segunda-feira. Depois, haverá outra reunião, desta vez com o secretário da Justiça, Fabiano Pereira, que no domingo adiantava o interesse do governo em intensificar o trabalho junto à família.
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– Vamos fazer de tudo para ajudá-la. O governador fez questão de recebê-la pessoalmente, está sensibilizado com essa situação – contou Pereira.
Rosângela cogita que Tarso lhe levará um recado de Dilma. Diz compreender que a presidente não poderia recebê-la em razão do acúmulo de compromissos, mas que estaria dando suporte ao governador.
– Essas coisas me tranquilizam, apesar da angústia. O governador não me chamaria só para tomarmos cafezinho. Me disseram que o Brasil é o país mais empenhado em resolver essa situação. As pessoas têm me ajudado. Já me disseram que a Rússia tentará dar uma volta nessa história, que deu um tiro no pé.
Desde que recebeu uma carta e o telefonema da filha às 8h39min de quinta-feira, Rosângela conversou duas vezes com Pereira. Está certa de que terá respaldo redobrado a partir de segunda-feira.
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Entrevista com especialista
Doutor em História Contemporânea no Departamento de História da Universidade de São Paulo, o professor Angelo Segrillo coordena o Laboratório de Estudos da Ásia do Departamento de História da USP. Graduou-se pela Southwest Missouri State University (EUA), cursou mestrado no Instituto Pushkin de Moscou (Rússia) e doutorado na Universidade Federal Fluminense. É especialista em história da Rússia e ex-URSS eurasiana. Sua tese de doutorado é pioneira na historiografia brasileira por ter sido a primeira tese acadêmica nacional sobre a história da Rússia/URSS baseada em pesquisa direta nos antigos arquivos classificados soviéticos e fontes primárias russas originais. Com todo esse currículo, Segrillo disse, em entrevista a Zero Hora, temer apenas pelo efeito expiatório da prisão dos 30 ativistas do Greenpeace na Rússia, entre os quais está a brasileira Ana Paula Maciel. Leia a entrevista:
Zero Hora – O senhor acha que há problemas de independência do Judiciário na Rússia?
Angelo Segrillo – Problemas substanciais de independência política do Judiciário na Rússia foram detectados por especialistas no assunto.
ZH – As prisões o surpreenderam?
Segrillo – As prisões não me surpreendem. A Rússia atualmente não é um país liberal, e a lei tem sido endurecida. Como os ativistas do Greenpeace romperam algumas proibições formais legais, era de se esperar que fossem reprimidos. Inclusive isso pode estar sendo usado como um caso exemplar para evitar tentativas semelhantes no futuro.
ZH – Há casos de homofobia e a prisão das integrantes do grupo de rock Pussy Riot. Como o senhor vê os direitos humanos na Rússia pós-czarista e pós-stalinista?
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Segrillo – A Rússia, como o Brasil, é um país com uma democracia ainda de baixa qualidade e com problemas de respeito aos direitos humanos em determinadas áreas. No Brasil, mais na área social e na Rússia mais na parte política (o estado parece estar infringindo a linha tênue entre os direitos do Estado e as liberdades dos cidadãos).