Joana dos Passos é a primeira mulher negra a ocupar o cargo de vice-reitora na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), instituição que completa 61 anos em dezembro. Ocupam a posição na reitoria junto a professora o feminismo e as lutas antirracista e contra a desigualdade — movimentos que, segundo a pesquisadora, fazem parte de quem ela é.

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—  O antirracismo, a luta contra a desigualdades, eu trago junto para a gestão porque eu me fiz nos movimentos sociais, eu me tornei essa mulher que eu sou atuando contra as desigualdades quer seja de gênero, de classe ou raciais. Eu me torno isso. Eu não tenho como tirar de mim aquilo que me tornei ao longo do tempo — diz Joana.

A nova vice-reitora é doutora em Educação pela própria UFSC. Nos últimos anos comandou o Centro de Ciências da Educação da universidade. Ela foi uma das responsáveis pela criação da Secretaria de Ações Afirmativas e Diversidades (SAAD), que deve ser convertida em pró-reitoria nesta gestão.

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A política das ações afirmativas é uma bandeira defendida por Joana e que permeia sua trajetória. A professora pesquisa há mais de 12 anos a área e defende que além de promover meios para a entrada dos estudantes, devem ser pensadas políticas de constantes.

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—  Nós temos como foco a permanência como um ponto indiscutível para assegurar que os estudantes vivenciem a UFSC, concluam seus cursos e tenham saúde mental para se concentrar nos estudos — afirma a vice-reitora.

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A expectativa dos novos reitores é que com a criação de uma pró-reitoria sejam ampliadas as políticas e atendimentos para garantir que os alunos fiquem na universidade nos cinco campi da UFSC — Araranguá, Blumenau, Curitibanos, Florianópolis e Joinville. Neste momento, 10 mil alunos estão com a matrícula trancada.

O plano é que a pró-reitoria conduza ações de acolhimento a mulheres vítimas de violência, a população LGBTQIA+, negros, quilombolas e indígenas vitimas de violência.

Joana ao lado do novo reitor Irineu Manoel de Souza
Joana ao lado do novo reitor Irineu Manoel de Souza (Foto: Catarina Duarte/NSC Total)

Primeira e única

A UFSC teve em toda sua história 13 reitores, 12 homens e uma mulher, que foi empossada em 2012, quando a instituição já tinha 51 anos de história. Nenhum deles era negro. Entre os vice-reitores, a situação é a mesma.

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—  Nós somos o país da primeira mulher negra, do primeiro homem negro em espaços que para nós, que somos a maioria da população, deveria ser comum. Mas num país racista, desigual, nós chegamos no século 21 ainda tendo que carregar esse lema — comenta Joana.

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Joana chegou na UFSC em 2013, aos 50 anos, já era professora e pesquisadora. Mergulhada entre docentes e alunos, se viu num lugar comum vivenciado por muitos negros em todo o país.

— Independentemente de eu ser uma doutora reconhecida nacionalmente, o racismo também bate em mim. Os racismos estrutural e institucional estão presentes, a gente convive com eles. Quando nós ocupamos um espaço de poder, nós continuamos convivendo com ele — afirma.

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Uma forma de mudar o cenário, conta Joana, foi botar em prática algo que aprendeu em 2015 na Marcha das Mulheres Negras. Um lema: “uma sobe e puxa outra”. Na escolha dos pró-reitores e do secretariado, que assumiu junto a ela e ao reitor Irineu de Souza na última terça-feira (4), há presença de mulheres e homens negros. São três no primeiro-escalão.

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— Eu sei o que é ser o único [negro em um lugar], por que eu fui a única por muito tempo. Por isso que nessa composição de equipe eu primei pelo fato de nós termos gestores negros e negras. Isso é extremamente necessário — diz.