Nos últimos tempos, o mundo de vários dos mais ricos homens brasileiros tem se confundido com os mundos da Polícia Federal e da Justiça. Eike Batista, ex-megabilionário, está foragido e é procurado pela Interpol desde quarta-feira. Notícias deste tipo seriam inacreditáveis há cinco anos. O País está mudando. A frase antiga, de que a cadeia é só para os pobres, aos poucos já não se aplica por completo. Mas não sejamos ingênuos para acreditar que os presídios superlotados e as celas comuns são para os endinheirados.

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A trilha contemporânea, a partir da Operação Lava-jato, não nos salva como civilização. Lógico que não. Estamos, a rigor, na antessala de um purgatório doloroso, a expiar parcela mínima de uma enorme lista de pecados cometidos ao longo de 500 anos. A história nos conta que fomos (ou continuamos a ser?) dominados por testamentos e que a colonização perversa predominou tanto, a ponto de, ainda no século 21, nossas mentes se alegrarem com os tímidos avanços institucionais recentes.

Voltemos ao fato. A história de Eike foi forjada com riquezas biliardárias amparadas em promessas e estratégias de negócios recheadas de inventividade e coragem, num comportamento que extravasou para além dos limites da responsabilidade e da ética. O “x” que aparece nas siglas de todos os seus negócios significava a ideia de multiplicação da riqueza. Um símbolo.

Riqueza demais e visível em excesso agregada à imperial arrogância, resulta no que sabemos agora. Dirão os mais céticos que este é um caso raro de busca por criminoso do clarinho branco e que, portanto, não serve para comprovar a tese esboçada no começo deste texto.

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Claro que é só um início. Porém, no âmbito da Operação Lava-jato, alguns dos mais importantes empresários brasileiros já arcam com as consequências de seus atos. Quem acha que é pouco pode até ter razão se enxergar apenas o copo em função da quantidade de presos, em relação aos que andam em carrões de luxo ou helicópteros.

Calma aí! Para haver processo – e para haver cadeia – é necessário o cumprimento de tarefas policiais e judiciárias, que exige tempo longo e persistência firme na ação. O que vale aqui não é a amplitude em si com que os juízes mandam prender executivos renomados. Até porque, por óbvio, é preciso cabal demonstração de provas para indiciar, julgar e, se for o caso, depois condenar as pessoas a penas ajustadas ao que determina a nossa legislação.

O que nos interessa, no caso, é a ideia central: há um novo olhar para os malfeitos, e a bandidagem cometida por aqueles que se acreditam acima das leis está na mira de quem tem de agir para preservar a ordem e a lei. Os corruptos e/ou infratores da ordem econômica já não podem dormir tão tranquilamente como o faziam anteriormente. Não estão mais sossegados. Sabem que podem ser arrolados na lista de possíveis investigados. Há menos complacência e mais investigação.

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O sinal é claro. O País está renascendo. Renascendo talvez seja uma expressão inadequada. Afinal, para renascer, é necessário ter morrido. No entanto, se o contexto não permite admitir isso, literalmente, ao menos serve para compreendermos o momento. A sensação é de que nem tudo está tão péssimo assim. Há um pequeno indicador de esperança.

A esperança vem da percepção de que há um movimento em curso. Um movimento na direção correta quando olhamos retrospectivamente. Refiro-me ao fato de que, até bem pouco tempo atrás, era absolutamente natural a conivência com a criminalidade, com as poucas ações de efetivo combate sistêmico. Há uma nova forma de encararmos a realidade. A ordem das coisas mudou, felizmente!

O tal do brasileiro cantado na nossa historiografia como sendo “homem cordial”, que aceita tudo com enorme passividade, vem sendo colocado à prova. Hoje, há torcida pública pelos promotores e procuradores. A parte pensante da sociedade compreende a relevância de suas ações.

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E mais: o País tem uma das melhores estruturas técnicas e tecnológicas, capaz de captar, com poucos cliques no computador, se há algum crime fazendário ou tributário em andamento. Nunca é demais lembrar que o sistema financeiro, a Receita Federal e a Polícia Federal são parte da mesma engrenagem e sabem tudo sobre todos nós, brasileiros. Eike Batista, o nosso exemplo da semana, é isso: um símbolo.