Setenta e três anos depois de sua morte, pela primeira vez a obra de um dos grande nomes da cultura catarinense está reunida em uma publicação. O livro Trajano Margarida: poeta do povo apresenta não só o trabalho do artista, como denuncia a discriminação contra a comunidade negra de Florianópolis na primeira metade do século XX.

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O trabalho ainda escancara a atualidade do debate sobre o racismo na capital e no país. Nesta quarta-feira (20), Dia da Consciência Negra, a obra tem lançamento com entrada gratuita às 19h no Palácio Cruz e Souza, no Centro da capital. Pela manhã, no cemitério do Itacorubi, foi feita uma uma homenagem diante do túmulo do poeta.

– Trazer no dia 20 de novembro a referência a Trajano Margarida é recuperar a memória dos escritores negros do pós-abolição e de toda uma plêiade de escritores esquecidos pela historiografia literária – afirmou o editor Fábio Garcia.

O livro Trajano Margarida: poeta do povo foi organizado pelas historiadoras Luana Teixeira e Lucésia Pereira depois de mais de dois anos de pesquisa.

– Trajano tinha uma atuação junto a um coletivo negro em Florianópolis na década de 20 e 30. Ele foi o primeiro presidente do Centro Cívico e Recreativo José Boiteaux, que era uma associação negra com objetivo de combater o racismo. As famílias negras que viviam no Centro da cidade enfrentavam forte discriminação num momento em que a cidade se expandia – explicou Luana.

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Livro Trajano Margarida
Trecho do “Soneto” do Livro Trajano Margarida (Foto: Reprodução/Livro Trajano Margarida)

Poesia reunida

Poeta, músico, funcionário público e artista, Trajano Margarida nasceu em 1889 em Florianópolis. Sua obra é composta por poesias, versos, livretos e marchinhas de carnaval.

– Trajano publicava muito nos jornais da época, escrevia na República, no Estado, na Folha Nova, tinha vários jornais que circulavam e ele escrevia principalmente sonetos. Na década de 30 ele publicou vários poemas chamados Três por dia, que eram poemas de crônicas da cidade, de acontecimentos do dia a dia – detalhou.

Junto a Ildefonso Juvenal e Antonieta de Barros, Trajano representa a força e a luta do homem e da mulher negra na Florianópolis do início do século XX.

– Trajano escrevia sobre a população pobre da cidade, o menino órgão que não recebe presente de Natal, sobre a mulher cega que pede dinheiro nas esquinas, o trabalhador cansado que volta para casa e também escreve sobre as dificuldades de ser um artista negro nessa cidade – afirmou.

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Livro será lançado no Palácio Cruz e Souza
Livro será lançado no Palácio Cruz e Souza (Foto: Juliana Gomes/CBN Diário)

Valorização dos negros

Desde que morreu em 1946, Trajano nunca teve o trabalho publicado nem mesmo os poemas divulgados em diários tiveram uma reunião.

– Teve um livro que chama Reminiscências, que a gente sabe que existiu, mas que a gente não conseguiu sequer encontrar um exemplar. A gente não sabe se ele conseguiu publicar de fato, mas tinha muito anseio de fazer isso. Então o livro surgiu dessa ideia de reunir a poesia dele e trazer para o grande público – informou.

Ouça a reportagem:

Ao lado de Antonieta de Barros, Ildefonso Juvenal, Trajano fez parte do grupo que trabalhou durante três anos para reunir recursos e colocar o busto do poeta Cruz e Souza na Praça XV, no Centro da capital.

– Junto com a proposta de valorização da população negra de Florianópolis, eles tinham em vista o processo de valorização da história e dos homens e mulheres negros que tinham construído o Brasil naquele momento. Ainda é uma luta de hoje – afirmou.

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No lançamento desta noite, haverá um sarau de poesias do autor interpretadas pelo rapper Daniel DKG Dekilograma, organizador do Slam Continente, e também da cantora Jandira Souza.

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