Vamos supor que há um incêndio numa clínica de fertilização e você precisa decidir se salva dois embriões ou uma criança de três anos. Quem você escolheria?

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– Nunca encontrei alguém que salvasse os embriões, mesmo que fossem cem ou mil. Se você também pensa assim, não acredita realmente que eles tenham direito à vida – diz o pesquisador Lincoln Frias, autor do polêmico livro A ética do uso e da seleção de embriões, um dos vencedores do Grande Prêmio Capes de Teses 2011, cujos resultados foram anunciados em junho.

Resultado de tese defendida por Frias na Universidade Federal de Minais Gerais (UFMG), o livro mostra que a seleção de embriões é moralmente aceitável, cientificamente defensável e humanamente desejável se respeitados critérios, princípios e limites éticos. Segundo ele, a capacidade de autocontrole, a racionalidade e autoconsciência são características que definem uma pessoa.

– O problema é que o embrião está incrivelmente longe de possuía-las. Afinal de contas, ele não possui um único neurônio que seja.

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O prêmio é um aval concedido pela prestigiada Coordenação de Aperfeiçoamento do Pessoal de Nível Superior (Capes), agência de fomento do Ministério da Educação.

Atualmente professor da Universidade de Alfenas (MG), Frias trata, sem rodeios, de temas caros para a sociedade e a comunidade científica, como as pesquisas com células-tronco.

– Poucos defenderiam que é aceitável matar seres humanos adultos para beneficiar outros ou que não é imoral matar crianças com problemas de saúde para que apenas os saudáveis sobrevivam. O que une os dois temas, portanto, é que tratam do embrião humano em laboratório, surgido da fertilização artificial, que tem menos de 14 dias e que nunca esteve em um útero. O que interessa saber é que obrigações morais existem em relação a ele. Dito de outra forma, a questão é saber se as obrigações devidas a fetos, crianças e adultos também são devidas a embriões.

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Ao contrário dos concepcionistas, que acreditam que o embrião é um de nós, o pesquisador pensa que, por reduzir significativamente a incidência de doenças hereditárias e anomalias cromossômicas, a seleção de embriões é boa para todos.

Embora deixe o debate na roda, Lincoln Frias não enxerga nenhuma razão consistente para acreditar que um embrião de até 14 dias goze do direito à vida. A tese confronta aqueles que defendem que embriões humanos adquirem situação moral igual aos seres humanos adultos.

– A morte de embriões não deve ser vista como uma ofensa a um direito porque o embrião, assim como o esperma e o óvulo, não pode ser considerado um sujeito de direito, um de nós, mas sim uma condição para que um de nós exista e, embora seja errado matar um de nós, não é errado impedir que um de nós exista – afirma.

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Especialista em ética prática, que envolve temas espinhosos como aborto, genética e direitos dos animais, o autor esclarece que o seu livro não é exaustivo nem definitivo.

– O objetivo foi apenas dar uma contribuição para a discussão sobre o uso e a seleção de embriões – conta Lincoln, que, embora convicto, não quer parecer o dono da verdade.