Por trás do político, o escritor. Diplomacia à parte, o manejo com as palavras era uma característica inegável. Luiz Henrique da Silveira exercitou a escrita ao mesmo tempo em que se dedicou à política. Em meio à agenda apertada, ao longo do caminho, dentro do carro ou no avião. No próximo dia 22, ele planejava comemorar as quatro décadas de vida pública – mesmo dia em que lançaria a última obra literária a que se dedicou, não que seria de fato a última, porque outras estavam na fila para virem a público.

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Quarentage – uma mistura de quarenta e continuidade – é o título de um compilado de artigos e crônicas que escreveu ao jornal “A Notícia” e a uma rede de jornais do interior de Santa Catarina nos últimos dez anos. A seleção dos artigos foi criteriosa. Ao final de um ano e meio de trabalho, a obra cravou em 1296 páginas. Se dependesse de Luiz Henrique, chegaria a pelo menos duas mil, tamanho o apreço que tinha pelas suas criações.

A festa de lançamento estava prevista para ocorrer no Instituto Juarez Machado. Luiz Henrique fazia questão da presença do artista e amigo no dia do evento. Juarez é o responsável pela arte da capa e honraria do prefácio. A campanha de divulgação do livro iniciaria em 11 de maio, mesmo dia em que o senador foi sepultado, em Joinville.

O responsável pela edição do livro é o jornalista e cronista Joel Gehlen, que também é responsável pela editora Letradágua. Foi ele quem editou outros dois livros de LHS: Antenas e Raízes, outro compilado de artigos, e A Vitória que Propalavam Impossível, bastidores de campanha em fotografias.

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Luiz Henrique e Joel começaram a tratar de Quarentage em julho de 2013 com previsão de lançamento para março de 2014. Porém, o trabalho foi maior do que imaginavam. Os artigos de LHS trazem muitas datas, nomes e fatos históricos que precisavam ser checados. O assessor parlamentar do senador, Álvaro Junqueira, ajudou na escolha dos textos e na apuração.

Como Joel leu todos eles minunciosamente, pode dizer com segurança que o escritor tomava muito cuidado com cada vírgula. Com ele não havia meio termo, os pensamentos eram cravados sem rodeios.

São registros que vão além da política, apesar de ela também se fazer presente. O jornalista descreve o político como um escritor dedicado e criterioso, que analisa conjunturas, momentos históricos, narra situações do dia a dia, conta histórias de pessoas que marcaram sua vida.

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Quarentage é o testemunho do que o Luiz Henrique se expressou, um legado. Acho que esse livro o coloca num patamar de literatura de muita qualidade. O que o fez ser um grande estrategista político é a visão do historiador – avalia Joel Gehlen.

Mas a morte não apaga a história. Por isso, o lançamento vai acontecer, só não tem mais data marcada. Joel ainda precisa acertar os detalhes com a família de LHS. Os exemplares, no entanto, já estarão disponíveis nas livrarias na semana que vem. Um pré-lançamento da obra ocorreu em um evento em Treze Tílias, em 27 de abril. O senador esteve no município para receber uma homenagem pelo fomento à integração cultural entre o Brasil e a Áustria.

– Ele ainda não tinha visto o resultado antes do evento em Treze Tílias. Ficou muito feliz.

Poesia em homenagem à Joinville

Entre crônicas e artigos, Luiz Henrique também rabiscou poemas. Entre eles, uma homenagem à Joinville. Esta poesia não chegou a ser publicada. Ela foi escrita entre 2004 e 2005, enquanto governador de Santa Catarina. Uma narração do texto chegou a ser veiculada na TV na época.

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– O governo do Estado estava preparando uma homenagem para Joinville no 9 de março e nós pedimos um texto para Luiz Henrique. Ele mandou esse manuscrito por fax – explica Joel.

Confira o poema escrito por Luiz Henrique da Silveira em homenagem ao aniversário de Joinville:

Estar Longe de Joinville

Estar longe de Joinville

é sentir uma dor no peito,

uma dor na alma,

que só se acalma

depois da Curva do Arroz.

Estar longe de Joinville

é sentir o que é saudade

de sua popular tradição:

dominó no Luizinho,

vitória no Ernestão.

Estar longe de Joinville,

raízes em que me achei:

a marcha da tradição

na festa do tiro-rei

flechou meu coração.

Estar longe de Joinville

é viver com água na boca.

Empadas, eisbein e marreco,

delícias que não se esquece:

Grinen Waldt e Delicatessen.

Estar longe de Joinville,

é estar perto da tristeza,

lembrando das paisagens

do mais belo infinito:

Cubatão, Piraí e Rio Bonito.

Estar longe de Joinville,

de cenários de cinema,

o coração fica dolente.

e a Cascata do Quiriri

manda lágrima pra gente.

Estar longe de Joinville,

mulher bela e caprichosa,

vestida na mata rica

de orquídeas, hortênsias e lírios.

Tens as curvas da Dona Chica.

Estar longe de Joinville,

do arrozal da Vila Nova

a vida que se renova

num Brasil que não se vê

nas notícias de TV.

Estar longe de Joinville,

suas ilhas mais que gregas,

seu verde em meio ao mar,

arquipélago deslumbrante

que Homero não pôde exaltar.

Estar longe de Joinville,

do operário exemplar,

madrugada de alvoroço,

dia e noite ele não pára.

Um Brasil que não se compara.

Estar longe de Joinville,

da indústria inteligente

com seus ISOs mil, milhões

softwere e precisão

exporta pra toda gente!

Estar longe de Joinville,

do seu mágico festival,

a cidade de toda dança:

jovem, velho e criança,

11 dias de carnaval.

Estar longe de Joinville

da revolução industrial:

com garra, arte e leveza

as crianças do Bolshoi

restauraram a realeza.

Impossível ficar longe.

Tivesse tapete mágico,

transatlântico, avião

ou trem-bala japonês,

o mundo na minha mão,

Galáxias para escolher,

Te escolheria outra vez.

Luiz Henrique da Silveira