O atendimento mínimo de metade das crianças de até 3 anos e a universalização da educação infantil na pré-escola para crianças entre 4 e 5 anos, que compõem a primeira e uma das principais metas do Plano Nacional de Educação (PNE), não estão sendo totalmente cumpridos pelos principais municípios de Santa Catarina.
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Há fila de espera para matrícula nos sete polos regionais – Florianópolis, Itajaí, Chapecó, Lages, Blumenau, Criciúma e Joinville –, que juntas têm pelo menos 14,8 mil meninos e meninas fora de creches ou centros de educação infantil (CEIs). Em algumas prefeituras, a previsão de abertura de vagas com a construção de novas unidades até o fim do ano poderá atender a quantidade de pais e mães que aguardam, mas na maioria delas o problema está longe de ser resolvido, mesmo com predomínio do apoio de instituições conveniadas.
Isso é o que apontam os levantamentos mais recentes feitos pelas secretarias municipais de Educação a pedido da reportagem. A Constituição determina que a partir dos 4 anos de idade é obrigatória a matrícula de crianças e adolescentes. O recorte entre 4 e 5 anos, inclusive, deveria contemplar todas as crianças brasileiras até 2016, segundo o PNE. Mas a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2015, do IBGE, demonstra que 9,5% ainda não têm acesso à educação no Brasil. Até 3 anos, a matrícula da criança na creche é optativa, mas caso os pais tenham interesse, o poder público deve fornecê-la.
O Ministério Público de Santa Catarina tem acompanhado a situação da região metropolitana de Florianópolis, uma das mais críticas do Estado, se considerados também São José, Palhoça e Biguaçu, que agrupam sozinhos
9 mil crianças sem acesso a creches e pré-escolas. A 15a Promotoria de Justiça da Capital afirma que o problema da rede pública de ensino está na primeira etapa, apesar de ser notória a qualidade do serviço em comparação a outras cidades brasileiras.
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“O maior gargalo está, em tese, nas creches em razão de muitos gestores públicos entenderem que não se trata de uma obrigatoriedade o oferecimento da vaga, mas de uma discricionariedade (opção). O MP tem ingressado com ações civis públicas, a fim de que o município disponibilize vaga em creches. Caso a determinação judicial não seja atendida, poderá ser aplicado o sequestro de valores para custear os estudos numa unidade educacional particular”, informou a promotoria em nota.
Jocimere Carla de Paula, 30, trabalha em Florianópolis como diarista e tem três filhos – Miguel, de um ano, Enzo, 5, e Caíque, 12. Só Caíque está matriculado. Sem dinheiro para bancar uma creche particular, Jocimere teme ser acionada pelo Conselho Tutelar.
– Estou aguardando vaga e, até agora, nada. O Enzo tem cinco anos, idade obrigatória para estar na escola – afirma Jocimere.
Enzo ainda tem os cuidados de uma amiga da família, ao custo de R$ 200 por mês, mas há muita criança deixada apenas com os irmãos. De acordo com a conselheira tutelar do Norte da Ilha, em Florianópolis, Olga Iung, a falta de vagas acarreta outros problemas, mas o foco não é prejudicar os pais que procuram vaga aos filhos.
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– Não tendo escola, a criança fica sozinha ou com o irmão, por exemplo. É mais violação de direito. Estamos pressionando a prefeitura, não os pais, porque eles estão buscando o direito dos filhos.
Serviço falho amplia risco de evasão
Quando uma criança deixa de ingressar na educação infantil, ela pode ter mais dificuldades na alfabetização. E, ao não dominar a leitura e a escrita, deixa de aprender o que deveria. O resultado potencializa a chance de ocorrer evasão escolar.
Por esse motivo, Lourival José Martins Filho, especialista em educação básica e professor da pós-graduação em Educação da Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc), defende que o ensino infantil é um direito, independentemente de qualquer categorização.
– No mundo contemporâneo, o direito de viver a infância em ambientes educacionais saudáveis e que estimulem a pergunta e a curiosidade é fundamental. Não é apenas o trabalho de pais e mães que está em jogo, mas das crianças como seres humanos da aprendizagem – defende o pesquisador.
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Reorganização reduziu espera em Criciúma
Com 50 crianças em fase pré-escolar fora de centros de educação infantil, Criciúma é a cidade com a menor fila de espera entre os sete polos regionais de Santa Catarina.
A secretária municipal de Educação, Roseli Pizzolo, afirma ter sido necessário sensibilizar as escolas de ensino fundamental a fim de ampliar o atendimento para a educação dos pequenos:
Conforme a secretária, a estratégia foi a de utilizar a estrutura pré-existente. Desde 2010, a prefeitura de Criciúma incentivou as escolas do município a colocar a educação infantil e em tempo integral:
– No começo, foi difícil se adequar a uma realidade de ensino fundamental e educação infantil convivendo juntos em um mesmo espaço. Construímos salas com banheiros conjugados ou adaptados, fizemos as saídas para o parque em horários diferentes e mantemos a rotina separada. Hoje, elas se adaptaram e o reflexo é uma ampliação da rede municipal de ensino, porque as crianças já estão ali e tendem a ficar.
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Acesso à educação infantil nas principais cidades
FLORIANÓPOLIS
Matriculados na educação infantil municipal: 13.760
Matriculados em unidades conveniadas: 1.740
Fila de espera: 1.331
Previsão de novas vagas em 2018: 1.500
O que diz a Secretaria da Educação:
Afirma que a obrigatoriedade de matrícula por lei é dos 4 aos 17 anos e não há criança na fila da pré-escola. “A fila é na creche, aquilo que a legislação não coloca como obrigação do município. No entanto, enquanto poder público, entendemos que se uma criança quer estudar temos que ter um esforço para que essa criança esteja na unidade educativa. Têm (municípios) vizinhos nossos que são muito menores e a fila é muito maior”, diz.
A secretaria argumenta que em Florianópolis, como a educação infantil é de qualidade, as pessoas não pagam unidade particular e por isso sempre há fila. Promete inaugurar novas unidades em 2018, com quase 2 mil novas vagas. São 11 unidades em construção, 10 de Educação Infantil, mas nem todas ficarão prontas neste ano.
ITAJAÍ
Matriculados na educação infantil municipal: 11.529
Matriculados em unidades conveniadas: 629
Fila de espera: 1.718
Previsão de novas vagas em 2018: 400
O que diz a Secretaria da Educação:
Ao longo do primeiro ano de governo, foram realizadas várias ações para diminuir o déficit de vagas, como a construção de novos centros de educação infantil e compra de vagas em creches particulares. Em fevereiro de 2017, mais de 4.200 crianças estavam inscritas no Fila Única. O município reduziu em mais de 50% esse número e hoje cerca de 1.700 crianças estão na fila. Embora a procura por vagas nas creches municipais aumente a cada dia, a Secretaria de Educação de Itajaí manterá esforços para reduzir e até zerar a espera das famílias.
CHAPECÓ
Matriculados na educação infantil municipal: 10.705
Matriculados em unidades conveniadas: 0
Fila de espera: Não informado
Previsão de novas vagas em 2018: 475
O que diz a Secretaria da Educação:
Afirma que a demanda obrigatória em Chapecó da educação infantil é 100% atendida. Ainda tem vagas para berçário e maternal e a orientação é para os pais procurarem o centro de educação infantil municipal mais próximo de casa. O município busca alternativas para ampliar o número de vagas. Está em construção, por exemplo, um novo centro no maior bairro da cidade, com capacidade para 100 novas vagas – 16% da obra já foram executados.
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LAGES
Matriculados na educação infantil municipal: 7.353
Matriculados em unidades conveniadas: 0
Fila de espera: 1.309
Previsão de novas vagas em 2018: 466
O que diz a Secretaria da Educação:
Informa que vários estudos, readequações de espaços, reformas e ampliações têm ocorrido, como revitalizações ou adaptações no CEIM Emília Furtado Ramos (181 novas vagas), CEIM Judite Terezinha Dias (20 novas vagas), na EMEB Nossa Senhora da Penha (70 novas vagas), na EMEB Prefeito Waldo Costa (50 novas vagas), na EMEB São Vicente (20 vagas), no CAIC Nossa Senhora dos Prazeres e no CAIC Irmã Dulce (130 novas vagas). O CEIM Pró-Morar, por sua vez, está com obra em fase de licitação (150 novas vagas). A secretaria informa, no entanto, que somente nos primeiros dias letivos de 2018 ocorreram 108 cadastros na lista de espera. A prefeitura argumenta que a lista apresenta um movimento crescente e constante e mesmo com “todo o esforço da municipalidade em abrir novas vagas, torna-se difícil a diminuição do número de crianças inscritas, bem como o referido atendimento de todas elas”.
BLUMENAU
Matriculados na educação infantil municipal: 14.279
Matriculados em unidades conveniadas:756
Fila de espera: 4.100
Previsão de novas vagas em 2018: 500 já foram abertas e outras 564 devem ser abertas caso as obras de seis novas CEIs sejam finalizadas até o fim do ano.
O que diz a Secretaria da Educação:
A rede conta com 77 centros de educação infantil (CEIs). Estão em andamento a construção de seis novos CEIs, que resultarão em 564 novas vagas em período integral e 1.128 novas vagas em meio período. As obras contam com recursos do governo federal e contrapartida do município. O prazo para a conclusão depende da regularidade no envio dos repasses do governo federal. Já foram investidos mais de R$ 2 milhões. No final de 2017, a secretaria abriu mais de 3.000 novos chamados para matrículas no Sistema Fila Única CEIs para 2018, sendo 500 referentes a novas vagas. Estas novas vagas serão possíveis pela reorganização das salas em espaços de escolas municipais e escolas estaduais do ensino fundamental, para atender Pré II e Pré III.
CRICIÚMA
Matriculados na educação infantil municipal: 4.974
Matriculados em unidades conveniadas: 4.800
Fila de espera: 50 (para pré-escola)
Previsão de novas vagas em 2018: Não informado
O que diz a Secretaria da Educação:
Ainda há vagas disponíveis nos centros de educação infantil (CEIs) da Associação Feminina de Assistência Social de Criciúma (Afasc), dependendo da região. A Afasc atende a maioria das crianças de 0 a 3 anos e a prefeitura atende as maiores. A meta é zerar a lista de espera até o início de abril. A secretaria informa que está remanejando e abrindo novas salas onde tem sido possível, com foco na educação em tempo integral.
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JOINVILLE
Matriculados na educação infantil municipal: 17.520 (6.668 em creches e 10.852 na pré-escola). Há ainda 1.441 vagas a preencher (em processo de encaixe ou validação), sendo 619 em creches e 822 na pré-escola.
Matriculados em unidades conveniadas: 497 (482 em creches e 15 na pré-escola). Há ainda 57 vagas a preencher (em processo de encaixe ou validação), sendo 39 em creches e 18 na pré-escola.
Fila de espera: 6.367
Previsão de novas vagas em 2018: 2.767, sendo 2.151 em instituições privadas e 616 em dois novos centros de educação infantil a serem inaugurados no Norte e Oeste.
O que diz a Secretaria da Educação:
A fila de espera diminuirá com a compra de 2.151 vagas nas instituições com fins lucrativos e entrega de dois novos centros de educação infantil (CEIs). O preenchimento de vagas nas creches seguem os critérios definidos no Edital 04/2017 de vulnerabilidade social, criança com deficiência e grau socioeconômico.
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A secretaria informa ter criado uma estratégia para aumentar a oferta de vagas na educação infantil desde 2013. O município entregou 10 novos CEIs, municipalizou dois CEIs comunitários, ampliou o número de salas de aulas nos CEIs da rede municipal, ampliou as turmas de 4 e 5 anos nas escolas municipais, municipalizou 3 escolas estaduais e realiza a compra de vagas em instituições privadas.
“Com esta estratégia, nos últimos cinco anos, a oferta de vagas cresceu 105,1%, sendo que, só em 2018, a ampliação foi de 7,5% na educação infantil. Nosso objetivo é continuar o crescimento para atingir as metas do Plano Municipal de Educação”, informou o município.
Fontes: Secretarias Municipais da Educação