Ter o presidente da República e um senador de um partido influente envolvidos em suspeitas de recebimento de dinheiro de origem ilícita e relações escusas com empresários provoca decepção a qualquer cidadão. Para empresários de Blumenau, o sentimento de frustração é ainda maior em razão do momento em que o governo volta a atravessar uma crise. A queda da inflação, a previsão de crescimento do PIB e outros indicativos econômicos favoráveis – usados como tábua de salvação inclusive ontem no discurso em que o presidente Michel Temer (PMDB) garantiu que não renunciará – aumentam o tamanho do tombo diante das delações desta semana voltadas sobre Temer e Aécio Neves (PSDB).

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Santa Catarina foi o Estado que garantiu a maior votação proporcional a Aécio no segundo turno das eleições presidenciais de 2014, com 64,5% dos votos válidos. E Blumenau contribuiu com esses números graças aos 145,1 mil votos recebidos pelo candidato tucano. Mais tarde, quando o país já vivia a turbulência política com o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT) e o avanço da Lava-Jato, muitos blumenauenses já se distanciavam do vínculo com o ex-governador de Minas Gerais, citado em depoimentos iniciais de delatores. Mas fichas continuaram a ser apostadas no impedimento da petista – protestos em Blumenau chegaram a levar 80 mil pessoas às ruas pedindo por mudanças, em atos apoiados pelas entidades –, que resultaria na assunção de Temer à cadeira de presidente. Se houve um sabor de arrependimento depois desses atos e das delações desta semana? Não. De frustração, talvez.

– Foi um movimento importante porque o país precisava ir para a rua, acabar com a roubalheira, os desmandos. Mas se precisar vamos para a rua de novo – garante o presidente da Associação Empresarial de Blumenau (Acib), Avelino Lombardi.

Ontem, em meio ao tsunami de informações sobre desembarques de aliados do governo, possível renúncia e procedimentos contra Temer no Congresso, o discurso de lideranças empresariais da cidade era de profunda reprovação pelos atos atribuídos aos suspeitos.

Ainda assim, em nome de um bem maior que seria a bonança econômica vislumbrada pelos executivos, alguns defenderam a permanência do presidente, mesmo diante das suspeitas explosivas, para cruzar o ano e meio restante de mandato. Se há discordância entre o que deve acontecer com o país a partir daqui, há consenso em pelo menos um ponto: o fato de este ser um momento para uma limpeza na política, independente da sigla partidária.

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Líderes políticos locais avaliam momento de turbulência

As denúncias envolvendo os principais nomes de PMDB e PSDB repercutem também no âmbito local entre os partidos. O presidente do PMDB de Blumenau, Ericsson Luef, pondera que a sigla é muito grande e que ¿as ações de uma pessoa não significam que todos são assim¿. Apesar disso, defende que a investigação prossiga e demonstra preocupação com a crise política e os efeitos na crise econômica.

– As coisas estavam melhorando, mas fatos como esses acabam destruindo tudo, o país para novamente. Se ele realmente cometeu qualquer ato, isso tem que ser resolvido logo, o mais rápido possível, para que o país não entre em crise.

O prefeito Napoleão Bernardes (PSDB) foi procurado pela reportagem, mas a assessoria informou que não havia o localizado até a noite de ontem. Para o presidente do PSDB de Blumenau, José Carlos Oechsler, a ser verdade, os fatos ¿representam frustração aos que militam no partido¿. Apesar disso, ele pontua que é preciso aguardar as instituições e que o partido sempre se pautou em defender a legenda e não o dirigente eventualmente envolvido em situações suspeitas. Sobre efeitos no cenário local tucano, Oechsler também é cético e procura desvincular os quadros e qualquer proximidade entre lideranças.

– Nossa conduta aqui tem sido de absoluta transparência e não vincula nada com fatos nacionais. Entendo que o eleitor sabe distinguir perfeitamente situação do plano nacional para o local – afirma.

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Em nota, o senador Dalírio Beber (PSDB) defendeu que se investigue tudo com agilidade e transparência e que os interesses do país devem estar acima dos políticos, individuais ou partidários. Para o deputado federal Décio Lima (PT), líder da oposição no Congresso e que esteve envolvido em processos como a formulação do pedido de impeachment apresentado ontem, a única solução é a saída de Temer e eleições diretas – uma defesa feita pelo parlamentar ao longo de todo o dia. O também deputado federal de Blumenau João Paulo Kleinübing (PSD) afirmou que em primeiro lugar o presidente Temer precisa ¿explicar de forma convincente as alegações que foram apresentadas contar ele¿ e que, caso isso não ocorra, sua permanência ficaria insustentável.

– Neste momento precisamos ter serenidade para enfrentar mais este desafio. Devemos seguir o que prevê a Constituição. Não há caminho fora dela – frisou, em uma indicação para o caminho de eleição indireta, o mais provável em caso de uma mudança no governo.

O que dizem os representantes de entidades

“Estamos falando de encontrar um jeito de governabilidade para que o país consiga crescer. Acho que a decisão do presidente Temer de continuar é acertada porque o país não pode viver de novo uma instabilidade. Precisamos encontrar uma forma de governar esse país. A sociedade tem que se manifestar, é hora de dizer ¿basta, vamos parar com a bandalheira¿, mas hoje para o país seguir em frente é importantíssimo que tivesse uma continuidade”

Avelino Lombardi, presidente da Associação Empresarial de Blumenau (Acib)

“Estamos assustados. Com tudo que está acontecendo a gente não vê uma liderança despontar. Acho que ele (Temer) não tem que renunciar mesmo, ele tem que manter. O país vai ficar na mão de quem? Se todos lá estão corroídos, ele que desfaça o Congresso. Estou sendo radical, mas seria a única forma hoje de mudança. Está tudo comprometido e dali não vai surgir liderança, alguém que consiga aglutinar forças para que o país realmente tome um rumo de novo”

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Helio Roncaglio, presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) de Blumenau

“É decepcionante porque a gente estava com otimismo, aos poucos estava voltando (a recuperação econômica) e isso foi com certeza uma ducha fria, mas bota fria nisso, gelada. Vamos passar um período sem saber o que vai acontecer, isso é horrível. Vai barrar um monte de decisões. Investimento, então, imagina… Se isso tudo se comprovar, o presidente não vai se sustentar. Alguém vai ter que pegar o lugar dele. Tem que ser feito um acordo político para ter alguém que tenha crédito. Nós, a população, temos que acreditar em quem estiver lá”

Emílio Schramm, presidente do Sindilojas

“A retomada do crescimento pode voltar a se estabilizar. Nossa preocupação em si é com as reforma trabalhista e da previdência que estão no Congresso, a gente teme que possa prejudicar o andamento delas, mas acreditamos que realmente isso ainda venha a se concretizar. É um desgaste da nossa credibilidade internacional, pois recentemente tiramos uma presidente por esse motivo. Acredito que Temer não venha a renunciar, mas corre risco de sofrer impeachment”

Elson Schutz, presidente da Associação de Micro e Pequenas Empresas de Blumenau (Ampe)

“A gente entende que o principal efeito é ter adiado a votação das reformas. Claro que a gente espera que ele renuncie para que haja eleição direta, porque eleição indireta não vai mudar, teremos os mesmos grupos administrando o Brasil e as reformas vão caminhar. É triste para o Brasil estar nesse cenário, mas a gente entende que é no voto que tem que eleger governantes e no voto tirá-los”

Sueli Adriano, presidente do Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Blumenau (Sintraseb)

“Se for verdadeiro o fato quanto ao presidente, as denúncias são graves, é obstrução da Justiça. Ele deveria renunciar imediatamente ou deveria haver pedido de impeachment dele, em razão da denúncia. É urgente que se esclareça isso, a sociedade tem direito de tomar conhecimento dessas denúncias. O impacto, além do moral que afeta a credibilidade do país, é a questão econômica, porque gera instabilidade de novo”.

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Romualdo Paulo Marchinhaki, presidente da OAB Blumenau

“É um tsunami justamente numa hora em que você tinha alguns indicadores de que a coisa ia começar lentamente a andar. O cidadão brasileiro não está conseguindo acordar. Evidentemente, os reflexos primeiros são de uma paralisia. Não se faz e não se fala outra coisa. Tem que aguardar agora os próximos dias. No primeiro momento o Brasil entrou em choque. Para avaliar, ver se o mundo acabou ou não, (como ficará) comercialmente, é muito cedo.”

Ulrich Kuhn, presidente do Sindicato das Indústrias Têxteis (Sintex)