O revisor do processo do mensalão no Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, votou nesta quarta-feira pela condenação da ex-presidente do Banco Rural Kátia Rabello pelo crime de lavagem de dinheiro. Antes, o ministro já havia votado pela absolvição de Geiza Dias, ex-funcionária da empresa de Marcos Valério, e de Ayanna Tenório, ex-dirigente do Banco Rural.
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O Ministério Público acusou Kátia de ter participado do esquema que havia omitido dos órgãos de fiscalização bancária os reais beneficiários dos saques de pessoas indicadas pelo publicitário Marcos Valério e pelas funcionárias dele, a ex-assistente financeira da SMP&B Comunicação Geiza Dias e a ex-gerente financeira da agência de publicidade Simone Vasconcelos.
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Os saques da conta da empresa, sustentou o MP, eram registrados pelo banco como “pagamentos a fornecedores”. A defesa de Kátia alega que ela não sabia das operações. Lewandowski, contudo, disse que as provas do processo comprovam “claramente” o crime de lavagem de dinheiro cometido por Kátia.
O revisor afirmou que a cúpula do banco atuava para ocultar os reais beneficiários do esquema. O ministro disse que a SMP&B emitia um cheque em favor dela mesmo, sendo os recursos, a partir de ordens por fax e por e-mail, sacados em espécie por políticos e pessoas ligadas a eles em vários lugares do Brasil. Havia casos até em que os saques eram realizados pelos beneficiários antes da emissão de cheques pelas empresas de publicidade.
– O Rural disponibilizou a sua estrutura para Marcos Valério – afirmou o revisor, citando um dos relatórios produzidos durante as investigações.
– Por meio da sistemática idealizada pelos altos dirigentes (do banco) com Marcos Valério, fazia-se com que altas somas de dinheiro chegassem a terceiras pessoas sem que o nome deles viesse a público – destacou.
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Um dos exemplos citados pelo revisor foi o caso de João Cláudio Genú, ex-assessor da liderança do PP da Câmara dos Deputados. Genú fez um saque na agência do Rural em Brasília, mas a operação foi registrada como “pagamento a fornecedores”.
O ministro chegou a questionar os métodos adotados pelo banco nessas operações:
– Por que, em pleno século 21, os réus não se valem de transferências bancárias?
O ministro disse parecer “evidente” que Kátia Rabello soubesse dos saques, conduta classificada por ele de “esdrúxula” e que “destoava tanto dos padrões do mercado”. No voto, Lewandowksi argumentou que ela passou a ocupar a presidência do banco a partir de 2001.
O esquema foi tornado público quatro anos depois, com a eclosão do escândalo do mensalão.
– É pouco crível que a dirigente máxima do banco desconhecesse os procedimentos de rotina do banco – afirmou o ministro. O revisor lembrou ainda que Kátia Rabello tinha um relacionamento estreito com Valério.
Bate-boca entre relator e revisor
Um clima de mal-estar voltou a se instalar entre os ministros Joaquim Barbosa e Ricardo Lewandowski. O relator e o revisor da Ação Penal 470 discutiram por duas vezes em menos de dez minutos hoje, no início da sessão do julgamento.
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Ao começar seu voto sobre o capítulo quatro, que trata de lavagem de dinheiro no núcleo financeiro e no núcleo publicitário, Lewandowski citou uma reportagem jornalística em que o delegado da Polícia Federal (PF) Luís Flávio Zampronha afirma que a ré Geiza Dias, gerente da agência de publicidade do empresário Marcos Valério, não deveria ter sido denunciada. Zampronha chefiou as investigações do caso mensalão na PF entre 2005 a 2011.
Enquanto Lewandowski procurava um documento, Barbosa tomou a palavra para criticar a citação.
– Vejam como as coisas são bizarras no nosso país. Um delegado preside um inquérito e, quando ele já se transforma em ação penal, ele vai à imprensa e diz que fulano não deveria ter sido denunciado. Isso é um absurdo. Em qualquer país decentemente organizado, um delegado desse estaria, no mínimo, suspenso.
O argumento foi corroborado pelo ministro Gilmar Mendes, para quem o processo tem elementos suficientes para ser discutido sem citações externas.
– É atitude heterodoxa falar com base em jornais. Isso porque dissemos que vamos apenas nos ater em provas’, disse Mendes.
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Lewandowski continuou seu voto falando que o processo do mensalão não é ‘dos mais ortodoxos’ e, ao absolver Geiza Dias, começou a desconstruir a tese condenatória de Barbosa. O estilo do revisor desagradou Barbosa.
– Isso aqui não é academia. Estamos aqui para examinar fatos e dados e dar a decisão. Vamos parar com essas intrigas’, disse Barbosa, chamando o revisor a fazer um voto ‘sóbrio’.
Lewandowski se disse ‘perplexo’ com a intervenção do colega, ressaltando que estava apenas apresentando outro ponto de vista.
– Há pontos em que nós discordamos. Jamais ousaria insinuar que [o voto] esteja incompleto ou que, de qualquer forma, não tenha atendido aos cânones processuais. Longe de mim. O senhor está fazendo ilação descabida – retrucou o revisor.
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Os ânimos só foram acalmados após a intervenção do presidente da Corte, Carlos Ayres Britto, e do decano Celso de Mello, que destacaram a importância de opiniões divergentes no colegiado. Ayres Britto garantiu a palavra para que Lewandowski continuasse seu voto da maneira que considerasse adequada.
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