Dos 82 projetos de lei apresentados pelos vereadores desde o início do ano até ontem, 20 foram considerados inconstitucionais ou apresentavam vícios de origem legais e na redação. A avaliação é feita pela procuradoria jurídica da Câmara de Vereadores e analisada pela Comissão de Constituição, Legislação e Justiça (CCJ), a primeira em que uma proposta de lei passa ao dar entrada no Legislativo. O número contabiliza textos de leis ordinárias e complementares e representa que um a cada quatro textos recebe recomendação para ser arquivada.
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O que tem chamado a atenção é o número de projetos que, mesmo tendo um parecer contrário da procuradoria jurídica da Câmara, acabam sendo aprovados pelos vereadores que compõem a CCJ. Nesses primeiros meses do ano, metade dos 20 projetos que receberam pareceres jurídicos contrários dos procuradores foram aprovados pela comissão mesmo assim.
O caso mais recente é do projeto de lei que buscava impedir a inauguração ou entrega de obras públicas inacabadas. A proposta recebeu parecer jurídico negativo da procuradoria, que sustentou que este tipo de decisão seria uma atribuição exclusiva do município. Apesar disso, os vereadores da CCJ não acataram a orientação e, por 3 votos a 1, deram andamento ao projeto de lei, proposto pelo vereador Adriano Pereira (PT).
Coube ao plenário, na sessão de terça-feira, rejeitar a proposta por 8 votos a 2. A principal defesa do líder do governo para defender a reprovação do projeto foi justamente a inconstitucionalidade sustentada pela procuradoria.
Outros dois projetos que foram aprovados pela CCJ apesar de terem sido considerados inconstitucionais pelos advogados da Câmara também foram rejeitados na votação em plenário. Outras três propostas na mesma situação, por sua vez, acabaram sendo aprovadas em plenário e seguiram para sanção do prefeito Mário Hildebrandt (sem partido). É o caso das proposta que busca fazer com que as entidades façam prestação de contas dos valores arrecadados em pedágios solidários. A ideia foi aprovada pelos vereadores e sancionada pelo prefeito.
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Outras propostas que também tiveram análise contrária do setor jurídico da Câmara, como a que tenta garantir estacionamento gratuito a pacientes que forem doar sangue em instituições de saúde do município, ainda aguardam avaliação e possível sanção do prefeito.
“É a democracia que prevalece”, defende presidente da CCJ
O vereador Jovino Cardoso Neto (Pros), que presidente a CCJ desde o início deste ano, não vê prejuízo ao Legislativo na aprovação de propostas consideradas inconstitucionais. Ele alega que os critérios variam de acordo com o procurador que analisa o projeto e sustenta que o que faz esses projetos com pareces contrários serem aprovados nesta nova fase da comissão seria a autonomia dos vereadores.
– Tenho um voto, mas há mais quatro. É a democracia que prevalece. Se o vereador entende que o projeto é bom para a cidade e que há manifestação do anseio da sociedade para que o projeto seja colocado em votação em plenário, acredito que deve ser acatada a decisão da maioria – discursa.
O presidente da Câmara, Marcelo Lanzarin (MDB), defende que a CCJ deve priorizar a análise jurídica dos projetos. No entanto, acredita que dependendo da relevância do projeto e do tema, pode ser válido levar a discussão até a votação em plenário.
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– Preferencialmente, há que se observar o parecer, é para isso que existe a procuradoria. Não se pode simplesmente jogar qualquer matéria para o plenário. Mas entendo que eventualmente se pode, e até porque a comissão tem prerrogativa de definir pauta por meio do voto, que a gente possa fazer a discussão em plenário de algumas coisas que são interessantes. Como a própria matéria sobre a inauguração de obras, que foi um tema interessante – avalia.
"Provoca retrabalho desnecessário", defende especialista
O advogado Christian Panini de Carvalho, conselheiro municipal e membro da Comissão de Moralidade Pública da OAB de Blumenau, alerta que a aprovação de leis com questionamentos sobre a constitucionalidade provoca um retrabalho desnecessário. Isso porque a lei já nasceria sem poder ser aplicada, ou com risco de ser derrubada a qualquer questionamento de um cidadão ou órgão como o Ministério Público.
– Há dois problemas neste tema. Um é que as decisões não são vinculativas. Mesmo com parecer contrário, os vereadores têm autonomia para aprovar projetos inconstitucionais, o que é um absurdo porque é andar em círculo. O outro é que qualquer um que fizer um questionamento judicial muito provavelmente vai conseguir invalidá-la. Em que pese que são vereadores eleitos pelo povo, a regra do jogo é a constitucionalidade, não se pode criar outra regra ou outra hierarquia de leis – defende o advogado.
O vereador Jens Mantau (PSDB) é relator da CCJ e nos votos costuma seguir a recomendação da procuradoria jurídica, como também ocorre com o vereador Sylvio Zimmermann (PSDB). Mesmo assim, em muitos projetos os dois acabam sendo voto vencido em decisões que liberam projetos com análise de possíveis vícios inconstitucionais. Mantau defende que não é contra as ideias dos vereadores, mas diz que a procuradoria existe justamente para guiar os vereadores a aprovarem projetos que sigam as normas das leis do país. E reconhece que a CCJ hoje têm aprovado um número grande propostas não recomendadas pelo setor jurídico.
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– Da forma como está, o prefeito Mário vai ser o (prefeito) que mais vetou projetos, porque nunca passou tanta coisa inconstitucional – aponta o tucano.
Números
Projetos analisados pela CCJ da Câmara de Blumenau
Favoráveis: 43
Contrários: 20 (destes, 10 foram aprovados mesmo assim pela CCJ)
Não concluídos: 18
Não teve: 1
Total: 82
Membros da CCJ:
Presidente: Jovino Cardoso Neto (Pros)
Relator: Jens Mantau (PSDB)
Membros: Sylvio Zimmermann Neto (PSDB), Aílton de Souza (PR) e Alexandre Caminha (PP)