“Se os governos mal conseguem lidar com a poluição, que é apenas a parte mais visível dos graves problemas de nossas praias, que se dirá das partes menos visíveis?”, questionou Valther Ostermann aqui no Santa, (21/12). O mar que todos adoram não se resume apenas à condição de uma gigantesca piscina com praia e água salgada, cloradamente estéril, para se contemplar, curtir ou tomar banho. Trata-se de um ecossistema natural, em equilíbrio dinâmico atingido às custas de constantes adaptações ao longo das eras e períodos geológicos, agora sofrendo duros golpes por parte do ser humano.

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Meu ex-professor de Zoologia, Leandro Longo, realizava fascinantes saídas a campo com os alunos, incluindo nelas o estudo da vida marinha de nossas praias e costões. Outro dia ele me comentou sobre como a vida no nosso litoral tinha decaído ao longo dos anos, desde quando começou a fazer as observações. Hoje se vê menor quantidade e diversidade de vida no mar, disse.

Eu mesmo observei isso. Há 40 anos, num raio de apenas 30 metros que incluiu os dois lados do istmo da Ponta da Faísca, próxima ao Hotel Plaza Itapema, entre as pedras expostas pela maré baixa, encontrei espécies das cinco classes de animais do Filo dos Equinodermos, a saber: Asteroides (estrelas-do-mar), Equinoides (ouriços-do-mar e bolachas-da-praia), Holoturoides (pepinos-do-mar), Crinoides (aranhas-do-mar) e Ofiuroides (caudas-de-cobra). Vinte anos depois, tudo o que achei, mesmo com ajuda de alunos, foram pepinos-do-mar, nada mais. Seria a época do ano? Não sei, mas, aposto que tem dedo estraga-bolo do ser humano nisso.

Quando fiz um curso de biologia marinha na então base Norte da USP, em Ubatuba-SP, os professores contaram que, durante a abertura da rodovia Rio-Santos sem qualquer critério ambiental, a erosão coloriu o mar com o amarelão da lama que as chuvas lavaram das encostas grotescamente desnudadas pelas máquinas. Com isso desapareceram, de um ano para o outro, TODAS as espécies marinhas que dependiam da filtração da água do mar para se alimentar. Aquela bela enseada à nossa frente era bela só na aparência. Escondia uma verdadeira catástrofe ecológica causada pelo homem. Imagine-se o que a lama da Samarco-Vale está fazendo agora, no mar rico em vida do Espírito Santo, a partir da foz do rio Doce.

A vida marinha está sofrendo tanto quanto a vida em nossas matas, onde já são comuns as “florestas vazias”, quase sem fauna. Nosso mar não pode ser um mar de aparências. O homem que o mar fascina não pode lhe ser facínora.

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Feliz 2016!