Nunca houve pegadas de ser humano em nossas praias até os primeiros ameríndios vindos do interior deixarem nelas as marcas de seus pés há não muito mais que cinco mil anos, no caso de Santa Catarina. Já os primeiros e tímidos assentamentos europeus na Ilha de São Francisco, em Desterro (atual Florianópolis) e em Laguna ocorreram entre 1650 e 1684, mais de um século e meio depois da chegada da frota de Cabral a essas tão maltratadas plagas. O povoamento catarinense de fato só passou a acontecer a partir de 1748, quando 5 mil portugueses açorianos para cá foram transferidos pelo reino de Portugal, um número expressivo para a época.
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O primeiro impacto causado pelos europeus em nosso litoral foi mais social que ambiental. Os índios Carijó, habitantes do litoral, foram dizimados, deixaram de existir como povo apenas 100 anos após a ocupação europeia. Entre os primeiros danos ambientais na província de Santa Catarina, a grande diminuição de populações de baleias foi observada pelo naturalista francês Auguste de Saint-Hilaire, que por aqui passou em 1820. Era fácil prever, escreveu ele, que as armações, estabelecimentos para processar baleias caçadas, não iriam conseguir manter-se por muito tempo.
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Faço esse ultra-resumo para lembrar que a ocupação de territórios e o uso dos espaços não pode prescindir de um planejamento que considere seu passado tanto geológico quanto social partindo, sempre que possível, da situação de equilíbrio original anterior à ocupação “civilizada” de nossas terras. No caso das praias, muitos são os impactos causados, mas, nada se compara com a veloz e brutal tomada de assalto das mesmas nas últimas décadas, onde o que menos foi levado em conta foram os fatores de um equilíbrio dinâmico de permanente modelagem e remodelagem ao longo de décadas ou séculos, às vezes abruptamente.
A ocupação “veranística” do nosso litoral caracterizou-se originalmente, em grande parte, por construções na restinga até o último centímetro antes da linha atingida pelo esparramar das ondas. Fora os milhares de avanços com aterros e muros sobre a própria faixa da areia, coisa que passou a se repetir na maioria das nossas praias. Se fosse possível sentar na varanda de frente para o mar com os pés na areia sendo acariciados pela água espumada das ondas, melhor ainda. Com a urbanização, onde foi possível, implantou-se uma “avenida atlântica”. Em outras praias, mais recentemente, são os calçadões que avançam ainda mais sobre o que sobrou de restinga e mesmo sobre a faixa de areia. (continua na próxima coluna)
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