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De fato, em julho choveu apenas 22 milímetros (medidos na RPPN Reserva Bugerkopf no Jordão), uma estiagem destacada na imprensa, em rodas de conversa, nos serviços públicos de abastecimento de água e entre preocupados agricultores. Agosto deu uma folga, mas, a partir do dia 20 daquele mês, São Pedro distraiu-se de novo e lá ficamos nós, desta vez com apenas 4 milímetros de chuvas em 30 dias, ou seja, praticamente nada.

Como muita gente, também fiquei com um olho ansioso nas previsões do tempo e outro olho apreensivo nas notícias de secas e de milhares de queimadas pelo país afora, 99,8% delas provocadas por criminosos culposos ou dolosos que assolam o país, os piromaníacos de plantão. Enfim, em 30 de setembro, generosos e bem distribuídos 89 milímetros dessedentaram o solo e esconderam, pelo menos por uns bons dias, preocupações na cabeça e pedras nos rios. Há mais de 10 anos não aconteciam períodos de 30 dias com tão pouca chuva assim.

Minha casa é um microcosmo do vale. Logo às primeiras gotas observo a água escorrer pelo telhado impermeável. Em seguida, depois de saturar os poros, a água começa a fluir sobre o acesso de concreto. Seco como estava, demorou um tempão para começar a escorrer um mínimo de água pelas encostas com área gramada. Finalmente, os 89 mm bem distribuídos em muitas horas conseguiram furar o bloqueio das bilhões de folhas nas árvores e no chão da floresta, dos milhões de galhos cobertos de musgos, bromélias e uma miríade de outras plantas epífitas antes de infiltrar generosamente no solo.

Na manhã seguinte, checo o pequeno córrego que despenca pela íngreme encosta. Ele corre tranquilo, normal, muito pouco avolumado com a significativa chuva, absorvida que foi pela floresta e pelo solo que ela cobre densamente, qual grande esponja natural, principal responsável pelo equilíbrio hídrico. Para compensar o telhado impermeável, fiz uma depressão no terreno que armazena a água que de lá escorre para então se infiltrar no solo ou ser liberada bem devagarinho. Sei que uma casa só não faz diferença, mas, se isso for feito em todas as edificações, teríamos um melhor equilíbrio hídrico tanto nas enchentes quanto nas secas aqui no vale.

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