Por Lauro Bacca, ambientalista e presidente da Associação Catarinense de Preservação da Natureza
Continua depois da publicidade
Há patrimônios ou objetos históricos cuja temática independe de sua localização física. Um museu do automóvel poderia se localizar em qualquer cidade, estado ou país. Um deles ficou muito bem instalado em Pomerode.
Museus da cerveja já não combinam com todos os lugares, se adequam mais em regiões que tenham em sua cultura alguma relação ou tradição cervejeira, caso de várias cidades catarinenses.
O magnífico Museu Oceanográfico de Piçarras poderia estar instalado em outro município, mas, de forma coerente, numa cidade ou instituição que tenha algo a ver com o mar.
> Receba notícias de Blumenau e do Vale pelo WhatsApp
Continua depois da publicidade
Muitos locus históricos são intransferíveis. A casa Anita Garibaldi, pelo menos em Santa Catarina, não tem outro lugar mais adequado que em Laguna, já que foi naquele município que a considerada heroína de dois mundos morou e passou algum tempo de sua vida.
O mesmo acontece com a casa e o terreno onde morou Fritz Müller em Blumenau, local por si só histórico e intransferível, merecendo o máximo de atenção por parte das autoridades públicas não só agora, nos 200 anos de nascimento do notável naturalista, mas, sempre.
Existem situações extremas em que o patrimônio histórico “imexível” tem que ser mexido. Foi o caso das colossais esculturas em Abu Simbel, no Egito antigo, transferidas de lugar para evitar que o patrimônio histórico mundial ficasse perdido para sempre debaixo das águas da represa de Assuã.
Salvas das águas, elas são visitadas e apreciadas por milhões de maravilhados turistas todos os anos, vindos de todas as partes do mundo.
Continua depois da publicidade
Muitos objetos históricos fazem mais sentido se preservados no contexto de seu uso ou utilidade. É o caso dos canhões das muitas fortalezas litorâneas, usados para guarnecer a costa de muitas nações. Se visualizá-los dentro de uma sala já desperta o intelecto, a imaginação e a curiosidade, imagina apreciá-los no exato local em que foram posicionados e usados. Ali, o patrimônio histórico manufaturado é potencializado ao máximo no coração e mente dos curiosos e estudiosos.
A construção da Estrada de Ferro Santa Catarina foi um dos marcos mais notáveis do desenvolvimento do Vale do Itajaí. A histórica locomotiva “Macuca” e tudo o mais que restou da antiga estrada de ferro merecem preservação histórica de alto nível.
> Leia também: Cães e gatos soltos na natureza representam riscos à fauna nativa de SC
A exposição da Macuca nas últimas décadas, numa das laterais da prefeitura de Blumenau, porém, é aleatória, não mostra a posição em que ela de fato trafegava. Sua frente deveria apontar não para o rio Itajaí, mas, sim, na direção da Avenida Martin Luther, que era o antigo leito ferroviário por onde ela trafegava desde 1908, inicialmente, levando o progresso para o interior do Vale e depois atuando como manobreira entre Itoupava Seca e o Centro.
Há algum tempo, uma placa junto ao tapume da Macuca alerta que ela vai mudar de endereço, mas, a nosso ver, não vai, infelizmente, para o endereço certo. Querem afastar a Macuca ainda mais do lugar e posição histórica onde ela trilhou o progresso da região.
Continua depois da publicidade
Qual canhão retirado do seu lugar numa fortaleza de defesa costeira para ser deixado como enfeite num jardim qualquer, pretendem que a Macuca continue ainda mais fora do seu local, servindo mais como ornamento no projeto da futura Praça da Estação do que como valorização da memória histórica do Vale do Itajaí. Projeto que envolveu também discutível corte da maioria das árvores da Praça Victor Konder, junto à prefeitura.
A Macuca pode e deve ser preservada da melhor forma, potencializando e rendendo ao máximo a memória de nosso patrimônio histórico e não simplesmente exposta para “turista inglês ver”. Ainda há tempo de voltar atrás, antes que se perpetre esse lamentável equívoco.
> E mais: Enchente de 1852 em Blumenau é superestimada e equívoco tem de ser corrigido