Quando as primeiras ruas de Itajaí foram pavimentadas, ele morava lá. Quando o porto se modernizou e ganhou ainda mais relevância, também. Quando foi criada a primeira faculdade na cidade, matriculou-se. É graças a ele que um dos principais livros sobre a história do município existe.

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A lista é grande.  

Impossível então dissociar a trajetória de Edison d’Ávila à história de Itajaí. Nascido e criado no bairro Vila Operária, descendente de açorianos, professor aposentado, historiador e apaixonado pelo lugar onde vive. Aos 75 anos, o itajaiense coleciona memórias afetivas. E foram elas, de certa forma, que o levaram onde está.

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Edison tem livros e artigos publicados, ganhou medalha de mérito do Estado, é membro emérito do Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina, entre outros. Referência quando se pensa na história da cidade, foi também secretário de Educação de Itajaí por mais de 20 anos. Entre os feitos no cargo público cita a implantação do ensino fundamental completo nas escolas, a criação do primeiro estatuto do magistério, do museu e da Casa da Cultura.

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Por trás de tanto sucesso, um enredo de batalhas.

Mais velho entre três irmãos, nascido em casa com parteira, Edison vem de uma família de portuários e pescadores. O pai trabalhava como estivador, profissional que organiza as cargas dentro dos navios. A mãe, do lar, passava os dias cuidando dos afazeres domésticos, incluindo as finanças de uma família de classe média, e do trio, que se dividia entre ir à escola e brincar com os vizinhos na rua.

À época, não existiam brinquedos. O jeito era improvisar com latas e criatividade. Quando ganharam a primeira bicicleta, Edison tinha 10 anos. Atravessava a cidade com o veículo e observava as vias sem pavimentação, os poucos carros que circulavam quase que na mesma velocidade que as carroças e a movimentação trazida pelo vaivém de embarcações.

Porém, apesar do pai sempre ter atuado como estivador, Edison e os irmãos não podiam chegar perto do porto. O pai não queria que eles tivessem contato com um local sem estrutura, sem vigilância, frequentado por ladrões e prostitutas. Foi conhecer o que faz o coração de Itajaí pulsar apenas na fase adulta, quando já era professor.

— Meu pai era enfático: “Não cheguem lá!”. Meu avô materno fundou o Sindicato dos Estivadores de Itajaí, todos os meus tios foram portuários. No meu tempo de menino só ouvia as histórias do porto, mas nunca pisei lá. Quando fui, já tinha até mudado de lugar, o trapiche de madeira deu lugar ao cais — conta.

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Educação é a chave

Para que os filhos não tivessem o mesmo destino em um serviço braçal, o pai de Edison incentivava a educação. Defendia que só com ela os três teriam um futuro melhor. Apesar da baixa escolaridade, o homem gostava de ler, o que gerou um exemplo positivo para as crianças. O primogênito não só lia com frequência, como também se destacava em matérias relacionadas à língua portuguesa e história.

Depois de passar três anos em Blumenau para fazer o chamado Ensino Médio Científico, morando no colégio, Edison precisava escolher um curso de Ensino Superior. O problema é que não havia faculdade em Itajaí. O jeito foi, novamente, deixar a casa dos pais. Decidido a fazer Letras pelo apego que tinha à escrita, foi para Curitiba. Para se comunicar com a família, mandava cartas.

E foi através de uma correspondência do pai que os planos mudaram repentinamente. A notícia do surgimento de uma faculdade em Itajaí, que teria o curso de Letras, fez Edison arrumar as malas no mesmo instante, quitar a dívida que tinha na pensão que estava morando e voltar, dois meses depois de chegar ao Paraná. O boato se confirmou e em 1965 foi aluno do primeiro curso de Letras da instituição que mais tarde se transformaria na Univali, a Universidade do Vale do Itajaí.

O empurrão

Ainda durante a graduação começou a dar as primeiras aulas de português. Professor de escolas públicas e privadas, não tinha a pretensão de ser historiador ou qualquer coisa do tipo, mesmo lecionando história para as crianças quando necessário. O interesse foi surgir da curiosidade que tinha ao escutar os familiares mais velhos.

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— A minha ligação com a História vem de dentro de casa. Minha família era muito memorialista. Comecei a me interessar pela questão e escrevi os primeiros artigos sobre a Revolução Federalista — lembra.

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Com uma máquina de escrever, o professor do ensino fundamental fez os primeiros textos sobre a revolução de 1893, com base nos relatos que ouvia dos avós. Com o papel embaixo do braço, como descreve, depois de cerca de duas horas de viagem a Blumenau — a qualidade das estradas atrasava o percurso — pediu para falar com o professor José Ferreira da Silva, fundador e diretor da Revista Blumenau em Cadernos.

Foi atendido e teve uma conversa rápida que se tornou uma mola propulsora.

— Ele leu o artigo na minha frente. E eu sentado, daquele jeito [nervoso]. Aí ele termina, olha para mim e diz: “Pois está muito bom, vou publicar. E mais: Itajaí está precisando de alguém que se interesse pela história da cidade”. Foram mais ou menos essas palavras. Saí muito animado e estimulado — revela. 

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Era começo dos anos 1970. Edison mandava artigos por correspondência e José Ferreira publicava. Trocaram conhecimentos por cartas, mas não durou muito. Em 1973 o ex-prefeito de Blumenau morreu. No entanto, deixou uma semente muito bem cultivada pelo novo amigo.

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Respeito às memórias

Edison estava empenhado nas buscas pelo passado de Itajaí. Em paralelo, dava aulas não mais a crianças, e sim a universitários. Voltou à Univali, mas do outro lado da carteira, como professor. A ligação com a Educação e com a história o fez receber o convite para ser secretário municipal de Educação, Esporte e Cultura em 1977. Foram 22 anos à frente da secretaria.

Sempre com um pé na área cultural, foi na gestão dele que surgiu o museu e arquivo histórico de Itajaí. As primeiras escolas com ensino fundamental completo também foram implementadas durante o tempo em que esteve na Educação. Até então havia somente instituições públicas de 1° a 4° ano, o que dificultava a logística das famílias, que tinham de mudar os pequenos de colégio para que pudessem continuar a estudar.

Mestre

Enquanto ensinava na universidade, trabalhava na prefeitura e criava três filhos, Edison decidiu voltar a ser estudante. Sentia-se inseguro nas pesquisas e publicações que fazia pela falta de qualificação. Resolveu o problema tornando-se mestre em História pela Universidade Federal de Santa Catarina.

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Uma década antes, em 1982, publicou o livro Pequena História de Itajaí. Com o título de mestre e todas as descobertas que fez após aquele ano, sabia que em algum momento uma nova edição sairia do forno. A atualização aconteceu apenas em 2018 e esgotou rapidamente, o que resultou em outra tiragem em 2022. São quase 400 páginas de um resgate histórico que de pequeno só tem o nome.

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— Eu tenho uma visão mais generalista da história de Itajaí. Estou muito realizado porque além de fazer o que gosto, sei do significado, da importância social que tem — orgulha-se.

Todo o esforço dos pais de Edison valeu a pena. A irmã também foi professora e o irmão, ex-fiscal da Fazenda do Estado e dono de uma empresa no ramo portuário.

Presente, passado e futuro

Não só as escolhas profissionais de Edison estão ligadas à própria família. A devoção católica, ensinada pelos pais desde cedo, acabaram o levando à esposa. Ele ainda era universitário quando começou a conversar com uma jovem que encontrava todos os domingos na missa. O namoro tradicional, com etapas que foram de conversas do lado de fora da casa da moça a idas ao cinema, terminou em um casamento que dura 51 anos.

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Márcia d’Ávila e Edison têm três filhos. Criaram o trio sem luxo, mas em um ambiente rico de bons ensinamentos. Márcia também foi professora e dois dos filhos do casal seguiram os passos dos pais e dão aulas. O outro, além de músico, trabalha no setor portuário com o tio.

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A vida de Edison e da família se entrelaça com a de Itajaí, inevitavelmente. O menino tímido, que só foi ter uma geladeira dentro de casa aos 15 anos, viu com os próprios olhos a modernização que a cidade e a própria vida passaram.  

E continua vendo, assim como os outros 226 mil moradores da cidade, conforme estimativa do IBGE. Aos 162 anos, Itajaí é o que fazem dela: um lugar que respira desenvolvimento e transpira história. 

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