Cinco mil garrafas com vinho produzido a partir das uvas Poloesk, Baylet, Cabernet Sauvignon e Goethe são o tesouro guardado do aposentado Carlos Tratsk, 71 anos, no Meio Oeste catarinense. E o pensador alemão que divide o nome com a variedade símbolo da vitivinicultura da região de Urussanga, Sul de Santa Catarina – aliado a uns goles da bebida dos deuses – deve ter inspirado as 40 frases que foram coladas em cada unidade junto com o rótulo, que leva um brasão e a inscrição Vinho do Carlão.
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A casa de três pisos, onde a entrada tem um belo jardim, abriga uma área quase secreta. No porão da residência, que não é visível da parte frontal do imóvel, Carlão montou uma adega que parece um labirinto. O projeto, feito pela filha que atualmente é médica mas chegou a estudar Engenharia Civil, mantém o ambiente arejado, com pouca luz e ambiente fresco, ideal para conservar o produto.
As condições adequadas são importantes, pois Carlão produz o próprio vinho e não usa nenhum conservante. A garrafa mais antiga do seu acervo é de 1981. A poeira acumulada e algumas teias de aranha comprovam que aquela garrafa não é mexida faz tempo.
Diariamente, o aposentado toma um cálice nas refeições. Talvez por influência dos genes da mãe, de família italiana, apesar de o pai, descendente de ucranianos, também ter sido um apreciador da bebida do deus Baco.
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Carlão começou a produzir vinhos em 1967. E em 1969, fabricou a bebida servida no próprio casamento, em 1969, com Terezinha Tratsk. A noiva aprovou o resultado. Em alguns anos ele chegou a produzir 4,5 mil garrafas. Parte da produção ele vende.
O aposentado tem uma parceria com um agricultor de Pinheiro Preto e diz possuir uma técnica secreta para conferir se as pipas foram violadas durante a fermentação, de forma a garantir a qualidade do líquido. Parte das garrafas ele guarda para a família e, algumas são preservadas para a coleção.
Entre taças, a paixão pelas ferrovias
Na sua adega, Carlão já recebeu autoridades e personalidades como o nadador Fernando Scherer e o comandante da Polícia Militar, o coronel Nazareno Marcineiro. Entre uma taça de vinho e outra, ele fala de sua paixão pelas ferrovias, do tempo em que era maleiro na Estação Ferroviária de Herval D’Oeste, e das malandragens que fazia com seus companheiros, como criar uma linguagem própria para enganar os policiais e garantir uma boa gorjeta dos viajantes.
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Carlão ainda tem o sonho de voltar a ver o trem passar diariamente pela cidade, cheio de cargas e passageiros.
– Quero que meus netos saibam que seu avô lutou para isso – diz. Aí, tomar uma taça de vinho terá um sabor especial.
Inspiração para lembrar boas histórias
Para Carlos Tratsk, uma taça de vinho também é a inspiração para contar boas histórias. Ele disse que adora viajar e, onde estiver, sempre leva uma garrafa de vinho para acompanhar as refeições.
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Carlão não é muito de comprar ou experimentar o vinho dos outros.
– Às vezes me dão dor de cabeça – explicou.
Carlão disse que não gosta de beber sozinho. Para ele, tomar vinho requer companhia, para desfrutar de uma boa conversa. E quem senta com ele para uma breve conversa, quando vê já ficou horas conversando.
E ele tem muita história para contar. Nascido em 1942, morou em frente à Estação Ferroviária de Herval D’Oeste. Lembra que quando adolescente, corria para pegar o trem antes de chegar na estação para guardar lugar para alguns passageiros, em troca de um dinheirinho.
– Até me falta uma unha do pé de tanto tropeçar nos dormentes – mostrou Carlão, tirando o calçado do pé esquerdo.
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Depois, Carlão virou empresário. Hoje, aposentado, cuida do jardim, da fabricação de vinho e da defesa das ferrovias. Em 2009 ele levou a demanda para uma Assembleia Distrital do Rotary, em Lages. A iniciativa tomou corpo e, na semana passada, foi assinado o edital de estudo da Ferrovia da Integração, entre Dionísio Cerqueira e Itajaí, passando por Herval D’Oeste. Por isso, Carlão já merece um brinde.