Não percebeu o carro a se aproximar. Não lembrou que dois corpos não podem ocupar o mesmo lugar. Não viu que à sua volta tudo era realidade. Foi atingida, sofreu ferimentos, deslocou ossos. Não capturou o Pokémon que seu celular exibia na tela. Tem quinze anos e, talvez, seja hora de olhar ao redor o mundo acontecendo.
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Outros dois jogadores do game Pokémon Go, criado pela conhecida Nintendo, em parceria com a empresa Niantic, caíram em penhascos enquanto caçavam os bichinhos. A outros milhões de jogadores, nada disso aconteceu. Não vou, pois, satanizar o jogo. Acho até interessante ser quase real, ser tão surreal e fazer você caminhar em busca dessas coisas, como se essas coisas estivessem realmente andando próximas, logo ali.
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Acidentes acontecem. Mas acho que faltou um pouco de inteligência aos jogadores envolvidos. Porém, não vamos discorrer sobre intelecto. Há, sim, muito a se discutir sobre como a realidade virtual tem dado as cartas às novas gerações. Até que ponto vamos nos envolver com a tecnologia e deixar de lado coisas do velho mundo, palpável, com cheiro de brinquedo e terra? Será a vida real tão chata e enfadonha que queiramos desligar o mundo e buscar essa dimensão ilusória?
Estive recentemente em uma loja de brinquedos educativos (o termo não ajuda), e foi tanto encantamento ao redescobrir jogos inteligentes e desafiadores feitos de madeira, papelão e plástico, que desejei comprar a coleção completa e chegar em casa, abrir todos e ser criança de novo no chão da sala, aos pés de meus pais.
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Há um tanto de nostalgia nesse parágrafo, eu sei. O mundo caminha adiante, vamos ficando velhos e resistentes às novas realidades, talvez não à inovação tecnológica, mas a como lidamos com ela. É saudável, de verdade, o jeito como nossas crianças e jovens lidam com isso, por terem nascido em um mundo com características tão virtuais? Que magia é essa que nos tira os pés do chão e, ao mesmo tempo, traz tanto a sensação de tempo perdido? Quando voltaremos a pisar a terra, a lama e tudo o que nos faz sentir vivos? Onde ficará nosso corpo quando estivermos cem por cento conectados com o mundo virtual? Onde ficará o cheiro da casa da vó? Da chuva? Do mato molhado? Da bola no gol? Como sentiremos novamente o corpo cansado depois de uma tarde inteira sob o Sol, correndo com uma lata de óleo na mão, de onde uma pipa ganha o céu?