O Félix atrasou.
– Segunda vez nesta semana, mãe. Não tenho mais paciência, não. Me arrumo toda e tenho que ficar feito um dois de paus esperando o infeliz. Ele que vá catar coquinho.
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A mãe abriu a boca sem ter muito o que dizer, mas sabendo que a filha, na opinião dela, se precipitava.
– Cuida da Lucinha pra mim, ela não vai acordar. Qualquer coisa, é só balançar o berço. Eu vou de táxi mesmo. E se ele aparecer por aqui, diga que é pra não ir.
A mãe abriu a boca sem som, nem argumento. A filha fechou a porta e voltou a abrir em seguida. Beijou a mãe na testa e passou carinhosa, mas brevemente, a mão por seu rosto.
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– Feliz Ano-novo.
A teimosia dói no corpo de quem teima. Nada de táxi, caminhou até o ponto de ônibus, levou mais de uma hora para chegar ao destino.
– Poxa, Cibele, pensei que não vinha mais.
– Ah, nem te conto, viu! O estrupício do Félix… Que ódio!
– Ele não vem?
– Espero que não. Tem alguma coisa pra eu beber?
Não demorou um minuto, Cibele dava longos goles em um espumante nacional. Não demorou cinco, a contagem começou. Três, dois, um, zero! Gritos de feliz Ano-novo ecoaram pela sala. Gente que a moça nunca havia visto a abraçava com entusiasmo. Assim que pôde, desvencilhou-se dos desejos de vida melhor dos mais diferentes personagens da festa. Serviu-se de mais espumante e bebeu de uma só vez. Voltou a encher. Olhou pela janela a urbe da qual nunca se livraria. Bebeu da taça, pegou a garrafa e serviu-se mais um pouco.
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Sentiu umas mãos envolver-lhe a cintura e um nariz roçar-lhe a nuca. Sabia muito bem quem era, quis jogar-lhe na cabeça o líquido que sobrara na garrafa. Mas foi só os lábios de Félix tocarem-lhe a ponta da orelha e tudo ficou para trás.
– Desculpa.
– Chegou tarde.
– Tarde pra 2016, mas supercedo pra 2017.
É assim: algumas coisas, a gente não quer deixar no ano que passou, começar do zero dá muito trabalho.
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