Bateu uma saudade, assim meio que do nada, e ela “guglou” um colega metaleiro que conhecera aos dezesseis. As recordações do início dos anos dois mil vinham com cores lavadas, mas era nítida a lembrança do rapaz: cabelo até a cintura, roupas negras, pulseiras, tênis All Star e um certo olhar de desdém para o mundo. Era integrante de uma banda de black metal. Ela não sabia definir a fonte de sua saudade: o rapaz ou a época de colégio? Por estar perto de completar 30, talvez estivesse tentando agarrar-se à juventude, “essa praga passa rápido demais!”

Continua depois da publicidade

Digitou nome completo e aguardou as imagens do roqueiro. Não vieram. O tempo, travesso, trintou o menino com ares de executivo, trajava agora camisa social e um cabelo curtíssimo. “Ficou apagado”, avaliou. Soube que o pai morreu e ele precisou se virar na vida. “A realidade não mantém a pessoa alternativa por muito tempo. Pelo menos não nas aparências. You must blend in“.

Confira notícias de Joinville e região.

A cultura popular costuma retratar os 30 como os melhores anos da vida, algo a ver com segurança e liberdade. Diz a ciência (segundo Mr. Google) que a felicidade verdadeira começa aos 33 e que os 35 são, de fato, a melhor idade. Contudo, e porque não somos perfeitos, os 30 também são uma época de crises existenciais, insatisfações e um início de desavença com o relógio biológico. Diz também que os que trintam tendem a fazer uma auditoria da vida. Isso costuma doer um pouco. (A última frase é minha.)

Um psicólogo de Harvard disse que depois dos 30, a personalidade está assentada como reboco de parede. Acho isso ruidosamente definitivo. Como me parece definitivo creditar à idade cronológica as mudanças mais radicais. Como diz uma jornalista conhecida minha e que beira os 30, “as experiências vividas causam mais mudanças do que a idade”. E continua: “Jura, as experiências é que definem nossas características em cada fase da vida. A idade é um conceito social e mutável, de acordo com o tempo e a cultura – um exemplo é a criação do conceito de adolescência, que se deu apenas no final do século 19, início do 20, na sociedade ocidental. Da mesma forma, acho que os 30, hoje, diferem muito dos 30 de duas gerações atrás, quando a expectativa de vida fazia parecer que íamos já pela metade da vida”.

Continua depois da publicidade

O rapaz despiu-se do All Star e apertou a gravata em seu pescoço porque precisou se virar. Agora, aos 30, tem ele mais certezas do que antes? Ou a vida continua dando as cartas e bagunçando tudo a cada rodada nesse jogo cujas regras talvez jamais saibamos?