O juiz federal norte-americano Thomas Griesa negou nesta quinta-feira o pedido do governo argentino para suspender a sentença que obriga o pagamento de US$ 1,3 bilhão aos fundos de investidores (“abutres”, segundo os argentinos), que compraram títulos podres e contestam o acordo de reestruturação da dívida soberana do país após o calote de 2001. A decisão levou à suspensão do pagamento feito à tarde pelo país e aumenta as chances de um calote da dívida pública. Com o bloqueio, a Argentina ganha mais 30 dias para tentar chegar a um acordo sobre o pagamento das dívidas.

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Em despacho, o juiz informou que a ordem de pagar aos fundos especulativos não entra em vigor a menos que o país pague aos detentores de títulos reestruturados. Ele destacou ainda que um mediador foi nomeado para o caso e acrescenta.

– Este tribunal entende que as renegociações [entre a Argentina e os fundos] incluirão o manejo de futuros pagamentos dos papéis reestruturados – acrescentou.

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Hoje, o governo argentino depositou US$ 1 bilhão em um banco de Nova York para pagar parte do que o país deve aos 93% dos credores que aceitaram a renegociação entre 2005 e 2010. Na segunda-feira, vence uma parcela de US$ 900 milhões. De acordo com o ministro da Economia, Axel Kicillof, a Argentina decidiu antecipar o pagamento e depositar mais que a parcela devida para mostrar a intenção do país em honrar os compromissos.

O dinheiro depositado, no entanto, poderá ir para os fundos de investimentos, que compraram títulos podres e pedem, na Justiça, o recebimento da totalidade sem desconto. Isso ocorrerá por causa da sentença do juiz americano em vez dos credores que aceitaram a reestruturação, que prevê desconto de 60% do total devido.

Além desse grupo, que ganhou na Justiça o direito de cobrar US$ 1,3 bilhão, existem outros credores (que representam 6% do total) – a maioria com ações na Justiça. Se todos ganharem, a Argentina teria que desembolsar US$ 15 bilhões – mais da metade das reservas no Banco Central, o que seria inviável para a economia do país, segundo diz o governo.

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PARA ENTENDER A DISCUSSÃO

A origem

Em 2001, sob a mais grave crise econômica de sua história, em meio a protestos, a Argentina decidiu parar de pagar sua dívida pública.

Uma saída?

Em 2005 e 2010, o país propôs a troca de títulos com grande desconto. Ficou estabelecido que o governo não poderia fazer proposta melhor.

Aqueles 7%

Um total de 93% dos credores aceitou a solução argentina. Os outros 7% recorreram à Justiça americana para receber os valores integrais.

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Os “abutres”

Atentos a um bom negócio, fundos como o NML adquiriram parte dos títulos da Argentina. Apostavam que conseguiriam o valor integral.

O veredicto

A Justiça dos EUA confirmou decisão do juiz de Nova York Thomas Griesa. Deu razão a um grupo de “fundos abutres” e obrigou a Argentina a pagar US$ 1,3 bilhão.

Prazo curto

Pela decisão, a Argentina terá de fazer esse pagamento já em 30 de junho. É a mesma data prevista para o pagamento dos credores da dívida reestruturada.

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A projeção

Com a cobrança de 100% também por outros credores (a legislação prevê isonomia), o total a ser desembolsado pela Argentina pode chegar a US$ 15 bilhões.

Pouca gordura

Aqui está o maior motivo de tensão. As reservas argentinas em moeda estrangeira são de US$ 28 bilhões. Torna-se inviável cumprir os compromissos.

A tentativa

A Argentina ainda pretende tentar uma negociação, apesar dos sinais contraditórios. Poderia ser o começo de outras tratativas com todos os credores.

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O objetivo

A negociação, que terá de ser feita com Griesa visa ganhar tempo. Vence em dezembro a cláusula que garante direitos iguais a todos os credores.

OS TERMOS DA CRISE

Bônus

Forma de chamar os títulos da dívida. São papéis que o governo vende para se financiar, prometendo em troca remuneração pelo tempo em que ficar com o dinheiro do investidor. Há bônus a credores externos e internos. No Brasil, quando alguém aplica em fundos de renda fixa, está comprando títulos do governo.

Credores

Quem compra títulos de governos ou empresas. Antecipa recursos ao emissor de bônus e recebe juros. Pode resgatar o valor aplicado.

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Default

Falta de pagamento de compromissos. Quando é organizado, também é chamado de moratória (palavra que vem de ‘mora’, ou seja, atraso).

Dívida soberana

É o conjunto de compromissos financeiros de um país, em moeda nacional ou internacional (em geral, dólar ou euro).

Fundos especulativos

Especialistas em comprar com desconto títulos de países ou empresas à beira da quebra – ou quebrados – para lucrar com a reestruturação ou na Justiça (“abutres”, na Argentina).

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Holdouts

Expressão corrente na atual crise argentina. São os credores que não aceitaram renegociar a dívida que, com grande desconto sobre o valor originalmente devido, teve aceitação de mais de 90% dos demais. Os fundos que obtiveram vitória na Justiça dos EUA são “holdouts”.

* Zero Hora e Agência Brasil