O breu da madrugada e as risadas boêmias são alguns dos elementos que inspiram a arte de Juarez Machado, ainda que não seja o mesmo céu estrelado que cobria sua infância que ele agora observa de seu ateliê principal, em Paris.
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Juarez era muito jovem quando passava as noites na casa da avó materna, na rua dos Ginásticos, e se divertia na madrugada escutando as conversas e risadas de quem saía dos bailes no salão da sociedade que dá nome a uma das ruas centrais de Joinville.
Um poste de metal podia tornar-se instrumento musical para os festeiros. Eles já não são comuns na cidade natal de Juarez, mas pilares com o mesmo material ainda existem na paisagem de Montmartre e o fazem lembrar daquelas noites da infância quando os boêmios fazem festa nas ruas do bairro parisiense.
É desta criança cheia de imaginação e de fontes de inspiração que nasceu o artista Juarez Machado. Ele carrega em sua essência boa parte das experiências dos primeiros anos de vida, passados em Joinville. Enquanto desenhava com destreza um tanque de guerra aos três anos – quando o mundo vivia o auge da Segunda Guerra Mundial – e fazia sua primeira tela aos onze, demonstrava os primeiros sinais do artista que viria a ser.
O primeiro desenho registrado: um tanque de guerra desenhado aos 3 anos na borda de um jornal
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Juarez cresceu em uma casa da rua Padre Kolb, no bairro Bucarein – na época, o endereço ainda era conhecido como rua Dom Pedro 2º. Apesar da personalidade ímpar, que às vezes chegava a assustar a mãe, Leonora Machado – como no dia em que ele coletou animais mortos e os colou na parede do quarto – boa parte do aprendizado foi bebido da fonte da família. Leonora dedicava-se à casa, mas pintava leques de seda para a Companhia Hansen, atual Tigre.
Com a mãe, Leonora Busch Machado, em pose para o clique criativo do pai, João
João Machado era caixeiro-viajante e passava muitos dias fora da cidade. Mas compensava a ausência quando retornava para casa.
– Ele trazia uma mala com as roupas e outra mala cheia de coisas interessantes que garimpava no caminho – conta Juarez.
Entre os artigos trazidos na mala, vinham histórias fascinantes para as quais ele reunia a família para ouvir. João Machado gostava de fazer esculturas em madeira e era criativo com a câmera fotográfica, transformando o filho mais velho e a esposa em modelos.
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Todos os dias, depois do jantar, a mesa era limpa para tornar-se local de trabalho. Não por acaso, Juarez e o irmão caçula seguiram o caminho da arte – Edson Machado, que nasceu quando o primogênito contava onze anos, se formou em jornalismo, mas sempre atuou na área cultural.
Com o amigo Fausto Rocha Jr.(à esquerda), que também sonhava em ser artista e, mais tarde, tornaria-se ator na TV Tupi e na Globo
Um sonhador
Se o talento do jovem Juarez enchia de orgulho os pais, João e Leonora, já que eles também tinham sua parcela de sonho e arte dentro deles, na escola e na Joinville que criava sua identidade industrial e conservadora a imaginação desmedida não era vista com bons olhos.
– Não é que eu era desatento, mas os professores pegavam o livro, copiavam no quadro e mandavam os garotos copiarem também. Eu não copiava, eu ficava desenhando. Mas os caras não me entendiam – recorda Juarez, que contabiliza castigos por causa do desinteresse em obedecer.
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O talento para as artes rendeu a ele o primeiro emprego. Aos 14 anos, tornou-se aprendiz na gráfica que produzia as embalagens e o almanaque para o Laboratório Catarinense, experiência que durou toda a adolescência, até chegar ao serviço militar, que cumpriu até os 19 anos.
Juarez (segundo em pé, da esquerda para a direita) com os jovens que trabalhavam para o setor de arte do Laboratório Catarinense
Agora, é engraçado para ele lembrar que, apesar da facilidade em conquistar as meninas – trunfo da competência com galanteios e das dicas da prima Lacy – nenhuma família o queria para genro.
– Não me deixavam nem chegar perto das filhas porque eu não era um “futuro brilhante” – conta.
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Entre os sonhos de garoto, estava a Escola de Belas Artes de Florença. Como a Itália era longe demais, a primeira parada foi Curitiba. João Machado, que prometia dedicar a vida às artes quando se aposentasse, apoiou a decisão do filho, mas Leonora temeu pelo futuro.
– Ela me dizia: “Você tem que aprender datilografia, filho. Vai poder trabalhar no Banco do Brasil, é um emprego seguro! Mas eu dizia: “Mãe, me desculpa, esse não é o meu sonho”.