Certa vez, em um texto publicado em 1969 na revista Manchete, o desenhista e escritor Millôr Fernandes fez um perfil de Juarez Machado afirmando que ele, “como todos nós, começou por baixo, nascendo no Brasil, mas quando for rico a primeira coisa que vai ser é estrangeiro”. Por um lado, era um prenúncio do futuro do artista joinvilense; por outro, não tinha nada de adivinhação, já que a França sempre esteve nos sonhos de Juarez. Millôr, como bom amigo, devia saber disso.
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A internacionalização da obra de Juarez começou com as primeiras viagens do artista, que ainda não era levado por suas telas, mas pelo desejo de conhecer o mundo.
– Eu economizava em tudo o que podia. Então, a cada compra que eu havia conseguido poupar dinheiro, eu imediatamente ia trocar por dólares. A viagem era mais importante do que qualquer coisa – conta ele, que na primeira vez em que saiu do País foi porque o cantor Juca Chaves ganhou duas passagens de avião de presente e convidou o amigo a acompanhá-lo.
Quando chegou a hora de as telas viajarem o mundo, ainda não era a vez de o artista ir junto. Eram os curadores que vinham ao Brasil e buscavam trabalhos para exposições internacionais. As primeiras mostras individuais fora do Brasil foram na Galeria Zoma, em Nova York, em 1982; e no Centro Cultural des Prémontrés, na França, em 83.
A grande mudança
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O sonho de chegar à França veio de uma “loucura planejada”. Morando no Rio de Janeiro com a segunda esposa, Eliane de Carvalho, e o filho caçula, João, o artista via-se em meio a decisões do dia a dia que referiam-se à contratação de mais empregados e, consequentemente, ampliação da casa da família. Era a hora, então, de tomar a decisão.

(Fachada do atual apartamento do joinvilense em Paris)
– Falei para a minha mulher: “Podemos ter mais empregados e construir mais cômodos ou abrir mão de tudo isso e usar este dinheiro para viver na França durante um ano. Você pode estudar, o menino irá melhorar nos idiomas e eu farei meus quadros. Pense a respeito, não precisa me responder agora” – lembra Juarez, aos risos, já que a resposta parecia bem óbvia.
Mais uma vez, ele tinha que abrir portas em um território desconhecido. As primeiras exposições em Paris foram na galeria da Embaixada do Brasil na França.
– Mais de uma vez, eu tive que “me ajoelhar” para os gestores para que não fechassem este espaço de arte. O mercado de arte em Paris é muito difícil e os brasileiros não têm muitas opções de lugares para expor seu trabalho.
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Ao fim do primeiro ano, em 1987, ninguém voltou ao Brasil. Para Juarez, as ruas do mundo tornaram-se seu lar. Mais tarde, divorciado e com os filhos crescidos, ele montou ateliês em outras cidades da Europa, mas a paixão pela França sempre o fez retornar ao país.

(Cena do filme O Fabuloso Destino de Amélie Poulain)
Inspiração internacional
Atualmente, Juarez vive em Montmartre, bairro boêmio de Paris conhecido por ser há mais de um século o ponto de encontro de artistas e intelectuais como Degas, Cézanne, Monet, Van Gogh e Renoir – alguns deles realmente moraram na região. Entre os vizinhos ilustres, está o cineasta Jean-Pierre Jeunet, famoso pelo filme O Fabuloso Destino de Amélie Poulain. De certa forma, Amélie Poulain pulou das telas do artista joinvilense para o cinema: as cores da paleta de Juarez Machado foram a inspiração para a direção de arte do filme francês. A obra tem predominância das cores vermelha e verde, com uma espécie de filtro alaranjado.
Jean Pierre e Juarez conheceram-se em uma festa em Paris e o francês ficou encantado com as telas de Juarez. Além de inspirar-se nas cores do mundo de Amélie, colocou-os nas paredes do quarto da protagonista. Mais tarde, no filme Eterno Amor, ele voltaria a se inspirar no vizinho artista para a direção de arte, com as cores saturadas dando o tom do drama.