O uruguaio Jorge Drexler pode viver em Madrid, mas se sente em casa no Brasil: fala português sem dificuldade, já fez parcerias com artistas brasileiros como Paulinho Moska, Maria Rita e Simone, e conta que “já surfou muito na Joaquina”. Em maio, o músico passa por Florianópolis para se apresentar no Teatro do CIC – e “aproveitar um pouco” a cidade -, como parte de uma turnê de sete shows pelo Brasil. “Eu não gosto de passar muito tempo na estrada, mas o Brasil é importante para mim, então abri uma exceção”, confessou. Direto de sua casa na capital da Espanha, Drexler conversou por telefone com a Itapema, sobre a turnê, sua relação com a música brasileira, e sua estreia como ator.
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Itapema – Primeiro eu gostaria de saber um pouco sobre o show Mundo Abisal, que você vem apresentar em Floripa. Por que esta música foi a escolhida para nomear a turnê?
Jorge Drexler – Este show é bem minimalista. O foco é nas músicas, porque o conceito dele é justamente o de se aprofundar nas canções. Hoje em dia nós temos o hábito de andar na superfície das coisas – eu digo que as pessoas estão sempre “surfando” nas coisas, sem conhecer nada profundamente. Por isso o nome, porque o show é um convite a se aprofundar no que conhecemos e vivemos. A música Mundo Abisal [do álbum Amar La Trama, de 2010] tem um trecho que diz: “Inmersión, inmersión/ cerremos las compuertas/ aventurémonos hacia las inciertas profundidades” [“imersão, imersão/ fechemos as comportas/ aventuremo-nos nas profundezas incertas”]. Essa é a ideia. Também é a ideia do aplicativo para smartphone que eu estou lançando.
Itapema – Como é este aplicativo?
Jorge Drexler – Ele se chama N, que o símbolo matemático usado para indicar os números naturais. O objetivo dele é estudar as possibilidades combinatórias das canções. No aplicativo o usuário tem três músicas, com 40 opções de versos gravados com a minha voz para usar em cada uma: ele escolhe os versos, monta a sequência, e tem uma música nova, criada em parceria por nós dois.
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Itapema – Não é a primeira vez que você se apresenta em Floripa. Você conhece a cidade, ou só veio para fazer shows?
Jorge Drexler – Conheço, sim. Eu sou fã de Floripa! Tive meu período de sempre visitar a cidade, nos verões dos anos 80… (risos) Vivia em Canasvieiras, Jurerê, Ingleses… Já surfei muito na Joaquina, também. Nos meus shows por aí eu sempre pergunto se no público tem algum surfista que quer me convidar para ir surfar. (risos) Dessa vez eu vou ter três dias livres em Floripa depois do show, então vai dar para aproveitar um pouco.
Itapema – Você também tem uma relação bem próxima com a música brasileira, e uma parceria forte com os músicos daqui, como o Paulinho Moska, por exemplo. Você pode nos falar um pouco sobre isso?
Jorge Drexler – Eu sempre tive uma admiração muito grande pela música brasileira. Acho que todo uruguaio tem um pouco disso. A relação dos dois países é próxima, nossas fronteiras não têm obstáculos. Eu falo português, por exemplo, sem nunca ter feito aulas. Na verdade eu nem sei como sei falar português. (risos) Então a música eu sempre conheci, mas no começo eu admirava de longe – desde Pixinguinha até a música eletrônica brasileira atual, passando por Tom Jobim, João Gilberto, Caetano Veloso… Quando eu conheci o Paulinho, no Rio de Janeiro, ele me convidou para gravar duas músicas com ele, e a partir dele eu fui conhecendo outros artistas, e um pouco mais dos músicos brasileiros da geração atual. Maria Rita, Celso Fonseca, Arnaldo Antunes, Vitor Ramil, Lenine, Simone… Esse intercâmbio é sempre muito positivo.
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Itapema – Apesar de sempre ter trabalhado com cinema [Drexler já fez trilhas sonoras para diversos filmes, e ganhou o Oscar de Melhor Canção Original com Al Otro Lado Del Río, do filme Diários de Motocicleta], você nunca tinha atuado. Mas neste ano você gravou um filme onde interpreta o personagem principal [La Suerte em Tus Manos, de Daniel Burman, que estreia em junho]. Como isso aconteceu? Como foi a experiência?
Jorge Drexler – Esse filme foi uma loucura do diretor, na verdade. (risos) Ele entrou em contato comigo e disse que tinha criado um personagem, e que me via no papel desse personagem. Quando ele disse que queria que eu fizesse o filme, eu falei “Você está louco? Eu não tenho formação, não tenho experiência, não posso fazer isso!”. Nem sei como ele acabou me convencendo. Só sei que um dia, de repente, em estava lá, em Buenos Aires, na frente de uma câmera, atuando. (risos) Foram três meses de trabalho, e foi uma experiência maravilhosa.
Itapema – Como é o personagem? Você se identificou com ele?
Jorge Drexler – Ele é um homem divorciado que está tentando reconstruir sua vida sentimental, e acaba se reencontrando com uma antiga namorada. Ele é um mentiroso compulsivo, e um ótimo jogador de pôquer. A grande questão do personagem é aprender a lidar com a sua relação com a verdade e a mentira. Na verdade o comportamento dele é quase oposto ao meu. Ele tem dilemas e questionamentos que eu não tenho, e eu tenho dilemas e questionamentos que ele não tem… Mas isso é bom. É bom esquecer um pouco de si mesmo por alguns meses. E eu acho que entrei bem no personagem.
Itapema – Você pretende investir nessa carreira?
Jorge Drexler – Talvez eu repita a experiência, se o filme me parecer bom. Agora estou esperando algum convite de um diretor brasileiro. (risos)
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