Integrantes do Roteiro Nacional da Imigração em Santa Catarina, 57 imóveis históricos foram tombados como patrimônios culturais do Estado pela Fundação Catarinense de Cultura (FCC). O ato de homologação foi assinado pelo governador Raimundo Colombo e publicado no “Diário Oficial do Estado” na semana passada.

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Os casarios localizados em sete municípios do Vale do Itajaí e do Norte já eram reconhecidos nacionalmente pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) há uma década. No entanto, agora o Estado possui 351 edificações protegidas pela lei estadual 5.846/1980, que dispõe sobre a manutenção da integridade de bens materiais com interesse histórico, artístico e cultural.

Distribuídas em Joinville (17), Indaial (10), São Bento do Sul (oito), Jaraguá do Sul (seis), Timbó (seis), Blumenau (cinco) e Pomerode (cinco), as 57 casas recém-tombadas já integravam o inventário do Estado desde 2007. São construções majoritariamente de origem germânica que se destacam pela pureza na técnica de construção (só com pedras ou só com tijolos), técnica de construção (enxaimel) ou pela simples presença de algum mural pintado à mão.

Um exemplo é a centenária Casa Siewert, em Pomerode, que também integra a Rota do Enxaimel e atende grupos de visitantes. Eles são atraídos não só pelas instalações de 1913, mas pelos equipamentos antigos que um dia deram base à produção de milho e gado de leite, além do estilo de vida próprio dos imigrantes alemães.

O fomento ao turismo também é a proposta do governo estadual com o tombamento das propriedades que integram o roteiro. Após a inscrição das edificações no Livro do Tombo, a notificação oficial dos proprietários, das prefeituras envolvidas, do Ministério Público estadual, do Iphan e dos cartórios, que farão a averbação dos tombamentos nas escrituras originais, a ideia é sinalizar as propriedades com uma placa – para que a rota possa ser percorrida – e entregar um certificado aos donos.

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– A simples identificação já coloca o proprietário em uma situação de valorização. Às vezes se pensa que o tombamento é uma perda de direitos, mas a maioria deles estava nos cobrando por que ainda não tinha acontecido. Afinal, é a história deles e de suas famílias que será preservada – explica a diretora de preservação do patrimônio cultural da FCC, Vanessa Maria Pereira, que acrescenta que o processo foi finalizado em um ano desde que assumiu a gestão do órgão estadual.

As casas que foram recentemente protegidas pela lei estadual estão em bom estado de conservação. Abrigam, inclusive, os próprios imigrantes ou seus descendentes, que ainda preferem viver em áreas rurais. A exceção à regra é uma localizada em Pomerode, onde foi constatada uma avaria. De acordo com a fundação, uma parte da edificação acabou desmoronando, mas a reforma que se faz necessária é simples e dará conta de preservá-la originalmente. Há possibilidade de financiamento da obra com recursos do poder público nesses casos.

Preservação da história

A superintendente do Iphan em SC, Liliane Janine Nizzola, avalia que o tombamento estadual vem para complementar o nacional, já que um não necessariamente pressupõe o outro. Ainda que tardio, o reconhecimento da Fundação Cultura Catarinense reforça a preservação da história do Estado.

– É a nossa colonização. Todo o patrimônio que o imigrante construiu na forma de viver, construir, alimentar, plantar e vestir influencia no que somos hoje. Por isso, para que as pessoas conheçam as próprias raízes, ele deve ser preservado. Por mais que haja referência na Alemanha, o que tem aqui é um pouco modificado, porque foi a nossa forma de se apropriar daquela arquitetura, herança e história – analisa.

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De acordo com as legislações estadual e nacional, os imóveis tombados devem “guardar referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos de formadores da sociedade brasileira”, nos quais se incluem “obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais” e também “os conjuntos urbanos e sítios de valores histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico”.

Em Santa Catarina, no caso de construções tombadas que estejam localizadas em áreas urbanas, há a possibilidade de descontos no Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) graças a acordos firmados com municípios, entre eles Florianópolis, Jaraguá do Sul e Pomerode. O mesmo não acontece em imóveis fundados em áreas rurais, onde o Imposto Territorial Rural (ITR) permanece o mesmo por falta de convênio entre Iphan e governo estadual.

Uma vez tombado, a estrutura não pode passar por reformas sem o aval da prefeitura da cidade em que está instalado.

O poder público municipal fica responsável por acionar Estado e Iphan e prestar assessoria técnica. Essa é uma exigência para que a pureza das construções seja mantida.

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Joinville lidera lista de tombamentos no Estado

A casa amarela sob o número 1.491 da Estrada Quiriri, em Joinville, já era ponto turístico e parada obrigatória para fotos antes mesmo de ser anunciada como um dos 17 bens tombados como patrimônios culturais do Estado. Quem garante é Iris Neitzel, que reside na propriedade há 47 anos e se orgulha de manter as características originais do imóvel, mesmo após as reformas que se tornaram necessárias com o tempo.

A possibilidade de a área ser tombada já rondava as conversas da família e chegou a ser vista com receio pelo marido Livino, já falecido, e os três filhos do casal. Hoje, segundo ela, o pensamento é outro: orgulho e honra por manter viva a história de seus antepassados.

Junto da estrutura antiga do casarão, construído pelo avô de Livino, ela mantém na memória e em objetos as histórias guardadas desde 1970, quando casou e se mudou para o local. Herança sentimental que deve perdurar ainda por muito tempo; se depender da vontade dos três filhos de Iris.

– Quando chegamos aqui, o redor era composto de plantação de inhame e bananas. Fomos nós que preservamos e criamos o jardim, pintamos o espaço. Demos vida a esse lugar, mas sempre mantendo a estrutura original. Em mais de 40 anos que moro aqui, nunca desejei mudar nada da casa, nem meus filhos – relata.

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Perto dali, na Estrada do Rio da Prata, outras seis propriedades rurais também tiveram o tombamento confirmado e mantêm edificações erguidas há mais de meio século. Três delas na mesma localidade são mantidas pela família Pabst, entre elas, a residência de Dolores Pabst, onde ela vive há mais de 30 anos.

De acordo com a moradora, o imóvel preserva as características das construções germânicas. A casa é feita de tijolos maciços e trabalhada em madeira, além de manter portas, janelas, telhado e forro originais. Ela destaca que para conservar vivas as memórias daquela época, os bens exigem restauro, mas por falta de condições financeiras a reforma só deve acontecer com o apoio do Estado. No entanto, ainda não há perspectivas de quando essa contrapartida possa ocorrer.