Mais do que causar surpresa, a jogada política protagonizada por Marina Silva no sábado embaralhou a disputa eleitoral de 2014. É cedo para prever os desdobramentos do lance que levou a ex-senadora a se filiar ao PSB e a declarar apoio à candidatura do governador de Pernambuco, Eduardo Campos, à Presidência. A única certeza é de que a bola voltou ao centro do campo, obrigando os partidos a redefinirem suas estratégias.
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A reviravolta começou a se desenhar quando Marina viu naufragar o sonho de fundar a própria sigla. O registro da Rede Sustentabilidade foi rejeitado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) na quinta-feira passada, por problemas na validação das assinaturas de apoiadores. Com 20 milhões de votos na bagagem, a ex-ministra do governo Lula teve 48 horas para repensar o futuro. Chegou a marcar uma entrevista coletiva apenas para dizer que não havia decidido nada. Por fim, fez o que analista nenhum havia sido capaz de prever.
Depois de receber convites de várias legendas dispostas a lhe dar protagonismo no pleito de 2014, acabou optando pelo PSB, que já tinha Campos definido como cabeça de chapa. A repercussão foi imediata. Líder do PPS – partido preterido por Marina -, Roberto Freire classificou a decisão como “suicídio político”. Candidato à Presidência pelo PSDB, o senador Aécio Neves não fez críticas. Limitou-se a saudar a adversária, embora saiba que terá mais dificuldades pela frente.
No meio acadêmico, a mudança de rota também surpreendeu. Os especialistas são unânimes ao afirmar que Marina conseguiu mexer com uma disputa que vinha, mais uma vez, polarizada entre PT e PSDB. Apesar disso, poucos se arriscam a projetar os efeitos dessa jogada.
– A verdade é que essa dobradinha está despertando mais perguntas do que respostas – resume Felipe Borba, do Departamento de Ciência Política da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UniRio).
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Para o professor, pelo menos duas incógnitas persistem. Primeira delas: com a sua alta popularidade, a ex-senadora de fato seguirá aceitando o papel secundário? Ou haverá ruídos na relação? Segunda dúvida: como vice do pernambucano, seus votos serão de fato transferidos para ele?
A primeira resposta depende dela – que tem fama de centralizadora -, mas a segunda, não. A questão é saber como seus apoiadores e eleitores reagirão. Afinal, Marina vinha defendendo a criação da Rede para renovar a política. Agora está no PSB, uma sigla histórica, em plena ascensão – e também em processo de inchaço, abrigando nomes das mais distintas vertentes, até mesmo representantes da direita como o ex-senador Heráclito Fortes (ex-DEM) e o deputado catarinense Paulo Bornhausen (ex-PSD), filho do político conservador Jorge Bornhausen.
– É cedo para dizer, mas ninguém tem voto cativo. Ainda tem muita água para rolar – pondera Gustavo Grohmann, da UFRGS.
Não por menos, a ex-senadora apressou-se em definir a aproximação como “programática” e não “pragmática”. Para o cientista político Guilherme Simões Reis, a estratégia pode funcionar:
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– Marina perde um pouco a aura da inovação, mas quem pretendia votar nela provavelmente não vai votar no PT nem no PSDB.
EFEITO MARINA
Prós e contras da nova chapa para os adversários
Para Dilma
A favor
O número de adversários competitivos diminui: antes eram três chapas de oposição (Aécio, Campos e Marina). Agora são duas.
Contra
Terá mais trabalho para evitar um segundo turno, já que, juntos, Campos e Marina tendem a somar mais votos do que se estivessem em chapas distintas.
Para Aécio
A favor
Como ele próprio mencionou na nota em que parabenizou Marina pela decisão, a união dá mais consistência à oposição ao PT.
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Contra
Enfrentará maiores dificuldades para levar o PSDB ao segundo turno, já que terá de disputar com uma chapa de oposição forte.
O PERFIL DOS POSSÍVES CANDIDATOS
Aécio Neves (PSDB)
Idade: 53 anos
Base eleitoral: Minas Gerais
Credenciais políticas: neto do ex-presidente Tancredo Neves, formou-se em Economia, foi deputado federal por quadro mandatos, governador reeleito de Minas e, atualmente, é senador
Coligação: DEM e PPS devem ser os principais aliados, mas Aécio ainda pode contar com o apoio de partidos como o PTB e o recém-criado Solidariedade
Vice: vai depender de quais siglas irão compor a aliança
Discurso de campanha: será de oposição aos governos do PT e de defesa da gestão do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Vai focar muito na política econômica
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Dilma Rousseff (PT)
Idade: 65 anos
Base eleitoral: Rio Grande do Sul
Credenciais políticas: formada em Economia, foi secretária da Fazenda de Porto Alegre, secretária de Energia e Minas do RS e ministra de Minas e Energia e da Casa Civil durante o governo Lula. Buscará em 2014 o segundo mandato de presidente
Coligação: tentará manter a atual base de apoio, principalmente PMDB, PDT, PP, PC do B, PR e PSD
Vice: por ser o maior aliado, o PMDB deve continuar com a vaga de vice, permanecendo Michel Temer no posto
Discurso de campanha: de defesa das realizações de seu governo e do de Luiz Inácio Lula da Silva, com destaque para programas como o Bolsa Família e o Mais Médicos
Eduardo Campos (PSB)
Idade: 48 anos
Base eleitoral: Pernambuco
Credenciais políticas: neto do ex-governador Miguel Arraes, formou-se em Economia, foi deputado federal por três mandatos, ministro de Ciência e Tecnologia do governo Lula e, atualmente, governador reeleito
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Coligação: terá o desafio de formar aliança de peso para garantir maior tempo de propaganda na TV. As principais siglas estão hoje com Dilma ou Aécio. O cenário poderá mudar dependendo do desempenho nas pesquisas
Vice: Marina Silva
Discurso de campanha: o fato de o PSB ter participado dos governos Lula e Dilma impede Campos de fazer oposição ferrenha. Seu discurso será de alternativa aos modelos implantados por PT e PSDB.
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