Joel Santana fala com Agência RBS por telefone, do Rio de Janeiro, e discursa sobre o Peneirinha Head and Shoulders com orgulho. Em um bate-papo conduzido por memórias – e algumas risadas -, o garoto-propaganda do projeto que dará um ano em uma escolinha de futebol para quatro meninos – dois de Santa Catarina e dois do Rio Grande do Sul – lembrou do começo da carreira nos times de várzea do Rio.
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Aos 65 anos, 41 deles ligados ao futebol, Joel destacou ainda a importância do esporte como projeto social no Brasil. Segundo ele, os gramados trazem aos garotos a oportunidade que lhes falta na vida.
Agência RBS – Qual a importância do projeto Peneirinha Head and Shoulders?
Joel Santana – Nesse projeto você tem a oportunidade de pegar a criança bem nova para prepará-la para as competições futuras. Consegue separar aqueles que têm condições de seguir a carreira no futebol e no futuro, quem sabe, serem profissionais. Não é fácil, é um projeto que tem várias crianças e disputas. Em uma peneira, às vezes nem se tem tempo para selecionar o garoto que tem a técnica e a habilidade.
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Agência RBS – Você acha que é possível bater o olho em uma criança e notar que ela será um grande craque?
Joel Santana – Tem de ter um olho clínico muito bom, principalmente nesta idade. É quando o garoto começa a desenvolver, está na semente, ainda nem se formou. Você vê jogadores de qualidade já nesta idade, sim. Quando o jogador tem qualidade, ele desponta antes dos demais.
Agência RBS – Como foi a sua peneira?
Joel Santana – Eu participei de uma peneira quando comecei a jogar futebol, no Olaria. Naquele tempo não tínhamos nem chuteira. Jogávamos descalços. Nesta peneira saíram jogadores de grandes equipes: o Miguel, o Alfinete (zagueiro e o lateral-esquerdo que depois foram campeões brasileiros no Vasco). Começamos juntos no juvenil do Olaria (Joel atuava como zagueiro).
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Agência RBS – E o que você lembra deste teste?
Joel Santana – Era lá pelos anos 1960. Foram feitas várias equipes e os selecionadores iam passando os garotos adiante. Até que formamos uns dois ou três times. Foi muito difícil. Eu morava em um lugar aqui no Rio, atrás do campo do Olaria, onde havia muitas equipes de futebol. Eu jogava numa equipe chamada “Os Garotos da Bariri”, um time de várzea. Não tínhamos nem chuteira, era jogo descalço.
Agência RBS – Mas no Olaria teve de colocar chuteira.
Joel Santana – Nossa! Foi difícil. Era uma chuteira dura, o couro era colocado com preguinho e ele vinha entrando para dentro da chuteira. De tanto usar, machucava, chegava a sangrar o pé.
Agência RBS – Qual tua opinião a respeito dos jogadores que, logo cedo, vão para a Europa?
Joel Santana – Estão tirando os jogadores brasileiros da raiz. O atleta ainda nem se formou como jogador, como homem, e já está saindo do país. Não é fácil jogar com costumes e modo de viver diferentes do seu. Muitos chegam lá e não dão certo pela saudade, não se adaptam ao clima, comida, povo diferente. É preciso muita força de vontade para seguir.
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Agência RBS – Você costuma explicar isso para os pais?
Joel Santana – Com certeza. Trabalhei com categorias de base durante cinco anos, no Brasil e nos Emirados Árabes. Nesta fase dos nove aos 13 anos, não se pode ser apenas um treinador, tem de ser um educador. Tem de ter um método educacional para o garoto entender como é a vida, o que ele irá enfrentar. Tem de explicar para ele como as coisas vão se desenvolver.
Agência RBS – O futebol é o grande projeto social que o Brasil deveria explorar?
Joel Santana – Com certeza. Quando você é pequeno, mal sabe caminhar, tropeça nas pernas e já ganha uma bola. Você olha para ela e depois vai pensar no que fazer, como brincar com ela. Não interessa o que você gosta, você é apresentado para a bola logo cedo. Você é ainda pequeno, mas já estão querendo que você chute uma bola. Todo garoto no Brasil pensa em ser um jogador de futebol. Não adianta tentar ajudá-lo com 16, 17 anos. Tem de fazer isso desde cedo, com nove, 10 anos. Não adianta só fazer o grande jogador. Tem de fazer, também, um grande homem.