Naquele pressago verão, a praça da Bastilha estava praticamente deserta. Uns poucos vestígios de decoração em vermelho, azul e branco lembravam a preparação para as comemorações do 14 de julho, que ocorreria semanas depois. As hordas de estudantes ainda não haviam chegado para sua temporada anual na capital francesa. Àquela hora, os cafés jaziam transfigurados em quietude, os costumeiros clientes imersos em seus jornais, com uma xícara sobre a mesa e completa apatia para com a paisagem, o trânsito não era intenso e quase não havia turistas. Essas raras condições davam ao obelisco, ainda maior monumentalidade, elevando-se único em meio àquele vazio densamente povoado de elucubrações. Desde 1976, quando li pela primeira vez sobre “a queda”, no meu livro de história, no Colégio Nossa Senhora de Fátima, em Mamborê, aquelas pedras habitam meu imaginário.

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Quase todos os lugares do mundo, especialmente aqueles muito amados, ficam melhores no papel da imaginação do que em realidade. Ao desembocar na praça, depois de ter percorrido avenidas de expectativas, era para ter sido um acontecimento, com toques da “Marselhesa” e vestígios da tomada de 1789. Sem qualquer pompa, quase com enfado, ali estava o palco da revolução que se fizera em nome das “luzes”. Foi então que ouvi o primeiro inconfundível toque de “Billie Jean”; depois, “Black or White” e a mesma voz misturando-se em canções de ritmos diferentes, de épocas distintas, vindas de diversas direções. Os sons saíam das lojas, dos restaurantes, dos carros e das sacadas mais distantes. Pessoas de gerações desiguais começaram a afluir para a grande praça, muitos jovens com rádios portáteis aumentando a miscelânea sonora. Ao longe, onde houvesse um monitor, estava estampada a imagem do pop star americano. A primeira impressão era de que se tratava de divulgação para o megashow “This Is it”, em Paris.

Foi preciso apurar o ouvido para o que diziam os telejornais e ver os semblantes tristes que se avolumavam naquele solo histórico para perceber que se tratava do fim de um reinado. E então, foi como deveria ser, uma incontrolável demonstração de amor e uma tristeza quase alegria, que dançava à batida inconfundível do ídolo morto.

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