Em pouco mais de três anos, João Doria (PSDB) passou de nome conhecido pela atuação empresarial e por programas de entrevistas sobre economia e negócios na televisão a uma das principais lideranças políticas do país. Venceu a disputa para a prefeitura de São Paulo no primeiro turno em 2016, após 30 anos sem ocupar cargo público.

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Dois anos mais tarde, por margem mais apertada, bateu o adversário Márcio França (PSB) e tornou-se governador do Estado que responde pela maior economia do país. Embora evite qualquer conjectura a respeito, a ascensão de Doria o coloca em evidência para seguir caminho que também trilharam outros governadores tucanos de São Paulo, como José Serra e Geraldo Alckmin: o de concorrer à presidência da República.

Em entrevista por telefone ao Diário Catarinense, o governador paulista fala sobre as ações nos primeiros sete meses de governo em São Paulo, avanços como a redução de 7% no número de homicídios e de 7,5% no número de roubos em geral, medidas da gestão, declarações recentes sobre o presidente Jair Bolsonaro e a postura de posicionamento que pretende adotar sobre determinados temas do governo federal.

Na campanha, o senhor elencou segurança pública e enxugamento da máquina como os dois pontos que pretenderia priorizar no governo. Nesses pouco mais de sete meses, nessas áreas específicas, o que já foi possível fazer, qual o balanço nessas áreas?

Resultados muito bons, expressivos. Os índices de segurança em São Paulo, de roubo, assalto, homicídio, furto, em todos os índices de criminalidade houve queda [números enviados pelo governo mostram queda de 7% de homicídios, 7,5% de roubos em geral e de 36% em latrocínios]. Fruto de gestão eficiente da atividade de segurança pública. Os índices se referem aos seis primeiros meses deste ano. Ainda não poderiam ser resultado de novos investimentos que estão sendo feitos agora, mas sim de boa gestão. Gestão integrada e planejamento na área de segurança.

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E no enxugamento da máquina? O senhor tem um plano de concessões bastante amplo, que defende bastante. Já possível executar algo disso?

Tivermos também um resultado muito bom nesse período com a redução de despesas operacionais, despesas de custeio e com os programas de desestatização que estão concentrados basicamente em infraestrutura. Temos a concessão de rodovias, ferrovias, metrô, aeroportos regionais. Há ainda a hidrovia Tietê-Paraná, o Porto de São Sebastião e os programas de saneamento, incluindo a despoluição dos rios Tietê e Pinheiros (o projeto do novo Rio Pinheiros foi lançado em entrevista coletiva nesta sexta-feira pelo governador).

É um tipo de política de desenvolvimento que o país tem precisado? E levantando essa discussão já no governo federal, não faltou iniciativas desse tipo nesse início de ano?

Olha, prefiro não fazer avaliações sobre o governo federal, mas avaliar que, ao nosso ver, aqui nós fizemos a coisa certa. Um governo liberal, pró-mercado e confiável junto a investidores, com marcos jurídicos claros, um amplo programa de desburocratização e ações que agilizam a entrada de investimentos.

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O senhor também se empenhou na questão da reforma da Previdência estendida a estados e municípios. Até o momento não tivemos sinais claros dessa inclusão. Considera uma derrota, pelo fato de ter se empenhado pessoalmente nessa tentativa que ainda não ocorreu?

Não, até porque primeiro eu tenho que defender o que é bom para o Brasil, e não aquilo que é conveniente para alguns. O meu sentimento é sempre plural, eu defendo o que é bom para o país. São Paulo já fez a sua reforma da Previdência. A nossa defesa aqui não tem nenhum interesse regional. São Paulo tem as contas em ordem, não temos déficit público no plano fiscal, mas defendo isso pelo bem do Brasil. E ademais, tudo indica que o Senado Federal vai procurar a reinclusão de estados e municípios na reforma da Previdência. Acredito nessa reinclusão. O encaminhamento será feito à Câmara, a meu ver, com estados e municípios.

No último mês o senhor tem dado declarações fortes sobre o presidente Bolsonaro. Repreendeu a declaração dele sobre o pai do presidente da OAB, disse que nunca foi alinhado com Bolsonaro, o que lhe rendeu críticas de apoiadores do presidente, que citaram alguma possibilidade de oportunismo. Qual sua relação, afinal, com o presidente Bolsonaro, e como está essa relação hoje?

É uma relação respeitosa, mas não é uma relação de obediência e nem de alinhamento político. Nós não fazemos oposição ao governo Bolsonaro, mas temos as nossas posições que, nas causas que forem do interesse do Brasil e foram boas, o presidente Bolsonaro terá o nosso apoio e o voto do PSDB. Porém, nas manifestações que possam representar circunstanciais equívocos ou danos ao povo brasileiro, nós nos manifestaremos contrariamente.

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E essa declaração específica de que o senhor nunca foi alinhado com o Bolsonaro? E o movimento "Bolsodoria" do segundo turno do ano passado?

Aquele movimento não foi criado por nós, aquilo não era alinhamento, foi um movimento eleitoral que surgiu naturalmente. Não fui provocador deste movimento. E a eleição foi um outro momento, não é governo.

Qual avaliação do Bolsonaro até aqui?

Prefiro não fazer nenhuma avaliação.

Os resultados do governo federal têm relação com esse distanciamento maior na visão sobre alguns temas que o senhor tem manifestado agora, em comparação com o presidente?

Não há distanciamento maior, há posicionamento em certos temas. Não vou assumir a defesa de alguém que diz que o Brasil não teve ditadura militar. O Brasil teve ditadura militar. Você não apaga a história com uma frase, nem com o desejo. Eu sou filho de um deputado federal cassado pelo golpe militar de 1964 e exilado durante 10 anos. Portanto, a ditadura militar existiu no Brasil. Agora, eu não vou transformar isso, não vou criar um tribunal aqui para fazer julgamentos 40, 50 anos depois sobre militares. Política não se faz com ódio, política se faz com diálogo. Se faz também com a verdade.

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Teremos João Doria como candidato a presidente em 2022?

2022 é remoto. Nós temos que tratar de fazer gestão em 2019, 2020, 2021 e 2022. Tem quatro anos de foco em gestão, e essa é minha prioridade.

Uma eventual decisão sobre essa candidatura, só quando o processo eleitoral se desenhar mesmo em 2022?

Não está nem no horizonte. Meu horizonte hoje é plenamente dedicado a São Paulo e à administração do governo de São Paulo.

O senhor esteve na semana passada na China para lançar um escritório para atrair investimentos ao Estado. Como esses investimentos podem ajudar no desenvolvimento do Estado? E é possível traçar um paralelo em relação à política externa do Brasil, como vê a imagem do país hoje no exterior?

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Em duas etapas. A nossa viagem de uma semana produziu como resultado compromissos de investimentos da China em São Paulo de US$ 24,8 bilhões, dos quais US$ 20 bilhões em infraestrutura – esses programas de desestatização que comentei, rodovias, ferrovias, hidrovias e saneamento. E US$ 4,8 bilhões em setores produtivos privados. Agronegócio, indústria, tecnologia, educação e medicina. Além do escritório que já está funcionando desde o último dia 12, que vai dar continuidade e apoiar empresas brasileiras de São Paulo que querem ampliar os mercados de consumo na China e dar apoio a empresas chinesas que queiram ampliar seus investimentos em São Paulo.

E sobre as relações internacionais travadas pelo governo federal?

De novo, prefiro não fazer análise sobre posições do governo federal na política externa. No âmbito do Estado de São Paulo, nossa política é muito clara de fortalecer as relações comerciais com o nosso principal parceiro, que é a China. Ampliar as relações comerciais com a comunidade europeia, o Médio Oriente, o Japão, a Coreia do Sul. Criar novas oportunidades junto ao mercado americano e preservar as relações com o Mercosul, notadamente com a Argentina. Seja qual for o resultado eleitoral na Argentina.

Governador João Doria em evento do governo
Governador João Doria em evento do governo (Foto: Governo do Estado de São Paulo, Divulgação)

Tanto a relação com a China, quanto com a Argentina, dependendo do resultado da eleição do mês que vem, o leva a uma relação com países com ideologia de esquerda, um campo político e ideológico ao qual o senhor faz muitas críticas. O senhor não vê nenhum problema em relação a isso? Não lhe causa desconforto?

Não se pode pensar em ideologia com uma economia do tamanho da China. Deve se pensar pragmaticamente na representatividade econômica que se transforma, no Brasil, em emprego, renda e geração de impostos. E, no caso da Argentina, é o terceiro maior parceiro comercial do Estado de São Paulo e também do Brasil.

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Preservar ou estimular relações comerciais não significa fazer alinhamento ideológico. E sim fazer alinhamento econômico.

Pretende participar ativamente do debate sobre a reforma tributária, como acompanhou a da Previdência?

Sim. Estamos fazendo através do secretário da Fazenda do Estado de São Paulo, Henrique Meirelles (ex-presidente do Banco Central e ministro da Fazenda). Ele tem coordenado o grupo de secretários de Fazenda estaduais neste debate, tendo o conhecimento que tem e a respeitabilidade que possui.

Tem alguma premissa que acredita que deveria ser considerada nessa reforma? Alguma linha central que não deveria ser abandonada?

Primeiro a facilitação. Simplificar o processo tributário. Dois, respeitar o direito dos Estados no plano federativos. E terceiro, desburocratizar fortemente o processo fiscal.

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Como o senhor tem avaliado o protagonismo que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), teve na votação da reforma da Previdência? E como é sua relação pessoal com ele?

Um bom papel. Teve um papel importante na aprovação da Previdência e também na condução dos debates para a reforma tributária. E é uma relação muito boa, uma amizade de mais de 25 anos que nos relacionamos, somos amigos. E (uma relação) de muito respeito pela sua habilidade no Congresso Nacional e na respeitabilidade que ele adquiriu como presidente da Câmara, agora já em novo mandato.

Nada que o processo eleitoral em uma disputa para a presidência em 2022 possa abalar?

Não, ao contrário (risos). Convergir.

O senhor liderou a criação do consórcio das regiões Sul e Sudeste (Cosud), que inclui Santa Catarina e a Região Sul. Como o senhor imagina que SC e a região possam contribuir com a agenda de desenvolvimento do país?

Os sete estados do Cosud representam 70% da economia brasileira e quase 75% de toda a população do país. Portanto, a representatividade dessa região é expressiva. Deve ser estressada pelo conjunto dos seus líderes, dos governadores dos sete estados. É um fato novo, não existia esse consórcio.

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Coloca o senhor também uma posição de ainda mais relevância nacional.

A intenção não é essa, e nem de assumir esse protagonismo, mas de ajudar os estados e os estados ajudarem o Brasil.

O que senhor espera ainda que está por vir nesse longo tempo de gestão e que espera ver no governo federal?

Aqui em São Paulo, elegemos duas prioridades máximas. Geração de emprego e segurança pública. Em seis meses, nós aqui geramos 221 mil novos empregos. Dos 336 mil novos empregos gerados no Brasil, 221 mil foram gerados aqui em São Paulo nesse período. Por políticas públicas que vêm produzindo resultados na defesa do investimento privado e da atração de novos investimentos.

Na área de segurança, os dados desse semestre já demonstram o acerto de uma política de planejamento, inteligência policial, que vem reduzindo a criminalidade de forma expressiva em São Paulo.

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Essa semana, reportagem do jornal O Globo mostrava que, apesar da queda de indicadores de violência em São Paulo, houve aumento no número de mortes por ação policial. A violência policial ainda é um problema no Estado?

Não. É um problema para os bandidos. Porque no enfrentamento, quem vai perder são os bandidos. A orientação do governo de São Paulo à Polícia Militar e à Polícia Civil é obedecer os protocolos, seguir o uso gradual da força, mas na circunstância final do enfrentamento, quem vai para o cemitério é o bandido.

Pretende continuar vindo a público e manifestar opinião contrária quando vir polêmicas com as quais não concordar, como ocorreu no último mês?

Não, eu não sou legislador. A competência para isso é do parlamento. São deputados e senadores que devem discutir no Congresso Nacional as posições certas ou erradas. A nossa prioridade é governar São Paulo. Proteger, ajudar e trabalhar pelos brasileiros que vivem em São Paulo.

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Apenas para ficar claro. A nossa posição é uma posição liberal, é um liberalismo democrático. Não sou nem de esquerda, nem de direita, mas defendo uma posição de centro no liberalismo democrático. Que é pró-economia privada e que propõe clara e objetivamente a redução do tamanho do Estado, a melhoria da sua eficiência e a ampliação da presença do setor privado da economia brasileira.

Há quem diga que esse é um posicionamento típico de direita.

Não, não. É um posicionamento de um centro liberal democrático, não é de direita. Nós respeitamos e manteremos sempre o diálogo com a direita e com a esquerda, mas ficaremos distantes dos extremos. Seja da direita ou da esquerda.

Acredita que a polarização ainda traz muito prejuízo ao Brasil?

Só traz prejuízo. Nenhuma vantagem, só o acirramento. O Brasil precisa de paz, diálogo e crescimento. O conflito não favorece o diálogo nem promove desenvolvimento.

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