As letras garrafais perderam o tom e não contrastam mais com o muro branco, embora a mensagem continue lá, imortalizada na entrada do bairro. “Por um Paraíso sem males” é a frase estampada no concreto que apresenta o Jardim Paraíso aos visitantes e desbravadores. Talvez a reivindicação tenha ganhado forma em uma época na qual o Jardim Paraíso, 15 mil habitantes, carregava o título de bairro mais violento de Joinville.
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No ano passado, por exemplo, a região liderou as estatística de mortes por homicídio. Os moradores assumiram o estigma como um peso e muitos ainda se esquivam da imprensa, demonstrando receio. Mas quem conhece o real significado da palavra “paraíso” sabe como tudo pode mudar, para melhor, num passe de mágica. E é nesse cenário que o bairro com a menor renda per capita de Joinville começa a se reinventar, com a ajuda de líderes comunitários, grupos sociais e igrejas.
São personagens que jamais aceitaram o rótulo que por muito tempo abalou a autoestima da população. O carioca Gutemberg das Flores, pastor da Igreja Batista, chegou no Paraíso há menos de um ano com a missão de continuar o projeto “Gerando Esperança”, que capacita e forma crianças em condições de vulnerabilidade social. A realidade não chegou a assombrá-lo, pois ele sabe onde está pisando.
– O nosso lema é formar meninos e meninas para não termos, no futuro, que reformar homens e mulheres. Ou damos atenção agora ou fica difícil exigir qualquer coisa depois.
Abraçadas pelo projeto, dezenas de meninas de 7 a 17 anos veem um futuro melhor. As mães também são só elogios. Maria Lindecir da Luz, 42 anos, tem cinco filhas e três delas integram o “Gerando Esperança”. Uma delas, Tainara, até descobriu a vocação de cantora.
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– Se as crianças não vêm para cá, elas brincam na rua. E na rua, se o pai e a mãe não estão perto, tudo pode acontecer.
A maioria dos projetos sociais do Jardim Paraíso possui vínculo com alguma igreja, das mais variadas crenças. A cozinha comunitária, por exemplo, é um sonho antigo do Padre Fachini, guiado a mãos de ferro pela voluntária Catarina Amaral. As 98 pessoas cadastradas recebem alimentação (e atenção) de um grupo já consagrado no bairro e na cidade.
– Logo que eu vim para cá, eu era atendida pelo projeto. Vinha com meus filhos comer aqui. Agora estou coordenando e lá se vão seis anos – comenta.
Gutemberg e Catarina, apesar das crenças diferentes, têm algo em comum. Os dois tentam transformar o Jardim Paraíso em um paraíso de fato. E nenhum deles se arrepende do desafio.
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– Sou movido a isso. Quanto maior o desafio, mais eu luto por ele. Tenho certeza de que vamos conseguir -sintetiza Gutemberg.
O FUTURO DE MARIA EDUARDA
“Tira uma foto minha?”. Foi assim que Maria Eduarda Chaves Marcílio, 6 anos, puxou conversa. Depois, revelou que estava de aniversário, o quinto comemorado no loteamento Canto do Rio, onde mora com a mãe, o pai e os três irmãos.
A menina é o símbolo de um dado peculiar do Paraíso: 47% da população é jovem, com faixa etária de 0 a 19 anos. Apesar do indicativo, faltam escolas. Em casa, ela passa as tardes brincando de subir em árvore e virar estrelinha.
No dia em que a conhecemos, esperava ansiosa pelo pai, que traria uma surpresa de aniversário. A mãe, Débora Chaves, não pensa em se mudar por enquanto, mas não descarta a ideia: “Ano que vem ela começa na escola”.
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