Ao se formar em Administração no Canadá, Jawad Nabulsi, 31 anos, voltou ao Egito e foi vítima das forças de Mubarak em 28 de janeiro de 2011, quando perdeu a visão no olho esquerdo durante ação policial. A partir de então, criou a Fundação Nebny com atuação nas favelas do Cairo e ganhou protagonismo político. Apoiou Mursi nas eleições, mas foi às ruas pedir sua deposição. Agora, lamenta a guinada do país, mas acredita que a violência também ocorreria se Mursi estivesse no poder. Veja trechos da entrevista concedida ontem.

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Zero Hora – Por que o povo elegeu e derrubou Mursi?

Jawad Nabulsi – Apoiei Mursi crendo que ele cumpriria promessas como a formação de um governo tecnocrático, um comitê constitucional representativo e a acusação formal dos cúmplices nos assassinatos de revolucionários. Mursi garantiu que renunciaria se 50 mil pessoas fossem às ruas. No entanto, ele não cumpriu as promessas e desafiou cada uma delas. A Irmandade Muçulmana usou as mesmas técnicas do Partido Nacional Democrático. Queria controlar tudo, e isso significava que o país jamais cresceria.

ZH – Você testemunhou violência?

Nabulsi – Pela TV porque não pertenço ao grupo que está protestando. Mas estou a cinco minutos do local. As ruas estão completamente vazias e escuto o tempo todo helicópteros.

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ZH – O governo interino perdeu a legitimidade dos que foram às ruas?

Nabulsi – Acho que as pessoas que pediram a renúncia de Mursi podem ser enquadradas em duas categorias. Pessoas como eu, que tomaram parte na revolução desde o primeiro dia e que lutaram contra o Supremo Conselho das Forças Armadas durante seu período no poder, quando a Irmandade Muçulmana não estava e lá e apoiava os militares. O outro grupo é aquele que chamamos de “partido do sofá”. Eles nunca se envolveram em nada antes de 30 de junho, confiam nos militares e não testemunharam o que as Forças Armadas fizeram no poder. Sabíamos, por outro lado, que não podíamos confiar no exército. Estávamos céticos e, mesmo que apoiássemos o movimento de 30 de junho, não celebramos.

ZH – Você se arrepende de ter apoiado a deposição de Mursi?

Nabulsi – A violência ocorreria de qualquer forma. Mursi já fazia o mesmo, ameaçando, prendendo. Ele teve a chance de mudar e não mudou.

ZH – A renúncia de ElBaradei expressa o arrependimento daqueles que apoiaram o novo governo?

Nabulsi – Nosso apoio era condicionado à não violência e essa condição foi violentada. Somos contra o uso da força contra manifestantes pacíficos, mesmo que não concordemos com eles. Essa posição, infelizmente, é minoria. Ambos os lados se tornam cada vez mais radicais e atacam nosso ponto de vista.

ZH – O que vocês estão fazendo para superar essa situação?

Nabulsi – Nosso objetivo é concentrar todos os esforços em preparação para as próximas eleições.

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ZH – Mas como fazer uma transição com esta radicalização?

Nabulsi – A situação é realmente imprevisível. Infelizmente, isto é uma guerra civil. É para isto que estamos nos encaminhando. Temos todos os ingredientes de uma guerra civil.