Rafael Eldad, 63 anos, era o segundo na embaixada de Israel na Argentina quando viu amigos e colegas morrerem no atentado à representação diplomática em Buenos Aires, em 1992, atribuído a terroristas ligados ao Irã. Duas décadas depois, embaixador de Israel no Brasil desde fevereiro, ele ainda convive com o medo devido aos constantes alertas emitidos pelo país para o qual emigrou de Marrocos aos 13 anos. Ontem, em visita a ZH, antes de embarcar para Jerusalém, para acompanhar visita do chanceler do Brasil, Antonio Patriota, Eldad falou sobre as tensões no Oriente Médio, a reeleição de Hugo Chávez e as perspectivas de cooperação com o Estado.

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Zero Hora – O chanceler Antonio Patriota quebrará o costume de se hospedar no lado ocidental de Jerusalém e dormirá na região leste (ocupada por Israel na Guerra dos Seis Dias, em 1967, é reivindicado pelos palestinos para sua capital. ). Isso causa desconforto?

Rafael Eldad – Risos. Ele ficará uma noite em Jerusalém Leste, uma noite em Jerusalém Oeste, uma noite em Tel-Aviv. Essas visitas são importantes para poder falar e ouvir sobre as diferenças que temos.

ZH – A presidente Dilma diz que o caminho para a paz é a criação do Estado palestino. Isso é viável?

Eldad – Israel é favorável à criação do Estado palestino. Todos estamos de acordo, mas Israel pensa que isso tem de ser consequência de um acordo de paz entre Israel e palestinos e não antes, como algo unilateral.

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ZH – O premier Binyamin Netanyahu antecipou as eleições no país. Isso irá fortalecê-lo para uma guerra contra o Irã?

Eldad – Isso é para analistas políticos em Israel. Ontem, o premier explicou duas razões para a antecipação. Uma é enfrentar a ameaça do Irã, que desenvolve armas nucleares. A outra é fazer frente à crise mundial. O governo precisa fazer medidas impopulares. Políticos não gostam de fazer medidas drásticas em tempo de campanha eleitoral. Vamos fazer primeiro as eleições e, depois, tomar medidas econômicas duras.

ZH – Netanyahu atacaria o Irã?

Eldad – O mais interessado para que este assunto termine de maneira diplomática é Israel. Mas também Israel é o mais ameaçado pelo Irã. A ameaça sobre Israel não é territorial, não é econômica, é existencial. Eu não gostaria de estar no lugar de Netanyahu. Não temos opções boas.

ZH – Quanto ao Irã, houve constrangimento com o Brasil no governo Lula. Mudou com Dilma?

Eldad – O Brasil está mais preocupado com a situação dos direitos humanos no Irã, com declarações antissemitas dos líderes iranianos, que ameaçam Israel. O Brasil não gosta.

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ZH – A entrada da Venezuela no Mercosul prejudica as relações com o bloco, sendo que a Venezuela não tem relações com Israel?

Eldad – Os venezuelanos elegeram outra vez Hugo Chávez, mas Israel não vê a Venezuela como uma democracia e Chávez como um democrata. Não temos relação com a Venezuela porque Chávez muitas vezes falou de maneira antissemita, a comunidade judaica na Venezuela tem problemas. Israel tem acordo com o Mercosul. Vai mantê-lo, sem relações com a Venezuela. E o processo de entrada da Venezuela pode levar cinco anos.

ZH – Em maio, o cônsul de Israel em São Paulo, Ilan Sztulman, alertou para ameaça às representações diplomáticas de Israel no Brasil. Essa ameaça diminuiu?

Eldad – Embaixadas de Israel estão tomando, por razões conhecidas, medidas de segurança. Eu, quando era embaixador na Argentina, me questionava por que tenho de estar com guarda-costas e ter minha casa sob vigilância, e o embaixador do Irã passeava tranquilo. O mesmo o do Líbano, que tem o Hezbollah. A resposta é clara: porque a ameaça é a Israel. O terrorismo está dirigido contra nós. Em minha memória, vem a bomba que terminou com a embaixada em Buenos Aires. Eu era o segundo na hierarquia. Lembro uma bomba que termina com a embaixada, com mortos, minha secretária morreu, morreram amigos, colegas.

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ZH – O senhor visitou o governador Tarso Genro, que programa viagem a Israel. Quais as perspectivas de cooperação com o Estado?

Eldad – Brasil e Israel atravessam um dos melhores momentos nas relações bilaterais. O intercâmbio comercial entre os dois países cresceu entre 15% e 20% neste ano. Com o Rio Grande do Sul, há possibilidades de incremento nas relações, por exemplo, na agricultura e na tecnologia. Hoje, 60% das exportações de Israel são produtos tecnológicos. A tecnologia é a locomotiva que puxa nossa economia. O governador Tarso Genro mencionou interesse em áreas como a dessalinização da água.