A investigação da formação de cartel para controlar o preço de combustíveis em postos Joinville do Gaeco revelou também uma série de fatos que sugerem concorrência desleal, uso da influência política e até pressão a agentes públicos. Num dos episódios descritos pela investigação, o ex-presidente da Fundema (hoje, Secretaria do Meio Ambiente), Aldo Borges, participa de uma reunião com o grupo acusado de cartel em um dos postos.
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Durante o seu depoimento, Borges relata ter sofrido pressão não apenas do grupo, mas também de três políticos da cidade – o vereador Fábio Dalonso e os deputados federais Marco Tebaldi e Mauro Mariani. Enquanto o grupo pedia para apertar a fiscalização e interditar dois postos, os políticos teriam pedido para afrouxar e desinterditar os estabelecimentos.
Sobre a participação na reunião, Borges disse ao Gaeco que foi até lá para “verificar se algum servidor do órgão estaria agindo de forma ilícita para liberação de licenciamento”. No encontro, Scherly questionou por que o posto Apa ainda estava aberto, pois estaria vendendo a preço de custo e que isso estava causando dificuldades.
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Borges disse ainda que Scherly o estava pressionando para tomar providências em relação ao posto Apa no sentido de que as atividades deveriam ser interrompidas. À polícia, afirmou que compareceu na reunião na condição de presidente da Fundema e não tem nenhuma relação de amizade ou inimizade com o grupo.
O grupo teria questionado Borges sobre os motivos de uma série de procedimentos legais da Fundema não terem sido tomados, e que os empresários chegaram a mostrar as notas fiscais de compra dos combustíveis e disseram que não sabiam qual era a mágica do posto para estar vendendo praticamente ao mesmo preço.
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Borges deixou claro que a Fundema não teria como fazer a intervenção na questão do preço do combustível. O cruzamento de informações do Gaeco levou o ex-presidente da Fundema a lembrar de outras tentativas de influência. Borges afirmou que o vereador Fabio Dalonso o procurou pedindo para que desse atenção ao Apa, com o objetivo de desinterditá-lo.
Mariani e Tebaldi também teriam entrado em contato com ele, por telefone, pedindo para que olhasse com bons olhos o posto Apa para que fosse desinterditado. Ao Gaeco, relatou que não se sentiu pressionado e que não se curvou aos pedidos de políticos, além de que nunca ter tido alguma vantagem por interditar ou não um posto.
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Contraponto
O trecho em que o ex-presidente da Fundema, Aldo Borges, diz ter sido procurado por políticos foi enviado por e-mail às assessorias de imprensa dos deputados Mauro Mariani e Marco Tebaldi, além do e-mail pessoal do vereador Fabio Dalonso, todos citados pelo ex-presidente da Fundema no depoimento ao Gaeco. “AN” questionou a cada um se confirmava o contato com Aldo Borges e em quais circunstâncias ocorreu a conversa.
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Fabio Dalonso
“Em momento algum realizei qualquer tipo de pressão ou pedido de interferência nos trabalhos daquela Fundação de Meio Ambiente, muito menos a concessão de qualquer tipo de benefício a quem quer que seja. Apenas, com base em um bom relacionamento, por ter sido procurado pelo proprietário do referido posto de gasolina, pedi, sim, uma atenção sobre o caso, como sempre faço toda vez que sou procurado por qualquer munícipe. Naquela oportunidade, solicitei ao então gestor daquela Fundação que, dentro da legalidade, orientasse o munícipe de como proceder para a solução do problema”.
Mauro Mariani
O deputado federal Mauro Mariani nega que tenha telefonado para o então presidente da Fundema, Aldo Borges, com o objetivo de solicitar a referida “desinterdição” do posto Apa.O parlamentar afirma que conhece Aldo Borges e que ligou para o mesmo em duas ou três ocasiões, mas por outras questões. Em nenhum momento fez solicitação para beneficiar oproprietário do posto interditado.
– Não sei nada disso. Nem sei onde fica esse posto. Não conheço seu proprietário. Liguei uma ou duas vezes pra falar com ele (Aldo), mas por outros motivos
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– informou Mariani, por telefone,de seu gabinete em Brasília.
Marco Tebaldi
A reportagem entrou em contato com a assessoria do deputado Marco Tebaldi ontem à tarde pedindo um posicionamento, mas ele estava em Brasília e, até o fechamento desta edição, não deu retorno.
O que dizem os donos do posto Apa
Em depoimento à Polícia, Richard Brian Dias disse que no segundo semestre de 2013 ficou surpreso com a constatação de contaminação do lençol freático com óleo diesel, pois não comercializava o produto. Antes da interdição, afirmou ter procurado a Fundema e tentado, de todas as formas, realizar um estudo de análise de risco de solo e, se preciso, um termo de ajustamento de conduta (TAC) com o órgão ambiental, mas não houve acordo e o posto foi interditado pela não renovação da licença.
Fernando César Garcia informou que nunca procurou políticos para proteger os interesses da empresa e que o processo de regularização na Fundema não andava no ritmo que deveria. Ele confirmou que chegou a ligar para o deputado Tebaldi para saber com quem precisava falar na Fatma para trocar dois tanques de um posto em Barra Velha, mas que tudo seria feito dentro da legalidade e que até a data do depoimento (março de 2014) não havia resolvido o problema.
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Encontro frustrado com o prefeito
Em todo o processo, há uma série de menções, ameaças e “carteiraços”, em que os investigados e denunciantes dizem ter apoio ou conseguir documentos e facilidades que outros não têm. Em um dos diálogos, dois donos de postos conversam sobre como a influência política pode desequilibrar a balança. Enquanto os donos dos postos que fizeram a denúncia buscavam a ajuda do ex-prefeito e hoje deputado federal Marco Tebaldi e de vereadores da base governista, o grupo de Sandro Paulo Tonial e Juvino Capello buscava apoio para anular a influência política.
– Agora a coisa ficou forte – disse Capello, ao se referir à tentativa de desinterditar os postos.
Sandro concordou, mas ressaltou que o prefeito (Udo Döhler) era “incorruptível”, mas que tentaria uma audiência com ele para dizer que o grupo quer “a coisa certa, que não tenha político nem a favor nem contra”. A audiência nunca ocorreu. Para a investigação, um interlocutor da Procuradoria do município teria ligado a Capello para dizer que eles deveriam fazer a denúncia à Agência Nacional do Petróleo em vez de procurar o prefeito.
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