Quando o golfinho dá aquela nadada mais rápida, é Scooby chamando os pescadores. Quando ele aparece e faz uma batida de corpo na água, então é o Caroba dando o aviso. Já aquele movimento mais brusco e certeiro de Tafarel é um alerta de que chegou a hora exata de entrar na água para arrumar a rede.

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Essa relação de cumplicidade entre golfinhos e pescadores é tão única no mundo que chamou a atenção de produtores da BBC, da Inglaterra. Na semana passada, uma equipe saiu de Londres com o objetivo de registrar em filme o fenômeno.

Durante quatro dias, a equipe de oito pessoas acompanhou de perto a pesca e, por duas vezes, presenciou a interação entre os golfinhos e os pescadores.

De acordo com a assessoria de imprensa da Udesc, trechos do material gravado vão estar em uma edição do programa Planet Earth (Planeta Terra), que será transmitida a partir de outubro deste ano em um dos canais da emissora, o BBC One.

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Há quatro anos, a mesma BBC já havia filmado a pesca cooperativa de Laguna, quando fez gravações para o documentário Human Planet (Planeta Humano). O material no entanto, mostrava diversas histórias de interação entre pessoas e animais ao redor do mundo – entre elas, as do golfinhos e pescadores de Laguna.

A BBC é reconhecida mundialmente pelos documentários pelo mundo, principalmente envolvendo o comportamento da natureza. Uma equipe do Globo Mar, da Rede Globo, também há havia ido até o local para fazer o mesmo trabalho.

Projeto tenta desvendar a pesca cooperativa

Quem funcionou como uma espécie de guia para a equipe de TV foi o professor do curso de Engenharia da Pesca da Udesc Fábio Daura Jorge. Há seis anos ele pesquisa o comportamento desses golfinhos. Agora, acaba de dar início a um novo projeto para monitorar os animais e descobrir como exatamente surgiu e funciona a pesca cooperativa, como os botos se beneficiam disso e como preservar a espécie.

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– O comportamento que o boto tem na água indica o momento certo de se jogar a tarrafa, o que garante ao pescador mais capturas de peixes. Essa interação ocorre o ano inteiro, mas é maior quando as tainhas aparecem, num ritual centenário que não falhou um ano ou uma vez sequer.

Em busca de respostas

– A dúvida: qual é o benefício que os golfinhos têm com a pesca cooperativa?

– O que vai explicar: se há, realmente, uma interação mútua entre eles e os pescadores, qual é a vantagem para os animais e qual a vantagem para eles continuarem com o ritual.

– A Dúvida: Quantos botos existem, de fato? Essa quantidade vem crescendo ou diminuindo com o passar do tempo?

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– O que isso vai explicar: se a população está diminuindo, está ameaçada e se será preciso acionar o alarme de preservação

– A dúvida: como está a saúde dos golfinhos? Qual é a relação entre eles? Há parentesco?

– O que vai explicar: por que alguns ajudam na pesca e outros não e como eles fazem para passar adiante esse ritual.

– A dúvida: quantos peixes o pescador consegue capturar a mais com a ajuda dos golfinhos? O quanto isso incrementa a renda dele? Quanto a cidade ganha com isso?

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– O que vai explicar: qual é a participação efetiva do golfinho na pesca e o quanto ela depende dele para acontecer.

Ritual centenário ainda sem explicação

Os golfinhos de Laguna nunca se enganam: sempre que dão o “sinal” há tainha por perto. E muita tainha. Em uma relação próxima com os pescadores, que beira à amizade, os botos seguem um ritual centenário capaz de tocar qualquer pessoa: em um movimento sincronizado, ainda inexplicado pela ciência, eles cercam o cardume de tainhas e emitem um sinal, um comportamento sutil, cada um a seu modo, do momento certo de o pescador lançar a tarrafa ao mar, fazendo com que capture mais peixes que o normal. E peixes graúdos.

O que se vê em Laguna é singular. A pesca cooperativa, como é chamada a interação entre o boto-da-tainha e pescadores na Lagoa de Santo Antônio dos Anjos, é única no mundo por envolver a tradição da pesca da tainha. Existem exemplos parecidos na Mauritânia, na África, e também em Mianmar, na Ásia, mas nenhuma delas se compara à de Santa Catarina por se tratar de peixes e botos de espécies diferentes.

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E assim como Scooby, Caroba e Tafarel, os mais famosos, há também o Figueiredo, a Bombinha, a Jade e tantos outros. Em Laguna, a relação dos golfinhos com os pescadores é tão próxima que além dos nomes que ganham, depois que morrem são enterrados em lugares sagrados. Essa interação durante a pesca vem de pelo menos 150 anos e nunca falhou, o que chama a atenção de especialistas no mundo inteiro.