Para muitos estudantes, os anos de faculdade são tempos crônicos de crise. O dinheiro é contadinho para tudo, desde aquela saída eventual para festas até a compra semanal com produtos essenciais – que por vezes até têm sua essencialidade sobressaída pela falta da mascada. Qualquer deslize ou empecilho orçamentário no meio do caminho pode comprometer despesas mais altas, como é o caso do pagamento das rechonchudas mensalidades do ensino superior. Nessas horas, muita gente acaba pagando o pato, deixando de lado as aulas-caixão e fotocópias de livros para aliviar as contas mensais. E justamente para evitar histórias como essas, de alunos trancando os cursos, é que as faculdades e universidades do Vale planejam maneiras de reter os estudantes.

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Muito embora registre um crescimento de 2% no número de novos alunos – superior aos últimos dois anos, quando o índice ficou zerado – a Universidade Regional de Blumenau (Furb) é quem puxa a iniciativa. A ideia é simples: estender o tempo para que o aluno possa pagar à própria instituição as mensalidades referentes ao curso. Isso elimina a necessidade de um intermediador – ou financiador, no caso dos bancos – e torna mais fácil para o estudante o acesso a uma política de incentivo ao término da faculdade. Se o curso tem quatro anos de duração, ele poderia estender a quitação em mais vezes, mesmo após se formar. A ideia será discutida com o Conselho Deliberativo Universitário neste semestre. Se for aprovada, pode ser implantada ainda em 2017.

– O trabalho a partir de agora é para reter os estudantes. Para alunos com menos estabilidade financeira, a ideia é criar um plano próprio de crédito educativo, para dilatar o pagamento em mais anos – comenta João Natel, reitor da Furb.

Passando longe da crise, com 40% de aumento de participação nos processos seletivos e 20% na consolidação de matrículas em nível nacional – envolvendo tanto o presencial, o semipresencial e o a distância – a Uniasselvi é outra instituição que avalia a possibilidade de dar mais prazo para o aluno pagar as mensalidades.

Questões pedagógicas e pessoais

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Conforme Luiz Gonzaga Victor Foureaux Neto, diretor de mercado, a questão financeira é importante, mas não pode ser o único mote em ações para fazer com que o estudante permaneça no curso.

– Não é só o dinheiro que faz com que o aluno desista ou tranque a faculdade. Existem outros fatores, como a própria questão pedagógica ou até pessoal. O desafio é conseguir mantê-lo e o parcelamento é uma dessas possibilidades – avalia.

Ele destaca a satisfação da instituição com os números no começo do ano, mas admite que mecanismos de crédito próprio são a melhor saída para uma universidade que abrange um público heterogêneo na questão de renda.

Na opinião do economista Sidnei Silva, chefe do departamento de ciências econômicas da Furb, a proposta é interessante, mas ao mesmo tempo requer cautela. O fato de o estudante poder ampliar o tempo de pagamento não isenta a quitação a médio prazo. Para a instituição, o fato de já ir recebendo o valor durante os semestres em que o aluno estuda é um ponto de segurança, mas não deixa de ser um investimento onde há riscos:

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Toda compra parcelada oferece um risco e traz uma responsabilidade muito grande ao consumidor pelo contrato assumido. Por outro lado, se o aluno consegue estudar com uma parcela mais baixa, ao sair da universidade ele pode ter um ganho salarial ou um novo emprego, e isso torna-se uma vantagem. É um investimento que poderá tranquilamente ser quitado. Sem garantias, é claro, mas é uma possibilidade.

Impacto da diminuição no Fies

Das 579 novas matrículas solicitadas pela Furb por meio do Fies, apenas 94 (16,23%) foram aprovadas e liberadas pelo Ministério da Educação (MEC). O número segue a tendência do ano anterior, mas longe de igualar os “tempos de bonança”, como afirma o reitor João Natel, quando 100% da pedida da universidade era aceita pelo governo federal. Essa perda também ocorre com a Uniasselvi que, por ser uma empresa privada, optou por não divulgar os números específicos. Foureaux Neto destaca que o financiamento estudantil não é o único problema, mas o indicativo é de que em ambos os casos a diminuição nos repasses para alunos novos motivou atitudes para evitar retração na ocupação dos campi.

Outro fenômeno cada vez mais comum nas universidades e que foi alavancado pelos tempos de crise é a do estudante/trabalhador. Essa tendência leva os alunos do período matutino para o noturno, por conta, obviamente, da jornada de trabalho, o que força o fechamento de turmas durante a manhã. Essa onda se tornou cada vez mais comum na Furb e neste ano a migração entre turnos forçará a não abertura de seis cursos no primeiro horário do dia – como é o caso da badalada Engenharia Elétrica, por exemplo. O reitor João Natel diz que essa é apenas uma situação natural e que não há o fechamento, literalmente, de turmas, e tão somente a mudança de turnos como uma demanda dos próprios alunos.