Na sequência do detalhamento dado pela reportagem da NSC Comunicação sobre a participação dos seis principais suspeitos de comandarem as supostas fraudes e desvios de dinheiro público na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), é a vez de relatar o que a Polícia Federal aponta serem indícios contra os professores Alexandre Marino Costa, que atua na instituição desde 2005, e Rogério da Silva Nunes, professor da instituição desde 2006, dois dos 23 indiciados pela PF no inquérito da Operação Ouvidos Moucos.

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A PF sustenta que tanto Marino quanto Nunes fazem parte de um grupo de professores do curso de administração que mais recebeu recursos provenientes de projetos via fundações de apoio (todos os projetos, incluindo ensino a distância) e de bolsas do Sistema UAB (pagas diretamente pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior). Trata-se, segundo a PF, de um pequeno grupo de seis professores da administração da UFSC que recebeu de todos os projetos, o equivalente a 43% do montante total percebido por todos os 60 professores do curso entre 2008 e 2016.

Em uma das tabelas anexadas ao documento, a PF confronta os rendimentos de Marino e de Nunes como professores com dedicação exclusiva com os valores recebidos por eles com bolsas no ensino a distância (EaD) da instituição. A comparação feita pela polícia e replicada na tabela abaixo, mostra que Marino recebia em bolsas 80% do valor que ganhava como professor com dedicação exclusiva, enquanto no caso de Nunes o montante representava 57%

O documento agora está em análise pelo Ministério Público Federal (MPF) em Santa Catarina, cujo procurador André Bertuol, será o responsável por decidir os próximos passos do caso, podendo acolher na íntegra, em parte, pedir novas diligências ou rejeitar os indiciamentos. Não há prazo para que o procurador federal dê seu parecer sobre o apresentado no relatório final da investigação.

Antes de ser deflagrada em Santa Catarina, em setembro de 2017, a Ouvidos Moucos tinha sido executada de maneira parecida pela Polícia Federal nos estados vizinhos com o intuito de investigar os gastos com bolsas em universidades. Em 2016, no Rio Grande do Sul, a Operação PHD investigou fraudes que chegam a quase R$ 6 milhões envolvendo bolsas de estudo. E no Paraná, no ano passado, o desvio investigado, segundo a PF, foi de R$ 7 milhões em bolsas de pesquisa.

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Alexandre Marino Costa

atual pró-reitor de graduação da UFSC e sub coordenador do Lab Gestão

Indiciado pela PF por peculato, violação de sigilo funcional e organização criminosa, Alexandre Marino Costa não foi preso nem conduzido coercitivamente pela PF quando da deflagração da Ouvidos Moucos. Sete meses depois, foi indiciado. Marino é o atual pró-reitor de graduação da UFSC e subcoordenador do Lab Gestão, laboratório que, segundo a PF, é um dos locais onde o suposto esquema era operado. No relatório da investigação, Marino aparece recebendo mais de R$ 1 milhão em bolsas e serviços entre 2008 e 2016, anos do escopo do inquérito.

A PF aponta que Marino também recebia bolsas destinadas a funções por ele não exercidas. Segundo a PF, foram identificadas alterações como a que consta em um e-mail, que informa o cadastro de Marino para receber bolsa de coordenador de um curso a partir de uma data na qual ele não atuava na função. O e-mail diz:

“Professor Marino, conforme solicitado, em função do não recebimento da bolsa de março que o professor receberia pelo curso de administração, cadastrei o professor para receber a bolsa de coordenador de curso 1. pelo curso de especialização de gestão pública, a partir de março e não de abril”.

Em um documento, anexado ao inquérito pela PF, o professor autoriza o pagamento de uma funcionária por serviço de assessoria na elaboração de material didático. A investigação da PF afirma que a mulher tem ensino médio completo e como vínculos empregatícios mais recentes atividades de recepcionista e telefonista, e que esta formação e funções são incompatíveis com o serviço supostamente prestado.

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Marino assumiu o cargo que ocupa atualmente, de pró-reitor de graduação já na gestão do ex-reitor Luiz Carlos Cancellier. O relatório da PF traz uma conversa entre Marino e Cancellier, em fevereiro de 2017. Para a PF, o assunto tratado por ambos era o suposto esquema investigado, em data anterior a que o ex-reitor disse, em depoimento, ter tomado conhecimento das denúncias de irregularidades no EaD da UFSC. No caso, Cancellier falou ter descoberto as suspeitas no segundo trimestre de 2017.

Em outro e-mail, Marino recebe de Cancellier a seguinte mensagem:

“A ideia é sentar com todos e passar a régua. Acabar com essa tensão. A cada hora um fato novo. O Vladimir pode nos ajudar com Luiz Felipe, que pode nos ajudar com a professora”.

Para a PF, eles se referem a Taisa Dias, professora que ajudou a denunciar o esquema.

Contraponto

O professor Alexandre Marino Costa diz que foi surpreendido com as informações do relatório final da PF. Afirma que respeita, mas não concorda, e que vai provar sua inocência no curso do processo.

Rogério da Silva Nunes

professor da UFSC e ex-coordenador da UAB da UFSC

Professor da UFSC desde 2006, Rogério da Silva Nunes, ex-coordenador do UAB da UFSC, foi indiciado por peculato, concussão e lavagem de dinheiro. Em setembro do ano passado, ele chegou a ser preso provisoriamente pela PF na deflagração da Ouvidos Moucos. De setembro de 2017 até hoje, ele permanece impedido pela Justiça de acessar o campus da UFSC. Como coordenador do Núcleo Universidade Aberta do Brasil entre 2016 e 2017 era responsável por enviar à Capes, órgão ligado ao MEC, os pedidos para pagamento de bolsas do ensino à distância.

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No relatório, entre outras acusações, a Polícia Federal diz que Rogério “acumulava bolsas de forma indevida; simulava tanto a prestação de serviços por uma empresa ligada ao grupo investigado quanto a contratação de serviços que nunca foram feitos para pagar gratificações a funcionários não concursados. E participava do esquema que exigia de volta o valor de metade das bolsas pagas a outros professores, o que o MEC não permite”.

Em outro ponto trazido pela PF, o relatório anexa um ofício assinado por Rogério Nunes. Nele, o coordenador determina o pagamento de um serviço alegando que a empresa ligada ao grupo investigado ofereceu o menor orçamento. A PF conseguiu provar que, assim que caiu na conta da empresa, o dinheiro foi transferido para contas pessoais do grupo investigado.

Contraponto

A defesa de Rogério da Silva Nunes disse que só vai se manifestar nos autos.