A porta de entrada, que deveria ser atrativa, revela que a manutenção deixa a desejar. Roletas enferrujadas, guarita com vidro quebrado e sem vigia, deques podres e pregos expostos. Nada combina com a beleza natural do lugar, rico em Mata Atlântica, pássaros, bichos e orquídeas.
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O Bosque Pedro de Medeiros, a única Área de Preservação Permanente (APP) de Florianópolis no Continente é, agora, objeto de um inquérito civil instaurado pelo Ministério Público (MPSC), após denúncia de abandono e falta de manutenção. O alerta foi feito pelo vice-presidente da Câmara de Vereadores de Florianópolis, João Aurélio Valente Júnior.
Ao entrar no bosque, que fica na Rua Afonso Pena, é nítido o contraste entre o canto dos pássaros nos 18 mil metros quadrados de mata em meio aos prédios e casas do Bairro Estreito. O ar mais puro, graças ao verde da vasta vegetação que existe no lugar, é garantia de passeio saudável. Em desencontro a este cenário ideal para um dia de lazer, parte do bosque está sem manutenção desde sua inauguração há exatos 10 anos – foi aberto em 27 de março de 2002.
No relatório de visita feita pelo vereador, encaminhado à 30ª Promotoria de Justiça da Capital, fotos comprovam a falta de cuidados com o bosque. Há entulhos espalhados em meio à vegetação e móveis como sofá, mesas, escadas e tábuas acumulados em uma área que poderia ser aproveitada para fim educativo ou cultural.
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As imagens também expõem o esgoto lançado a céu aberto nos fundos do bosque. Eles seriam despejados pelas casas ao redor do parque nas redes pluviais. A falta de podas e mato em excesso também são relatados no pedido de providências entregue ao MPSC. A situação precária do Museu do Presépio, patrimônio tombado, é parte da tela de deterioração do lugar, aberto ao público de terça a domingo e nos feriados.
O promotor de Justiça Daniel Paladin expediu intimação no dia 25 de abril a todos os envolvidos no processo. A Secretaria do Continente, o vereador Aurélio Júnior e o Sephan têm o prazo de 10 dias, a partir do recebimento do documento, para prestarem depoimento.
A reportagem do Continente também visitou o local e conferiu a estrutura do museu, que está comprometida. Há acúmulo de vegetação seca e morta por causa do último vendaval. A Fundação Municipal do Meio Ambiente (Floram), responsável pelas podas da vegetação, afirma que só retirou o que obstruía as trilhas. O restante permanece no bosque. Há ainda um Guarapuvu caído no bosque. Ele teria morrido por ter as raízes expostas.
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Primeiro pedido em 2009
Conforme o chefe do Departamento de Unidades Externas da Secretaria do Continente, Antônio Carlos Simas, em 2009 foi encaminhado um ofício ao Serviço de Patrimônio Histórico Artístico e Natural do Município (Sephan) solicitando uma visita técnica para que fosse elaborado um projeto de reforma do museu.
Simas afirma que não houve nenhuma resposta do órgão e que nada pode ser feito em relação ao Museu do Presépio, já que se trata de um prédio tombado, construído no século 19. Desde que foi inaugurado, nenhuma restauração foi feita no local.
– Não podemos mexer em nada. Nem trocar uma telha – enfatiza.
A assessoria de imprensa do Sephan informa que na época em que foi enviado o ofício, o órgão não tinha demanda para atender à solicitação. Disse que entrarão em contato para agendar a visita do arquiteto.
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Outro problema apontado na denúncia é a falta de iluminação nas trilhas do bosque. As luminárias, em todo o percurso, não funcionam. Além disso, toda a cerca que um dia separou a trilha da área de APP (mata) não existe mais.
Segundo a Floram, uma empresa, que precisou cortar árvores para construir um empreendimento em frente ao bosque, terá como medida de compensação recuperar as passarelas (deques). A madeira começou a ser enviada no dia 24 de abril.
Visitantes pedem melhoria
Apesar do bosque precisar de mais atenção, pais e filhos aproveitam. Morador há quatro anos do Bairro Jardim Atlântico, Vladimir Mauler, 46 anos, visitou pela primeira vez o bosque na semana passada. Ele se surpreendeu com a beleza do lugar. Lamentou quando foi até as trilhas seguindo as placas indicativas de um lago, que não existe mais. Outro detalhe que chamou a atenção do mineiro é a falta de valorização histórica do museu e do próprio bosque.
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– Em Minas Gerais, a história é viva. Sinto falta disso aqui. Passo há quatro anos, todos os dias, na frente do bosque e nunca tive vontade de entrar. Hoje, decidi trazer meu filho. O lugar é legal, dá para melhorar.
A dentista Terezinha Lolli, 56 anos, que também é moradora do Estreito, conta que foi uma vez ao bosque, mas que depois não se sentiu atraída para fazer uma nova visita.
Jogado às traças
As palavras são diretas: “O bosque está jogado às traças”, afirma o vereador Aurélio Júnior, que diz ser testemunha da decadência do local desde a sua inauguração.
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– Hoje ninguém mais vai lá. Havia convênio com o Sesc, tinha um trabalho bacana de Educação Ambiental, as trilhas eram cercadas e iluminadas. Agora não tem mais nada.
Com apenas três funcionários para cuidar de toda a manutenção e limpeza do bosque, o coordenador Carlos Alberto Machado afirma que é difícil manter todo o serviço. Ele diz que diariamente o local é limpo. O custo para manter o bosque é de R$ 22 mil por mês, incluindo gastos com folha de pagamento, luz, água e material.
Apaixonado pelo lugar, o funcionário público Marcelo Vieira Nascimento elaborou um projeto de reestruturação do bosque. O também geógrafo e especialista em botânica explica que com R$ 120 mil é possível dar uma nova vida ao lugar.
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Entre as ideias está a construção de um orquidário de 30 metros quadrados. No parque, foram encontradas oito espécies da plantadas. Há também a intenção de voltar a ter um observatório de pássaros, de dois metros quadrados; colocar placas indicativas com o nome e características de cada árvore; refazer o lago e construir um minhocário.
A Secretaria do Continente argumenta que só tem 1,2% do orçamento do município para atender a toda a região continental e que é inviável arcar com o valor. Mas há duas empresas privadas que podem ajudar a colocar em prática o projeto, que pode trazer novos olhares ao bosque.
Os problemas
– Museu com peças quebradas, salas sujas, teto podre, paredes rachadas, estrutura completamente comprometida
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– Na entrada do bosque, deque com tábuas quebradas oferece perigo às crianças, que podem se machucar com pregos expostos na madeira apodrecida
As promessas
– Remanejar mais três funcionários operacionais para dar manutenção
– Cercar toda a trilha novamente
– Trocar os deques
– Prazo: até o final da semana que vem