Vasculhar a gaveta atrás da carteira de trabalho, atualizar a senha do Cartão Cidadão, bater aquele papo sobre o frio ou o calor na fila do banco. No mínimo verificar o saldo da conta no caixa-eletrônico ou celular. Nos últimos meses esse roteiro fez parte de pelo menos um dia da vida de 32,7 milhões de trabalhadores brasileiros que foram beneficiados com a possibilidade de saque dos valores mantidos em contas inativas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), acrônimo que caiu nas graças do trabalhador no primeiro semestre. Em todo o país, os saques totalizaram R$ 44 bilhões.

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Em Blumenau e no Vale do Itajaí, os percentuais de trabalhadores e de valores sacados seguiram a mesma proporção dos resultados nacionais. Com isso, o balanço local mostra que 82 mil pessoas receberam os valores das contas inativas, que na cidade somaram R$ 99 milhões – um valor médio de R$ 1.207 por pessoa. Nos 54 municípios que fazem parte da regional da Caixa em Blumenau, o número de trabalhadores que solicitaram os saldos de FGTS foi de 318 mil, com um resultado de R$ 357,5 milhões.

Os saques ajudaram aqueles que já estavam com a mão coçando por um dinheirinho extra em tempos de crise, mas também provocou reflexos na economia. Um dos principais foi a diminuição da inadimplência. Em julho, último mês em que os trabalhadores puderam sacar os valores inativos do FGTS, a inadimplência em Blumenau caiu 7,11%. Foi a maior redução desde junho de 2015, quando o Departamento de Economia da Furb começou a acompanhar os dados junto ao Serviço de Proteção ao Crédito (SPC). As cidades de Gaspar, Brusque, Indaial, Pomerode e Timbó também registraram baixa no número de devedores, que varia até 2%.

No acumulado do ano, a queda no número de inadimplentes também foi expressiva, de 8,60%. No mesmo período de 2016, o número de cadastros de pessoas com dívidas no comércio havia crescido 0,67%. Para o economista e professor da Furb Bruno Thiago Tomio, o resultado mostra que a liberação do FGTS trouxe impacto forte sobre a inadimplência, principalmente por trabalhadores que deixaram o saque para a última hora e deram preferência ao pagamento de dívidas. Ele chama a atenção também para a queda de 50% nos novos registros, o que mostra que as pessoas estão fazendo menos dívidas.

– A liberação foi positiva, se não tivesse sido feita a situação poderia estar muito pior. Os valores geram um encadeamento positivo na economia como um todo – avalia.

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Patamar de vendas mantido no comércio

Presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) de Blumenau, Helio Roncaglio conta que além da inadimplência menor, o dinheiro extra na economia ajudou os lojistas a manter o volume de vendas em datas como Dia das Mães e Dia dos Namorados no primeiro semestre, o que já é visto como indicador positivo. A injeção de recursos cria também uma expectativa positiva para o Dia dos Pais, data em que 57% dos entrevistados de um levantamento da entidade disseram que irão comprar presentes de até R$ 70 e 32% até R$ 120.

O FGTS foi um dos fatores citados como explicação para a alta de vendas em setores como o automotivo. Entre janeiro e julho, a venda de automóveis novos cresceu 3,94% no Vale do Itajaí – primeiro crescimento no semestre inicial do ano desde 2014. No ramo de imóveis, o presidente do Sindicato da Habitação de Blumenau e Região (Secovi), Roberto Sérgio Cunha, explica que o FGTS não mexeu no ramo de compra e venda. Por outro lado, o período coincidiu com a diminuição na inadimplência nos aluguéis.

– As pessoas aproveitaram para colocar aluguéis e algum débito de comércio em dia. É positivo porque dá novo ânimo para o cidadão recomeçar e pensar em realizar novos projetos – pontua Cunha.

Sobrou, e agora?

Sacou o FGTS, pagou dívidas, fez aquela ostentação e ainda sobrou dinheiro? Que felicidade. Nesse caso, o economista Bruno Thiago Tomio, que participa do projeto de extensão Cuidando do Meu Dinheiro, da Furb, que oferece orientação financeira gratuita, recomenda o planejamento. A orientação é para que a pessoa guarde um valor equivalente a três salários mensais em um investimento sem risco, como poupança, CDB ou RDC, para casos de emergências. Se o valor exceder esse valor, aí é possível sonhar mais alto e pensar em investimentos mais rentáveis, embora com algum risco, como um negócio próprio, imóveis, títulos de tesouro direto, cursos profissionalizantes, intercâmbios e até bolsa de valores.

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Ainda posso sacar?

Quem comprovadamente não pôde comparecer às agências da Caixa, em casos como doenças graves ou pessoas presas, poderão apresentar justificativa ao banco, que vai definir um novo calendário para os saques. O prazo deve ir até 31 de dezembro de 2018. Os demais só poderão fazer o saque das contas inativas não resgatadas nas situações já previstas em lei, como aposentadoria e aquisição ou amortização de pagamento de moradia própria.