Na falta da fala – ainda tímida, por conta do tubo que ficou instalado em sua traqueia durante dois dias para permitir a respiração – a estudante de enfermagem Ingrid Preigschadt Goldani, 21 anos, recorre à mímica para tranquilizar os pais, Eliete e Flávio. Deitada em um leito na UTI do Hospital Conceição, junta as mãos para formar um coração, apontado afetuosamente para o casal. Ingrid, que era funcionária da boate Kiss, é uma das vítimas do incêndio que sofre com a pneumonia química, embora tenha conseguido sair com vida da casa noturna.
Continua depois da publicidade
A notícia de que a jovem estava no local interrompeu as férias da família Goldani. Imediatamente, os pais dela foram de Capão da Canoa a Santa Maria para ficar ao lado da filha.
– Ela estava enlouquecida domingo querendo saber dos amigos. Tive de tirar o notebook dela. Depois de algumas horas, ela começou a tossir. Quando chegamos no hospital, já tiveram de entubá-la – conta a decoradora Eliete Goldani.
Do Hospital Universitário de Santa Maria, a jovem foi transferida para Porto Alegre de helicóptero, na madrugada de segunda-feira. Os pais só puderam vir durante a manhã. O gerente de manutenção Flávio Goldani pegou a estrada, enquanto Eliete recebeu auxílio do ministro da Saúde, Alexandre Padilha, e veio de carona em um avião.
Continua depois da publicidade
– Sou muito grata ao ministro e aos seus assessores. Eles foram sensacionais comigo – emociona-se.
A família também recebeu a solidariedade da irmã de Eliete, Maria Claudete, que ofereceu abrigo ao casal em sua casa no bairro Partenon. Ingrid ficou em estado grave durante a segunda-feira, mas começou a se recuperar rapidamente na terça. Ao meio-dia, recebeu a visita dos pais, ainda entubada. No encontro seguinte, às 17h30, o pai foi o primeiro a entrar na UTI.
– Levei um susto… Mas um susto bom. Entrei e vi ela bem, sem os tubos. Foi uma alegria enorme – conta Flávio com os olhos vermelhos de emoção.
Continua depois da publicidade
Preocupada, a jovem faz gestos e pergunta o tempo todo pelos amigos que estavam envolvidos na tragédia. Quando a mãe permitir que acesse o notebook novamente, Ingrid saberá que vários deles morreram e outros tantos estão internados.
– Vai ser muito difícil para ela… Ela é muito preocupada com os amigos, mas não posso dar notícia nenhuma para não deixar ela triste. Estou aliviada pela minha filha, mas meu coração ainda sangra pelos outros – resume Eliete.
“Foi um anjo que salvou minha filha”
Foi pelos braços de um herói anônimo que Ingrid Goldani, 21 anos, escapou do incêndio na boate Kiss. A estudante de enfermagem era atendente em um dos bares da casa noturna, e ficou cerca de 10 minutos atrás do balcão até conseguir sair do local. O alívio veio instantes após a jovem colocar a cabeça dentro de um dos freezers, puxar ar, e pular para a pista. Pisoteada em meio ao tumulto, teve um dos pés machucados e ficou presa entre os corpos, até que um rapaz a puxou pela mão.
Continua depois da publicidade
– Na primeira tentativa, ele não conseguiu arrastar ela. Ele chegou a desistir e soltou a mão dela, mas ela se desesperou e disse que ia morrer se ele não ajudasse – conta a mãe de Ingrid, Eliete Goldani.
Ingrid falou para os pais que quer fazer um agradecimento à pessoa que a salvou.
– Eu estava meio desacreditada com o ser humano, mas agora minha fé foi restaurada. Ninguém sabe quem é, mas foi um anjo que salvou a minha filha – diz Eliete.
Além de Ingrid, outro filho de Eliete estava na boate no momento do incêndio. Por sorte, o policial rodoviário Fabio Goldani ficou posicionado junto à porta e foi um dos primeiros a fugir.
Continua depois da publicidade